Título: Presidentes devem cobrar mais concessões da UE
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 30/03/2007, Brasil, p. A3

Os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e George W. Bush devem reafirmar em Camp David o engajamento por um acordo "mais ambicioso" na Rodada Doha, o que implica cobrar mais concessões agrícolas por parte da União Européia (UE). Mas Lula deve insistir também para os próprios EUA mostrarem mais liderança e indicar concretamente maiores cortes nos subsídios que mais distorcem o comércio agrícola global.

Só que na Europa aumenta o ceticismo sobre as chances de sucesso da negociação global. Na Alemanha, decisiva na posição européia, a mobilização é pouca. De um lado, o país é o maior exportador mundial. De outro, dá prioridade à sua relação privilegiada com a França, para romper o impasse em torno de um tratado de constituição européia. E isso implica apoiar de alguma forma a rejeição francesa contra ampla abertura agrícola.

O Brasil é o que mais aposta, mesmo "cautelosamente", em avanço para concluir nos próximos meses as modalidades para cortar os subsídios e tarifas agrícolas e industriais, de forma que a rodada poderia terminar em 2008.

Nesse cenário, o encontro de Lula e Bush é considerado da maior importância. "O diálogo mostra que os EUA vêem o Brasil como extremamente importante na Rodada Doha, para alcançar um acordo", avalia o embaixador brasileiro na OMC, Clodoaldo Hugueney.

Mas é evidente que nem Lula nem Bush vão entrar em detalhes. Depois da conversa presidencial neste sábado, negociadores do Brasil, EUA, UE e Índia voltam a se reunir de segunda a quarta-feira em Paris. No entanto, não está claro quando os principais ministros vão se sentar pela primeira vez na mesa, desde julho do ano passado, para discutir juntos as cifras de eventuais cortes de alíquotas e de subvenções agrícolas e industriais.

Isso não deve ocorrer nas reuniões de ministros do G-6 (inclui Austrália e Japão), no dia 12 em Nova Déli. Os principais países ainda vão negociar o cronograma e o formato do que pode ser última oportunidade de sucesso, ou a rota para o fiasco da negociação.

Em Genebra, representantes da indústria européia se reuniram com várias delegações e saíram sem entusiasmo. Os europeus decidiram enviar uma missão ao Brasil para abrir negociações com a indústria brasileira, copiando iniciativa tomada pelos americanos.

Ao contrário dos EUA, a Europa não coloca prioridade na negociação de acordos setoriais. Mas os representantes da indústria querem discutir a rodada como um todo. Hugueney disse a empresários europeus que o Brasil não aceita uma fórmula de redução tarifária com coeficiente 15, que implica reduzir de 35% para 10,5% a alíquota máxima no país. Mas disse que, mesmo com proteção de determinados setores, a liberalização na área industrial vai ultrapassar os resultados das negociações anteriores.

Enquanto isso, três cenários alimentam discussões na Europa: o fiasco da rodada; congelar os resultados obtidos e dar uma pausa aos países, ou então um acordo com pouco nível de liberalização. O terceiro é o que menos pode interessar a brasileiros e americanos. E o primeiro é o que menos pode interessar à maioria dos membros da Organização Mundial do Comércio (OMC). Isso porque afetaria até a "jóia da coroa", como é chamado o mecanismo de solução de disputas. Se não houver progressos concretos até junho na OMC, o segundo cenário, de congelamento dos resultados, pode ser o mais provável. Mas a maneira de negociar entre 127 países certamente voltará à mesa de discussão mais cedo que se espera.