Título: Países emergentes são porto seguro nas turbulências
Autor: Lucchesi, Cristiane Perini
Fonte: Valor Econômico, 19/03/2007, Finanças, p. C3
Os mercados emergentes se transformaram em um refúgio de tranqüilidade em meio às turbulências no setor de hipotecas de alto risco nos Estados Unidos. Esta é a visão dos analistas Guilhermo Mondino e John Welch, da Lehman Brothers. Segundo eles, o Brasil, que tradicionalmente era o país mais afetado entre os emergentes por terremotos financeiros externos por causa da liquidez dos papéis de sua dívida externa desta vez ficou junto com o Peru e Colômbia entre os créditos mais seguros.
Em uma comparação dos prêmios dos "swaps" de crédito dos países emergentes de vencimento em cinco anos, o brasileiro subiu 16% desde o início da crise, com relação aos 40% da Argentina, 28% da Venezuela e 20% da Turquia.
Para os analistas, as principais razões para a mudança foram a magnitude do resgate antecipado da dívida externa brasileira e a queda nas relações entre essa dívida líquida e o Produto Interno Bruto e as exportações, além da inflação baixa. "Mesmo os mercados locais de juros, câmbio e ações do Brasil se comportaram relativamente bem, começando a se assemelhar mais com os do México", dizem, em relatório que acaba de ser divulgado.
Em relação às turbulências financeiras anteriores, o Índice Morgan Stanley Capital International (MSCI) com ações de mercados emergentes caiu menos agora. Em abril e maio de 2004, o MSCI para emergentes desvalorizou 20,4%, contra um tombo de 5,2% no índice de ações americano Standard & Poor's. Em maio e junho de 2006, as quedas foram de 24,5% e 7,4%, respectivamente. Agora, a queda de 5,1% no S&P resultou em uma desvalorização de apenas 10,2% nas ações dos países emergentes.
Mesmo o prêmio de risco de crédito dos emergentes teve menos volatilidade agora do que no ano passado. O índice CDX dos "swaps" de crédito destes países mostrou menor oscilação do que o CDX de títulos de alto risco no mercado americano ("high yield"). Os prêmios de volatilidade de 30 dias dos emergentes subiram menos do que os do mercado de "high yield" americano e estão em nível menores. "Os mercados estão nos dizendo claramente que eles esperam que os países emergentes vão se sobressair em performance", afirmam Welch e Mondino.
Ao que tudo indica, por enquanto, a crise de liquidez nos mercados tem se restringido aos derivativos de crédito que têm relação com as hipotecas de alto risco nos Estados Unidos. As perdas com a marcação a mercado dos pacotes desses derivativos chegam a US$ 20 bilhões, ou 6% do valor desse tipo de instrumento, calcula a Lehman Brothers. Os prejuízos, embora grandes, não parecem suficientes para desencadear um problema de liquidez geral nos mercados, acreditam.
Para os analistas, a principal fonte de contágio da crise das hipotecas de alto risco nos EUA seria via crescimento econômico americano, mas o impacto seria diluído de 2007 a 2011, com enfoque principal em 2008 e 2009. Além disso, para a Lehman Brothers, as chances de uma recessão se restringem a 20%. Mesmo no caso de uma recessão mais abrupta nos EUA, "as taxas de juros provavelmente cairiam, restaurando a liquidez no mercado". Além disso, o crescimento econômico de outros países poderia compensar a queda na demanda americana, segundo eles.
Para David Beker, estrategista da Merrill Lynch, o que traz mais volatilidade ao mercado de câmbio e de juros hoje no Brasil é o IPCA-15 e os resultados do Produto Interno Bruto e não indicadores econômicos americanos.
"No Brasil, os mercados continuam a ser bem resistentes às turbulências nos Estados Unidos", concorda Alexandre Lintz, estrategista para América Latina do BNP Paribas. Segundo ele, os fortes fundamentos, em especial em termos de balanço de pagamentos, justificam a estabilidade nos mercados locais.
"Quando o mercado se estabilizar, nós devemos continuar a ver um forte apetite pelos ativos de mercados emergentes", continua Lintz, para acrescentar, "ainda assim, em geral, nós recomendamos ativos de países com baixa dependência com o crescimento nos EUA e conta corrente fortalecida".