Título: Câmara Brasil-EUA mantém otimismo cauteloso
Autor: Olmos, Marli
Fonte: Valor Econômico, 15/03/2013, Brasil, p. A3

Uma pesquisa feita em menos de dez minutos com 155 representantes de empresas reunidos ontem na Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos mostra que, pelo menos nesse grupo, o otimismo em relação ao crescimento econômico é ainda insuficiente para puxar investimentos mais voltados à expansão da atividade, como bens de capital e capacidade.

Em votação eletrônica, a rápida enquete ocorreu num clima descontraído durante almoço de posse do novo conselho da câmara. Mas envolveu dirigentes de peso de grandes empresas brasileiras e multinacionais. Os resultados, que apareciam na sequência, em dois telões, indicaram que a grande maioria (64%) acredita que a economia brasileira vai crescer neste ano, mas abaixo de 3,5%.

À questão sobre intenção de investir ou não, 85% disseram que vão manter ou aumentar investimentos no país em 2013. Desses, 45% vão elevar o volume de recursos. A plateia também mostrou-se otimista ao ser questionada se o crescimento de suas empresas seria inferior ou superior ao da economia. A maioria (47%) aposta que seus negócios vão prosperar mais do que a economia do país.

Quando, no entanto, surgiu a pergunta sobre o destino dos investimentos, última das quatro questões, dez segundos foram mais do que suficientes para 40% dos entrevistados escolherem a alternativa "esforço comercial, marketing e distribuição". Outros 33% apontaram "melhoria de processos e ganho com produtividade". Treinamento e qualificação de mão de obra ficaram com 16% das respostas e a alternativa "estoque de capital, capacidade e pesquisa e desenvolvimento" apareceu em último lugar, com apenas 12% das respostas.

Convidado para a palestra que se seguiu à pesquisa, o ex-ministro Delfim Netto, ironizou o fato de que a totalidade dos presentes espera ver sua empresa crescer mais do que o país. Ele atribuiu as respostas à pressão que as empresas sofrem por resultados. Delfim também criticou que poucos percebam a importância de aumentar a capacidade produtiva. "Durante anos, nossa indústria sofreu uma perseguição brutal, lhe impuseram altas cargas tributárias e de juros. Milagre é essa indústria ter sobrevivido. Portanto tenham confiança no governo que, embora de forma tumultuada, está fazendo a coisa certa", disse.

A "forma tumultuada" não é opinião isolada de Delfim. "O governo tem se limitado a medidas pontuais", disse o presidente da Mangels, Bob Mangels. O presidente da General Motors na América do Sul, Jaime Ardila, seguiu a mesma linha. "A redução da carga horária dos motoristas de caminhão é louvável, mas ninguém sabe depois como compensar o aumento de custo dessa medida, que chega a 15%."

De modo geral, há otimismo em relação à economia do país entre os executivos envolvidos com a Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos. Mas, como disse a presidente da divisão de bebidas do grupo Pepsico, Andrea Alvares, "é um otimismo cauteloso".

O otimismo também varia de acordo com o setor. A presidente da Boeing do Brasil, Donna Hrinak, não tem do que reclamar, já que o aumento no tráfego aéreo na região contrasta com a queda de demanda provocada pela crise nos Estados Unidos, mercado de origem da companhia. Só da Gol a Boeing tem encomendados 60 aviões.

Para Ardila, da GM, que representa empresa de uma indústria que foi beneficiado pela redução de IPI, o setor privado sente falta de medidas mais abrangentes, voltadas a áreas como infraestrutura e logística. Mas Delfim apontou outro quadro em sua palestra. "O governo tem que cuidar do setor produtivo. Por isso, tem tomado medidas nas áreas de energia, tem tentado melhorar a produtividade nos portos e aeroportos. O governo faz a coisa certa, mas de maneira atabalhoada", disse. Para o economista, no entanto, uma redução de carga tributária geral funcionaria mais do que "em setores escolhidos e em pedaços".

No encontro da câmara, que reúne 5 mil empresas de 40 nacionalidades, 85% das quais brasileiras, os executivos não fizeram discursos em torno de inflação versus taxa de juros. E antes que alguém entrasse nesse tema, Delfim tratou, na palestra, de sair em defesa da conduta da equipe econômica. "Que efeito teria 0,25 [de aumento nos juros] na atividade das suas empresas? Vocês iriam produzir mais? Se hoje elevam os juros por acreditar que o choque de oferta acelerou a inflação, logo que os preços começarem a baixar, no segundo semestre, vai aparecer algum estatístico dizendo que isso aconteceu porque aumentaram os juros", disse.

Apesar da "falta de jeito" do governo nas medidas que tem sido anunciadas, segundo Delfim, o que importa "é o crescimento da distribuição de renda". "A empregada doméstica trocou o sabão de coco pelo sabonete Dove para lavar as mãos. Seria muito canalha o economista que pensasse que elevando os juros ela voltaria a se lavar com sabão de coco."