Título: Fed decide manter estímulos à economia
Autor: Costa, Roberta
Fonte: Valor Econômico, 21/03/2013, Finanças, p. C1

Sem surpresas, o Federal Reserve (Fed) manteve a taxa de juros dos Estados Unidos entre 0% e 0,25% e intacto o programa de compras de ativos de US$ 85 bilhões ao mês entre treasuries e MBS (títulos lastreados em hipotecas). No comunicado da reunião, o BC americano afirmou que a economia voltou a crescer a um ritmo moderado depois de uma pausa no ano passado, mas que há riscos de baixa para a perspectiva da economia.

Não houve mudanças na apresentação das novas projeções do banco central, como o mercado esperava. Em uma conta simples, a mediana para a taxa de desemprego caiu para os próximos três anos, atingindo 6,25% em 2015. Considerado o parâmetro de 6,5% utilizado pelo Fed, seria aí que a política monetária seria apertada, já que as projeções de inflação também caíram nos três períodos chegando a 1,85% em 2015 (o parâmetro é 2,5%). Também a expectativa de crescimento foi reduzida, um movimento que não surpreende pela questão fiscal, que vai subtrair até 1,5 ponto percentual do crescimento, segundo projeção do Congressional Budget Office.

Apesar do crescente debate entre os membros do comitê de política monetária acerca dos benefícios, custos e riscos do programa, a decisão pela sua manutenção foi quase unânime, uma vez que apenas Esther L. George votou pela interrupção do chamado "quantitative easing" (QE).

O Fed mencionou no documento, entretanto, que vai continuar a pesar a eficácia e os prováveis custos do programa bem como o progresso de seus objetivos econômicos, o que foi reforçado pela fala de Bernanke: "Os membros do Fed concordam que o custo do QE continua administrável".

Justamente o balanço de prós e contras do QE tem sido o grande tema de debate atualmente, especialmente após o estudo sobre a possibilidade de uma bolha de crédito levantada por um novo membro do Fomc, Jeremy Stein. O risco é que haja prejuízos no balanço do Fed (de US$ 3 trilhões) quando os juros voltarem a subir.

Analistas esperavam indicações do começo de uma "estratégia de saída" pelo Fed e, de certa forma, elas vieram. Bernanke disse que o Fed pode ajustar o ritmo de suas compras à medida que a economia reaja. Isso ratifica a expectativa coletada pelo Valor com 12 bancos estrangeiros de que a redução do passo das compras ocorra a partir do segundo semestre e seu término no fim do ano que vem.

A redução em si seria um sinal para o mercado de como o banco central interpreta os progressos da economia, ou seja, já seria o começo da normalização da política acomodatícia. Em outras palavras, depois do fim do QE preparam-se para o começo do aperto dos juros. Neste ambiente, a comunicação do Fed terá papel ainda mais fundamental para orientar os mercados daqui para frente. É o que Bernanke já havia dito em uma conferência no início do mês com um tema incomum a banqueiros centrais (nas palavras dele, tema que evitariam "cuidadosamente"): as taxas de juros de longo prazo.

Na palestra, o presidente do BC americano disse que a transparência é o elemento fundamental que distingue a estratégia de saída da política atual com o ambiente que vigorava em 1994, sob o comando de Alan Greenspan. Naquele momento, o Fed aparentava estar "atrás da curva", já que a economia se aqueceu rapidamente mostrando pressões inflacionárias. Foi necessário subir fortemente a taxa básicas de juro (de 3% para 5,5%), o que afetou drasticamente as taxas longas (o retorno do papel de 10 anos subiu 220 pontos base ao longo de um ano).

Bernanke parece ter alertado agora para o fato de que o passado é, sim, um bom guia, e que o Fed não pretende incorrer nos mesmos erros, portanto todos os movimentos serão amplamente divulgados. Não só uma meta de inflação de longo prazo foi instituída (2%), como o BC se comprometeu a manter as taxas de juros em nível baixíssimo enquanto a taxa de desemprego estiver acima de 6,5% e desde que a inflação não ultrapasse 2,5%.

Falando de perspectivas para as taxas longas, Bernanke, lançando mão de vários modelos, vê os juros de 10 anos subindo 100 pontos base ao fim de 2014 e 175 pontos ao fim de 2017. A expectativa do mercado compilada pelo Fed, sob diferentes modelos, aponta os mesmos 100 pontos de alta até 2014 e entre 200 e 300 pontos até 2017.

A diferença entre as projeções embute justamente a incerteza acerca do longo prazo. O risco de um aumento inesperado das taxas de juros tem balizado as preocupações do mercado, além do fato de que podem afetar fortemente o balanço do Fed.

Dessa forma, uma saída lenta e coordenada ao limite é o cenário mais provável de ocorrer. Com o mandato acabando em janeiro do ano que vem, só resta saber se Bernanke estará lá para ver.