Título: EUA querem atrair setor privado
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Fonte: Valor Econômico, 30/03/2007, Brasil, p. A3

Os Estados Unidos temem que a falta de interesse do setor privado reduza o alcance da iniciativa lançada em conjunto com o Brasil no início do mês para promover o consumo e a produção de combustíveis alternativos como o etanol na América Latina, comprometendo alguns dos principais objetivos do projeto.

O assunto fará parte das conversas que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá amanhã com seu colega americano, George Bush, em Camp David, a casa de campo do presidente dos EUA nos arredores de Washington. O acordo para promoção dos biocombustíveis foi assinado pelos dois no dia 9, durante visita de Bush ao Brasil.

Um grupo formado por funcionários dos dois governos começou a discutir ontem os passos necessários para transformar em ações concretas as diretrizes delineadas pelo acordo. Amanhã, Lula e Bush devem anunciar os integrantes de um grupo de países da América Central e do Caribe em que eles pretendem concentrar esforços agora.

O Haiti fará parte da lista. O país precisa de investimentos para superar seus graves problemas econômicos e sociais e os dois governos identificaram numa planta cultivada na ilha grande potencial para a produção de biodiesel. Mas até agora eles não encontraram nenhuma empresa que tenha interesse em investir numa usina no Haiti.

"O papel dos governos nesse processo é arrumar a mesa para que o setor privado entre em ação", disse ontem um funcionário americano envolvido com os preparativos da reunião de Lula com Bush. "São as empresas que vão tornar isso realidade." Investidores brasileiros e americanos têm vários projetos em curso na região, mas nem sempre eles coincidem com os objetivos estabelecidos pelos dois governos.

A Casa Branca quer usar o acordo com o Brasil para estimular a produção de biocombustíveis para consumo doméstico, como um meio de reduzir a dependência dos países da região de petróleo importado. Mas o Brasil vê a iniciativa principalmente como uma maneira de ampliar o mercado existente para o etanol produzido no país.

Investidores que acompanham a discussão acham que o acordo entre os dois países dificilmente produzirá resultados significativos se o governo americano mantiver fora da conversa a possibilidade de eliminar as barreiras tarifárias que hoje dificultam a entrada de álcool importado nos EUA. Para eles, o fim dessas barreiras no maior mercado consumidor do mundo seria uma forma mais eficaz de estimular investimentos em lugares como a América Central.

A eliminação das barreiras tarifárias é uma questão delicada nos EUA e é por isso que o tema ficou fora das negociações com o Brasil até agora. As tarifas que encarecem a importação do etanol produzido em países mais competitivos como o Brasil ajudam a proteger a indústria americana de etanol, que se expandiu muito nos últimos tempos.

Lula e Bush também deverão anunciar amanhã a disposição de investir cerca de US$ 8 milhões em estudos para examinar a viabilidade da produção de biocombustíveis nos países escolhidos para deslanchar a iniciativa. Cerca de US$ 7 milhões deverão sair de um fundo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e cada país entrará com US$ 1 milhão.

O outro assunto que deve tomar bastante tempo na conversa dos dois presidentes amanhã é a Rodada Doha de liberalização do comércio mundial. As negociações foram suspensas em julho de 2006 e os esforços para retomá-las têm dado pouco resultado. O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, vai se reunir hoje com a representante comercial dos EUA, Susan Schwab, em Washington.

Lula e Bush também devem assinar amanhã um acordo de cooperação para ajudar Guiné-Bissau a desenvolver suas instituições democráticas, memorandos na área de educação e um acordo para permitir a troca de informações na área tributária, considerado um primeiro passo para a discussão de um tratado que impeça a dupla tributação de empresas que têm negócios nos dois países. (RB)