Título: Queda do câmbio beneficiou menos a inflação em 2006
Autor: Ribeiro, Alex
Fonte: Valor Econômico, 04/04/2007, Brasil, p. A5

A contribuição da taxa de câmbio para a queda da inflação foi bem menos importante em 2006 que nos anos anteriores, mostra estudo do Banco Central divulgado no relatório de inflação. Já as expectativas de inflação tiveram efeito benéfico nos preços pela primeira vez desde 2002.

Pelos cálculos do Banco Central, a valorização da moeda nacional teve um impacto positivo de 0,55 ponto percentual (pp) na inflação de 2006, pouco mais de um quarto dos 2,06 pontos percentuais verificados um ano antes. Do impacto positivo de 0,55 ponto do câmbio, 0,14 ponto percentual ocorreu nos preços livres e 0,41 ponto nos preços administrados.

No seu linguajar pouco direto, o BC diz que os números comprovam que não houve uso excessivo do câmbio na desinflação - reclamação muito comum entre os exportadores e empresas que enfrentam a concorrência de produtos importados. "Evidencia-se uma vez mais o papel desempenhado pelo câmbio como elemento importante, mas não dominante, do mecanismo de transmissão da política monetária", diz o relatório de inflação.

Em 2006, a inflação ficou em 3,14%, bem abaixo dos 5,69% do ano anterior. Essa redução se deve mais a um comportamento favorável dos preços livres e dos preços administrados. Em segundo plano, também ajudaram a menor inércia inflacionária e o arrefecimento das expectativas de inflação.

De um ano para outro, o impacto da inércia diminuiu, de 0,77 ponto para 0,47 ponto percentual. A inércia é o quanto a inflação passada pesa na inflação corrente. Sua importância diminuiu, porque a inflação vem caindo ao longo dos anos. No ano passado, 58% da inércia ocorreu em preços livres.

As projeções futuras de inflação estão se tornando mais importantes. As expectativas inflacionárias, que pressionaram a inflação em 0,27 ponto percentual em 2005, passaram a contribuir favoravelmente em 2006, puxando a inflação 0,13 ponto percentual para baixo.

Os preços livres mostraram comportamento mais favorável. Num cálculo que expurga os efeitos do câmbio, inércia e expectativas , o BC conclui que os preços livres responderam por 1,76 ponto da inflação de 2006; um ano antes, explicavam 3,4 ponto percentual da inflação. Segundo o BC, colaboraram no ano passado a queda de preços de alimentos, "bem como os efeitos da política monetária implementada nos últimos anos".

Em um cálculo semelhante, que expurga o repasse cambial e a inércia, os preços administrados tiveram um impacto de 1,6 ponto na inflação de 2006, bem abaixo dos 3,3 pontos percentuais observados em 2005. Ajudou muito o fato de os governantes terem adiado reajustes de tarifas, como ônibus, em um ano eleitoral. Além disso, em 2006 não foram feitos reajustes dos combustíveis.

A economista-chefe da Mellon Global Investments, Solange Srour, diz que dois fatores explicam a queda do papel do câmbio na desinflação. Um deles é o fato de que, em 2006, o câmbio se valorizou um pouco menos do que em 2005. Outro fator é que o coeficiente de repasse da variação do câmbio sobre a inflação, o chamado "pass-through", diminuiu.

O câmbio se apreciou 8,66% em 2006, um pouco menos do que os 11,82% observados em 2005. A diferença na apreciação do câmbio entre ano e outro não é muito grande, o que reforça a tese de que o repasse da variação cambial sobre a inflação diminuiu no período. Solange Srour lembra que o repasse cambial muda de acordo com uma série de fatores: a inércia inflacionária, o nível de inflação, a distância da taxa de câmbio de seu valor de equilíbrio, o nível de atividade e o grau de abertura da economia.

Tudo indica que, em 2006, a menor inércia inflacionária contribuiu para reduzir o "pass-through", assim como a menor distância da taxa de câmbio de seu valor de equilíbrio. "Neste ano, o câmbio se valorizou um pouco, por isso ainda deve dar alguma contribuição na queda da inflação", afirma Solange Srour. "Mas o 'pass-through' tende a se manter cada vez mais estável."

As expectativas, afirma, devem ajudar mais uma vez na queda da inflação em 2007, porque as projeções de mercado estão abaixo da meta. Os preços livres se aceleram um pouco, devido à reversão dos impactos positivos da queda dos preços dos alimentos. Os preços administrados também sobem um pouco mais, já que, passadas as eleições, os governantes se sentem menos inibidos para aumentar as tarifas.