Título: Casagrande cobra explicações sobre estaleiro
Autor: Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 18/03/2013, Política, p. A10

Já administrando um "acúmulo de problemas" causados ao Espírito Santo, o governador do Estado, Renato Casagrande, esteve em Brasília na semana passada para tentar barrar mais um. Cobrou explicações dos ministros Guido Mantega (Fazenda) e Fernando Pimentel (Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior) sobre suposta articulação do governo federal para transferir o projeto do estaleiro Jurong, em fase de implantação no município de Aracruz (litoral norte capixaba), para o porto de Açu, do empresário Eike Batista, no Rio de Janeiro.

Casagrande recebeu de Mantega e Pimentel a garantia de que não houve atuação do governo federal nesse sentido. Com essa posição e a reafirmação da disposição da empresa de Cingapura em manter o projeto no seu Estado, o governador considerou o episódio superado e o atribuiu a "ruídos" de comunicação.

Se a transferência do estaleiro para o Rio se confirmasse, seria mais um prejuízo para o Espírito Santo (o empreendimento de R$ 500 milhões vai gerar mais de seis mil empregos diretos), segundo Estado que mais perde com a redistribuição da renda petrolífera e, segundo Casagrande, o mais prejudicado pelas propostas já aprovadas ou em discussão no Congresso Nacional para reformar as relações entre os entes da federação (o chamado "pacto federativo").

O interesse dos ministros em transferir o estaleiro para o porto de Eike teria sido manifestado pelo embaixador brasileiro em Cingapura, Luiz Fernando Serra, que, segundo informações recebidas por Casagrande, teria dito estar seguindo orientação de Mantega e Pimentel.

O senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) do Senado, quer apurar melhor a história. Encaminhou ofício ao ministro Antonio Patriota (Relações Exteriores) pedindo apuração da atuação de Serra, a quem pretende ouvir. "A carreira diplomática é uma carreira de Estado. Os fatos precisam ser devidamente esclarecidos. Se não agíssemos rapidamente, teríamos perdido o empreendimento", diz Ferraço.

Na sexta-feira, o governo capixaba foi o primeiro a protocolar ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a mudança na distribuição da receita de royalties e participações especiais dos contratos de exploração de petróleo em vigor, após a sanção da lei pela presidente Dilma Rousseff, com os dispositivos que haviam sido vetados por ela.

O governador capixaba já determinou corte linear de 10% no custeio, em todas as secretarias, e 10% no investimento, em 2013. O orçamento total do Estado é de R$ 14 bilhões e a receita própria, de R$ 9 bilhões. Mesmo com um "acúmulo de problemas", anuncia "investimento recorde" para este ano, de R$ 2 bilhões, em escolas, hospitais e rodovias, principalmente.

Para o Espírito Santo, o impacto da perda de receita do petróleo será menor do que a do Rio, o maior produtor de petróleo, mas Casagrande diz que é mais um golpe contra o Estado. "A mudança na regra de distribuição dos royalties, a resolução do Senado que unificou a alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre produtos importados e a proposta em discussão de unificação do ICMS interestadual, com cobrança no destino, são assuntos que nos prejudicam muito e criam uma agenda negativa para o Estado", afirma.

O governador afirma que a perda com a mudança na regra dos royalties e participações especiais, no primeiro ano, será de cerca de R$ 800 milhões (R$ 350 milhões de receita do governo estadual e R$ 450 milhões dos municípios produtores). O cálculo é que o Estado deixará de receber quase R$ 10 bilhões até 2020.

Como a arrecadação própria do Estado está em torno de R$ 9 bilhões, a perda imediata dos royalties não causará um desastre ao orçamento, mas Casagrande volta ao "acúmulo de problemas". Só com a Resolução nº 13, aprovada pelo Senado em 2011, que regulamentou a cobrança do ICMS de produtos importados, o governo capixaba deixou de arrecadar R$ 300 milhões a partir de fevereiro de 2013 e os municípios do Estado, R$ 450 milhões.

Já a unificação das alíquotas interestaduais do ICMS, proposta em discussão no Senado, deve causar ao governo do Espírito Santo perda mais R$ 1 bilhão até o fim do prazo (12 anos, de acordo com o texto proposto pelo governo federal).

A expectativa de Casagrande é que o Estado pelo menos não perca receita com a mudança no critério de rateio do Fundo de Participação dos Estados (FPE), também em tramitação no Congresso. O percentual do Estado é de 1,5% (menor que o do Rio, de 1,6%, e maior que o de São Paulo, de 1%), um dos menores do país. A arrecadação com FPE é de R$ 800 milhões por ano.

De todo o pacote de propostas relativas ao pacto federativo em discussão no Congresso, apenas uma é boa para o Espírito Santo: a regulamentação da cobrança do ICMS do comércio eletrônico. Já foi aprovada no Senado e está na Câmara.