Título: Candidatura de Scola põe em foco movimento leigo
Autor: Meichtry, Stacy; Galloni, Alessandra
Fonte: Valor Econômico, 13/03/2013, Inrternacional, p. A12

A forte candidatura papal de um cardeal italiano está jogando uma nova luz sobre um crescente movimento católico de base, que surgiu durante as sangrentas batalhas ideológicas dos anos 1970 na Itália.

Comunhão e Libertação é um movimento leigo com cerca de 120 mil participantes, que, depois de se tornar bem conhecido na Itália, está se expandindo na Europa, Estados Unidos e América Latina, arrebanhando um grande número de católicos através de exercícios espirituais, retiros, leituras e missas acompanhadas de música.

O cardeal Angelo Scola de Milão, um dos primeiros discípulos do fundador do movimento, é também um dos principais candidatos ao papado. O fato provavelmente vai trazer às discussões do conclave o sucesso do movimento em atrair mais católicos na Europa, mas também alguns de seus aspectos mais polêmicos, tais como seus vínculos com a política italiana, segundo vários cardeais entrevistados antes do conclave.

O movimento, abreviado como CL, incentiva seus membros a difundir o evangelho e os ensinamentos tradicionais da Igreja em áreas onde muitos líderes seculares da Europa consideram essas atividades indesejáveis: nos locais de trabalho e nas esferas do governo e da educação. Essa estratégia ganhou elogios ao grupo por parte dos papas João Paulo II e seu sucessor Bento XVI, que tentaram conter a maré das tendências seculares no Ocidente.

Cardeais entrevistados pelo "The Wall Street Journal" elogiaram a CL por trazer vida nova aos bancos das igrejas europeias, em especial entre os católicos mais jovens. Outros expressaram dúvidas quanto aos laços do grupo com a política italiana.

Há cerca de 20 anos, a CL ajudou a colocar Silvio Berlusconi no mapa político da Itália, atraindo para o seu lado um segmento crucial de simpatizantes católicos, sobretudo em regiões ricas do norte, como a Lombardia. Hoje, os promotores públicos estão investigando se o governador da região, Roberto Formigoni, destacado membro da CL e amigo de longa data do cardeal Scola, aceitou dinheiro de um lobista para financiar despesas pessoais, acusação que o governador nega.

O cardeal Scola "está ligado demais à política", disse um cardeal europeu, acrescentando que tenciona discutir a CL no conclave. Um segundo cardeal disse que, embora o apoio ao cardeal Scola seja forte fora da Itália, os laços do cardeal com a CL afastaram muitos simpatizantes entre os cardeais italianos e do Vaticano.

O porta-voz de Scola não quis comentar, referindo-se a observações feitas pelo cardeal a um jornal italiano no ano passado. Na entrevista, ele descreveu a atenção do público sobre sua amizade com Formigoni, oriundo da mesma cidade, como uma tentativa de marcá-lo com "dois pecados originais", acrescentando que não tinha nenhum envolvimento com a carreira do política. O governador, que termina seu mandato após as eleições nacionais italianas, não respondeu a pedidos de comentários.

Roberto Fontolan, diretor do Centro International da CL, disse que "não há absolutamente nenhuma relação, seja institucional ou de outro teor, entre a CL e a política". Ele acrescentou que a CL "não estava promovendo Scola mais do que qualquer outro candidato".

O movimento que veio a se tornar a CL nasceu nos anos 1950 como uma associação de alunos do ensino médio de Milão em torno do Padre Luigi Giussani, teólogo e sacerdote que lecionava nessa cidade. O nome foi criado mais de dez anos depois, em resposta a grupos de estudantes esquerdistas que na época usavam a retórica da luta de classes e da revolução.

Durante a década seguinte, o terrorismo de esquerda assolou o país, com grupos anticlericais de extrema esquerda ocupando fábricas e tentando penetrar nas universidades. Embora seu objetivo não fosse político, a CL se tornou, na prática, a alternativa para as universidades do norte da Itália.

"Passamos a ser vistos como uma alternativa às forças da esquerda, e até nos tornamos alvos da sua violência", disse Mario Mauro, que em 2012 deixou o partido conservador de Berlusconi para entrar no partido Escolha Cívica, do premiê Mario Monti. Mauro disse que ele e outros estudantes universitários da CL faziam orações diárias em diferentes locais por medo de ser alvo de agressões ou mesmo ataques terroristas.

Mais tarde, a CL também cultivou relações com outros setores da sociedade. O movimento organiza um congresso anual que reúne leigos do mundo político, empresarial, cultural e científico para discutir grandes temas globais. Os participantes já incluíram Madre Teresa, João Paulo II, Berlusconi e Mario Draghi, presidente do Banco Central Europeu.