Título: Comunicação perecível gera volatilidade
Autor: Pinto, Lucinda
Fonte: Valor Econômico, 15/03/2013, Finanças, p. C3

A ata do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central levou o mercado de juros futuros mais uma vez a convergir para a aposta de que a taxa Selic não sobe em abril. Um aperto da política monetária deve começar apenas em maio e em um ritmo mais brando, de 0,25 ponto percentual. O temor que parece crescer é o de que a alta sequer venha no primeiro semestre.

Os contratos de Depósitos Interfinanceiros (DI) negociados na BM&FBovespa de prazo mais curto caíram e apontavam a probabilidade de uma alta perto de 0,20 ponto percentual em abril e 0,30 ponto em maio. Na véspera, apontavam alta de 0,33 ponto e 0,35 ponto, respectivamente.

Já os DIs longos dispararam. Para se ter uma ideia, o DI janeiro/2021 fechou o pregão com taxa de 9,86%, perto da máxima do contrato, alcançada em setembro de 2012, quando a Selic estava em 7,5%. "Foram dois mercados completamente distintos: o dos contratos até janeiro de 2015 e o dos DIs mais longos", define um operador.

A reação que se viu ontem é típica dos momentos em que investidores avaliam que o BC está "atrás da curva", ou seja, demorando para agir. Se não há convicção da disposição do BC de subir os juros para combater a inflação, cresce o temor de que os preços disparem. Na dúvida, o mercado pede um prêmio de risco maior para montar posições de prazos longos. Neste momento, também ajudam a nublar o cenário as idas e vindas da comunicação do BC, que atrapalham a construção de projeções e, consequentemente, comprometem a formação de preços. "Se o investidor não sabe para onde vai a inflação daqui a cinco anos, ou deixa de fazer a posição ou pede uma taxa muito mais alta para emprestar dinheiro", diz um especialista.

A ata apresentada ontem, na visão de analistas, apenas consolida a visão de que o BC adotou uma "comunicação perecível" e, por isso, a volatilidade deve seguir como ingrediente persistente. "Foi uma ata desatualizada, completamente distante da realidade que o mercado enxerga, de inflação elevada", diz um experiente analista. "Quando se lê o documento, parece até que o BC está descrevendo um outro ciclo. Por isso, acho difícil que não haja algum ajuste no tom do documento nos próximos dias."

Uma correção de tom não seria exatamente uma surpresa. Desde o dia sete de fevereiro, quando o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, reagiu ao IPCA de janeiro dizendo estar "desconfortável" com a inflação, o mercado vem convivendo com uma dose de volatilidade rara. Basta lembrar que, após o comunicado da última reunião do Copom, cresceu a expectativa de que o juro só subiria em maio. Mas, na última segunda-feira, em discurso na Polônia, Tombini omitiu a afirmação de que a inflação vai desacelerar no segundo semestre, inflando de novo as apostas em alta de 0,5 ponto da Selic já em abril.

Desta vez, o argumento central para a correção das posições no mercado foi o parágrafo 28 da ata, que reconhece que a inflação pode se acomodar em patamares mais elevados. Mas pondera que há ainda incertezas - externas e internas - que impõem cautela na condução da política monetária.

Uma dessas incertezas pode ser o efeito das desonerações fiscais sobre a inflação. Até agora, os preços de alimentos não cederam - ao contrário, as coletas de preço mostram alta desses itens. "Talvez o BC esteja contando com um efeito mais forte dessa medida, que o mercado não enxerga", diz um especialista. "Mas o fato é que, se os alimentos não cederem, os juros vão voltar a disparar."

É por isso que, na visão de especialistas, ajustes na comunicação ainda podem ocorrer. E isso pode ser visto no Relatório de Inflação referente ao primeiro trimestre. "O BC tem a oportunidade de dar um passo intermediário, antes da próxima reunião de política monetária", diz uma fonte. "Se ele achar que a inflação não vai bem, pode indicar que há alguma coisa a ser feita."

Uma das variáveis relevantes neste momento é o impacto da desoneração dos produtos da cesta básica sobre os preços. Surpreendendo parte dos especialistas, ainda não houve alívio nesses itens. Ao contrário, as coletas diárias da FGV mostram aceleração dos preços. "Se em uma semana esses preços recuarem, o mercado vai achar que o BC já contava com esse efeito ao escrever a ata e as apostas vão convergir com mais força para alta da Selic em maio", diz um analista. Por outro lado, se esses preços resistirem, então o mercado vai atribuir 100% de chance de os juros subirem em abril.