Título: O ministro que segura a ponte entre Dilma e Eduardo
Autor: Junqueira, Caio
Fonte: Valor Econômico, 18/03/2013, Política, p. A9

Fernando Bezerra: "Aposto e trabalho para que Eduardo e Dilma fiquem juntos. Para que as forças que elegeram Dilma em 2010 continuem juntas em 2014"

Fernando Bezerra Coelho, ministro da Integração Nacional indicado pelo PSB de Eduardo Campos, chamou ao seu apartamento no Recife em dezembro o senador Humberto Costa, ex-ministro da Saúde no governo Lula e principal liderança do PT em Pernambuco. Queria iniciar a reaproximação entre os dois partidos após uma eleição municipal virulenta que rompeu a aliança entre os dois grupos políticos, tal qual agora ameaça ocorrer no plano nacional.

Depois dessa primeira conversa, outras ocorreram. A última foi neste mês, durante inspeção de obras da transposição do rio São Francisco. Sozinhos, fizeram um sobrevoo e trataram de dar seguimento às negociações da missão política que avocaram para si: distensionar PT e PSB em nível nacional de modo que seus efeitos alcancem Pernambuco e favoreçam seus projetos políticos.

Bezerra que ser candidato a governador com o apoio de Eduardo, mas enfrenta alguns obstáculos para se viabilizar. O mais evidente deles é o crescimento da possibilidade do governador pernambucano sair candidato a presidente em 2014, o que implicaria rompimento da aliança com o PT e retirada dos cargos que o PSB tem na Esplanada. A começar pelo seu, o mais relevante deles. Fora da Pasta, perde o comando de algumas de suas principais apostas para se eleger: as obras da transposição do rio São Francisco, a construção da ferrovia Transnordestina e de barragens de contenção de cheias no Estado.

Além disso, há dúvidas se Eduardo o apoiaria em sua pretensão. Para alguns integrantes do PSB, o ministro tem características que apavoram o governador-presidenciável. Uma delas: brilho próprio. Tanto que Eduardo lançou - e elegeu - um desconhecido para a Prefeitura do Recife em 2012, o secretário municipal de Planejamento Geraldo Júlio - e agora inclui no rol de cotados para o Palácio do Campo das Princesas outros três mais desconhecidos ainda. São eles os secretários Antônio Figueira (Saúde), Paulo Câmara (Finanças) e Tadeu Alencar (Casa Civil). Outro exemplo: Eduardo lançou a mãe para deputada federal em 2010 para vigiar sua bancada e agora, em 2014, cogita lançar a mulher, Renata Campos.

A outra característica seria a falta de confiança plena de Eduardo em Bezerra por já terem estado em lados opostos na política regional. O caso mais lembrado é o ocorrido após as eleições de 1998. Bezerra apoiou a candidatura à reeleição do avô de Eduardo, Miguel Arraes, que foi derrotado por Jarbas Vasconcelos. Meses após a eleição, foi para o PPS e integrou a base de Jarbas. Voltaria ao PSB em 2005. Em 2006, ajudou Eduardo a vencer a eleição no interior. Virou seu secretário de Desenvolvimento. Quis ser candidato ao Senado em 2010, mas foi preterido. Ganhou, em troca, o ministério. Muitos no PSB acham que a "dívida" de Eduardo com ele já está paga.

Ao Valor, ele negou essas avaliações. "Minha relação com Eduardo é muito próxima e estreita. Não há entre nós uma caderneta aberta de crédito e débito. É uma amizade herdada da relação de meu pai e meu avô com Arraes. Tem uma referência histórica aí que é muito mais sólida. Nas disputas políticas em Pernambuco, sempre estivemos com Arraes". Sobre a fatídica eleição de 1998, afirmou: "Saímos do PSB por questões internas e fomos para o PPS que apoiou Arraes naquela eleição. Depois que o PPS acabou indo para a base." Segundo integrantes do partido, a "questão interna" foi a promessa -não cumprida- de Arraes e Eduardo de lhe dar a presidência do partido no Estado após a eleição. E sua demora em retornar ao PSB ocorreu pois o partido não o apoiou nas vezes em que se elegeu prefeito de Petrolina em 2000 e 2004.

Com isso, é certo que o cenário interno e regional não será tão tranquilo. Por isso Bezerra tenta se cacifar em um movimento de fora para dentro: de Brasília para Recife, e do PT e aliados para o PSB. Sabe que a presidente Dilma Rousseff e o PT querem Eduardo Campos mantido na aliança de 2014 tanto quanto sabe que, se assim o for, quase por inércia, o apoio presidencial o fará candidato certo a governador de Pernambuco. Ele não confirma essa avaliação, mas fala do interesse em disputar o governo: "É evidente que estarei posicionado nesse jogo em Pernambuco, pelo trabalho já desenvolvido no Estado e no governo Dilma. Mas essa discussão é só em 2014", disse.

Até lá, tentará unir Eduardo e Dilma. "Aposto e trabalho para que Eduardo e Dilma fiquem juntos. Para que as forças que elegeram Dilma em 2010 continuem juntas em 2014. O melhor caminho para o PSB é esse. Não vejo caracterizado um quadro de afastamento do PSB do PT".

As conversas que tem mantido com Humberto Costa, que é vice-presidente nacional do PT, são todas nesse sentido. Encontrou no senador uma voz também favorável à manutenção da aliança, até porque há o receio nos petistas pernambucanos de que o PSB possa liquidar o PT em Pernambuco. Como o fez em 2012. Costa começou a campanha com mais de 40% das intenções de voto e terminou com 17,4%, após uma luta interna fratricida. "Nosso plano é estarmos juntos com o PSB em 2014", disse Costa ao Valor.

Para ele, há um intenso fogo-amigo no PSB com o objetivo de enfraquecer Bezerra e, por consequência, a aliança nacional com o PT. Uma das especulações é a de que, se Eduardo sair candidato, Bezerra migraria para o PT e se manteria no ministério. "Ninguém no PT nunca falou disso comigo. Nem Lula, nem [o presidente do PT] Rui Falcão", disse Costa, que complementa: "Até acho que seria um movimento difícil. Já se cogitou isso há alguns anos e o PT de Petrolina rejeitou a ideia com muita contundência".

Bezerra também disse nunca ter havido sequer uma sondagem: "Nunca fui convidado para ir ao PT." Assegurou ainda que, se Eduardo optar pela candidatura presidencial, ele deixa o ministério: "Se o partido tomar essa decisão, eu perco todas as condições de ficar no governo, já que o que me trouxe aqui foi exatamente o fato de estar no PSB."

No Recife, os flagelos da disputa municipal ainda acirram os ânimos de PT e PSB. Petistas, divididos, ainda não definiram se são base, oposição, ou mesmo "independentes" em relação ao prefeito eleito Geraldo Júlio. Ainda assim, mantiveram-se na Secretaria de Habitação. No Estado, a relação é menos tensa, mas permeada de suspeitas. O PT tem ali duas secretarias, Cultura e Transportes.

A oposição no Estado, reduzida hoje ao PSDB, DEM e ao PPS, aposta na divisão das duas forças e tem seus interesses nessa estratégia. Eduardo fica alguma coisa mais fraco sem o PT. Em 2010, com o PT, Dilma e Lula, reelegeu-se governador com 82,5% dos votos. Em 2012, sem o PT, por 1,15% de votos não houve segundo turno. Além disso, a oposição sabe que se tensioná-los regionalmente a repercussão nacional será imediata. Cenário ideal para seu pré-candidato, o senador Aécio Neves (PSDB).

Por essas razões, Costa e Bezerra ampliam o diálogo e se firmam hoje como alguns dos que mais terão influência no destino da relação de Dilma e Eduardo. Relação essa que pode resultar em uma revisão do atual pacto político entre PT e PMDB e uma chapa conjunta da presidente com o governador pernambucano na vice, hipótese ainda acalentada em muitos setores dos dois partidos. A musculatura que Eduardo tem ganhado no meio político pode ser revertida em 2014 a essa formulação. Um sinal disso é que Bezerra chamou Costa em sua casa com o apoio de Eduardo.