Título: China amplia uso de carvão e pode se tornar este ano o maior poluidor
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 10/04/2007, Especial, p. A14

A China se tornará o maior emissor mundial de dióxido de carbono (C02) por volta de 2009, uma década antes do que cientistas previam, segundo a Agência Internacional de Energia (AIE). Alguns cientistas americanos acham, porém, que no ritmo de 10% de crescimento econômico, com forte demanda de energia, Pequim pode já em 2007 superar os EUA como maior poluidor global.

Os EUA respondem hoje por 25% das emissões globais, com só 5% da população global. E resistem a compromissos de redução.

A questão energética chinesa tornou-se um problema ambiental mundial antes mesmo que seu consumo venha a dobrar até 2020, como é previsto por analistas.

O país sofre forte pressão para se comprometer com metas para redução de emissões de gases, durante o encontro com o G-8, grupo das principais nações industrializadas, em junho, na Alemanha.

Mas a China resiste. Foi um dos países que mais procuraram atenuar, na semana passada, em Bruxelas, as conclusões do Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre a Evolução do Clima, que prevê mais doenças, fome e migração em massa com as mudanças climáticas.

Os cientistas insistiram em que o mundo deve começar a se adaptar aos efeitos do aquecimento do planeta, ou enfrentará uma fatura de centenas de bilhões de dólares nos próximos anos.

O CO2 é produzido pela queima de combustível fóssil, como carvão, petróleo e gás, para energia, transporte e aquecimento. No caso da China, 70% das emissões são provenientes do uso de carvão.

Esse produto é estratégico e econômico para os chineses. O país tem uma reserva gigantesca de 113 bilhões de toneladas (13% do total mundial). Com o carvão, o país tem menos necessidade de pagar o preço do petróleo e tem mais segurança energética.

A China extrai cerca de 2 bilhões de toneladas por ano de minas na maior parte das vezes velhas e perigosas. Segundo analistas, muitas são ilegais. O país é cheio de centrais de fraca ou média potência, extremamente poluidoras e pouco eficazes, que utilizam tecnologia antiga.

O governo chinês planificou a modernização do setor para a próxima década, para combater a ameaça ambiental e responder a necessidade urgente de energia.

Um projeto considerado inovador consiste numa gaseificação e liquefação do carvão, que permite de captar mais facilmente CO2 e evitar sua emissão na atmosfera.

A aplicação dessa técnica pode ser especialmente útil no setor de transportes, alto emissor de CO2. O país tem atualmente apenas 25 automóveis por 1.000 habitantes comparado a 800 por 1.000 nos Estados Unidos. Mas a AIE estima que o número de carros vai explodir e a demanda de combustível vai aumentar por volta de 5% ao ano nas duas próximas décadas.

A questão é quando os projetos de inovação no setor de carvão serão rentáveis. Para os chineses, isso pode ocorrer quando o barril de petróleo custar US$ 30, mas analistas dizem que só mesmo quando custar US$ 45.

Para Nicolas Lefevre, ex-analista da AIE e atualmente pesquisador na Universidade Princeton (EUA), a China é tanto um problema como pode ser um agente de mudanças na área energética. Seu crescimento é tão enorme que a rota que tomar terá impacto mundial no setor tecnológico.

"A China pode desenvolver e reduzir custo de tecnologias. Pode ter um papel ativo nas transformações, um exemplo é que foram eles impulsionaram pela lâmpada fluorescente, que consome muito menos energia", diz.

O governo da Austrália, crescente parceiro comercial da China, anunciou ontem que ajudará Pequim a limpar seu ar e sua água, extremamente poluídos. Os australianos prometem desenvolver com os chineses tecnologia mais limpa para o carvão, considerando que até 2003 nada menos de 70% da energia chinesa continuará sendo gerada por estações elétricas com carvão.

A Austrália e os EUA são os únicos grandes países industrializados que rejeitaram o Protocolo de Kyoto, pelo qual 35 países e a União Européia se comprometeram a reduzir suas emissões de gases que causam o efeito-estufa a 5% abaixo dos níveis de 1990.

No mês passado, a UE se comprometeu a aumentar esse patamar para 20% e chegar a 30% se outros países fizerem o mesmo. Os chineses, no entanto, insistem que quem tem de fazer mais é os EUA. Mas sabem que seu argumento vai começar a se fragilizar, quando se tornarem o campeão de C02. (AM)