Título: Goldman monta banco completo no Brasil
Autor: Carvalho, Maria Christina
Fonte: Valor Econômico, 15/03/2007, Finanças, p. C10

A Goldman Sachs anunciou, ontem, o lançamento oficial de seu banco no Brasil. O co-presidente do banco americano, Gary Cohn, disse ao Valor que "não terá limite de capital para operar no Brasil" e que quer ser o banco de investimento número um do mercado. "Teremos o capital necessário para administrar nosso negócio do modo mais eficiente possível. Se houver uma oportunidade única e tivermos que injetar capital não perderemos a chance por esse motivo", afirmou Cohn. O executivo chegou, ontem, em São Paulo, especialmente para contar a novidade em dois eventos que reuniram um total de 450 clientes.

Na verdade, a Goldman opera há 17 anos no país e é um dos líderes na assessoria em fusões e aquisições. O banco existe desde 2001, praticamente adormecido, com a carteiras de investimento; a de financeira foi obtida em 2002. O balanço de 2006 informando ao Banco Central (BC) registra um patrimônio de R$ 216 milhões e ativos totais de R$ 667,9 milhões. Mas, agora, as operações locais estão ganhando músculos e, principalmente, mais cérebros, permitindo replicar no Brasil a estrutura vencedora que a Goldman possui nos Estados Unidos e que lhe garantiu um lucro líquido de US$ 9,5 bilhões no ano passado e o posto de empresa de valores mobiliários de maior valor de mercado do mundo.

Em 2005, o banco americano chegou a negociar a compra do Pactual, mas não deu certo e a instituição brasileira acabou se associando ao suíço UBS. A partir de então, resolveu crescer orgânicamente no país.

"O crescimento orgânico está no centro do que é a Goldman Sachs", disse Cohn, lembrando que essa estratégia prevaleceu no estabelecimento da instituição na Europa, Hong Kong, China e Tóquio. Em alguns mercados, como na Índia, foram feitas joint ventures. Mas, segundo Cohn, há sempre a questão de aplicar "os altos padrões morais, legais, éticos e de compliance", do grupo. Segundo o executivo, "é mais fácil construir a operação do zero e ter o controle do negócio. Pode levar um pouco mais de tempo para chegar lá, mas sentimos que esse é o melhor para nós e nossos acionistas". Cohn negou categoricamente que ainda desejasse ir às compras: "Não temos expectativa ou plano nesse momento de fazer qualquer aquisição na América Latina e no Brasil especificamente".

"Acreditamos que, com as pessoas e as licenças necessárias, não precisamos adquirir ninguém. O crescimento orgânico nos permite ser donos do nosso destino. Pode demorar mais. Mas, banco não está preocupado em correr e sim em fazer a coisa certa", concordou o presidente das operações no Brasil, Eduardo Centola.

Cohn explicou que a Goldman está "no início de um processo de construir uma operação completa no Brasil. Há diferentes tipos de licenças e filiações a bolsas que precisam ser obtidas. Faremos todas essas coisas o mais rápido possível, mas também o mais metodicamente possível".

Centola disse que o primeiro passo foi dado em dezembro com a compra da licença para operar com câmbio, juros e commodities na Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F). Nesse curto espaço de tempo, a Goldman já é uma das maiores do mercado, com 20% a 30% das posições em aberto, segundo Centola. O que garantiu o avanço foi o fato de a Goldman já operar com esses ativos no mercado de balcão, a partir de Nova York. Quando a licença para a BM&F foi obtida, a mesa com cerca de 30 profissionais foi trazida para o Brasil.

Outra área já montada é a de pesquisa de ações, comandada pelo analista Stephen Graham e com uma equipe de sete profissionais. Muitas das novas contratações não podem ser divulgadas, disse Centola, porque os profissionais estão no período de quarentena, que varia de dois a três meses nos bancos de investimento. Pessoas familiarizadas com estrutura da Goldman no Brasil dizem que o quadro já supera os 100 funcionários e a previsão é dobrar até o final do ano.

Cohn acredita que a área de pesquisas deverá atrair mais investimentos ao Brasil. "Nossa pesquisa é séria e será distribuída no exterior, dando confiança ao investidor", afirmou.

O banco também terá áreas de emissão de títulos de renda fixa e de ações para empresas no mercado local, que vão trabalhar lado a lado com a de fusões e aquisições, com acontece no exterior. Além disso, desenvolverá negócios de administração de recursos de terceiros, private banking e a corretora. "2007 ainda será um ano de transição; 2008 será completo", disse Centola.

A Goldman desenvolverá ainda no Brasil uma área pouco conhecida que, segundo analistas internacionais, é a principal responsável pelos bons lucros do banco: a de investimentos proprietários, ou seja, do capital próprio. "A Goldman é como um carro de corrida de alto desempenho, mas cujo motor não conhecemos", disse um analista da CreditSights à revista americana "Business Week", referindo-se a essa área do banco.

Centola lembrou que a Goldman já investiu recursos próprios na empresa de aviação BRA e acaba de fechar o lançamento de títulos do projeto de etanol da Brenco. Além disso, o banco estava disposto a financiar com seu próprio balanço a aquisição da Corus pela CSN, cuja oferta chegou a superar US$ 11 bilhões. "Seria a primeira aquisição alavancada de uma empresa brasileira. Estávamos lado a lado com o cliente", disse Centola.

Cohn, que vinha ao Brasil desde a década de 90, quando comandava a mesa de commodities e "comprava dois terços da produção de minério da Vale do Rio Doce", garantiu que a turbulência no mercado americano de hipotecas não afeta os planos da Goldman Sachs no Brasil. "Um dos principais projetos em que estamos trabalhando é na expansão da nossa marca em regiões novas ou nas quais nossa presença é pequena. É uma estratégia de longo prazo", disse Cohn.

O executivo afirmou que o trimestre cujo balanço acaba de ser divulgado pelo banco, com lucro líquido de US$ 3,2 bilhões, é o primeiro em que mais de metade das receitas veio de operações fora dos Estados Unidos. "Estamos trabalhando nessa estratégia."