Título: Bens importados já representam 19% da produção industrial
Autor: Durão, Vera Saavedra
Fonte: Valor Econômico, 30/03/2007, Brasil, p. A4

A presença dos importados no consumo doméstico do país cresceu bastante nos últimos três anos, situando-se num patamar de 5,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2006, revela estudo do BNDES. Este percentual é relativamente baixo se comparado à média mundial de 15%, diz Fernando Puga, autor do trabalho divulgado ontem pela Secretaria de Assuntos Econômicos (SAE), da presidência do banco. No mesmo período, o percentual de penetração da importação na indústria de transformação saltou para 19%, o maior nível dos últimos 11 anos.

Para Puga, o fenômeno foi estimulado também pela apreciação cambial que ajudou a ampliar a presença dos importados na maioria dos setores industriais. A única exceção foi do setor de máquinas de escritório e informática. Os números levantados pelo economista revelam que os segmentos industriais intensivos de mão-de-obra e o de máquinas e equipamentos industriais foram os mais afetados pela enxurrada de compras externas, sofrendo dura concorrência dos produtos chineses, num ambiente de câmbio apreciado.

No entanto, o economista avalia que o fato não chega a constituir um processo de desindustrialização, indicando mais uma mudança no perfil da produção. "A presença maior dos importados, que decorre também de um movimento mundial de maior intercâmbio entre os países, está tendo efeitos concentrados em alguns setores, como de calçados e têxteis e de máquinas e equipamentos industriais. Na verdade, isto sinaliza mudanças no perfil da produção. E o que vemos claramente é que o trabalho é que está sendo mais afetado. A situação é preocupante e é preciso ter políticas para lidar com esta transição", alerta Puga.

Ele mediu o coeficiente de penetração das importações - indicador que mede o impacto do volume das importações na indústria de transformação - nos diferentes setores da indústria. O mais impactado foi o de máquinas e equipamentos industriais, que registrou um avanço de quase 10 pontos percentuais entre 2003 e 2006, saltando de um patamar de presença de importados de 28% em 2003, para 37% no ano passado.

Na média dos setores intensivos em mão-de-obra, o incremento no coeficiente dobrou de 5% para 10% em três anos. A presença de importados no setor têxtil triplicou, saindo de 7% para 12%. E dobrou de 3% para 6% na indústria calçadista. Mesmo assim, a participação das importações no consumo doméstico destes setores situa-se bem abaixo da média da indústria de transformação. Para o cálculo do consumo, o economista utilizou o dado de produção doméstica, menos exportações e mais importações.

Os dados revelam, porém, que os setores de calçados, têxteis e vestuário estão perdendo espaço na produção nacional e outros setores ligados aos insumos básicos, como siderurgia, papel e celulose, estão crescendo e investindo em novas plantas, o que dá uma indicação de que não está ocorrendo um movimento de desindustrialização no país, na avaliação do economista do BNDES. No caso de máquinas e equipamentos, Puga reconhece que este é um segmento de fortes diferenciações. Mas, as fábricas de máquinas para fins industriais vêm sofrendo forte concorrência chinesa.

O coeficiente chegou a níveis recordes no setor de material eletrônico e de comunicações e de equipamentos médicos e ópticos. A presença dos importados nos eletroeletrônicos e aparelhos de comunicação chegou a 51% no ano passado, ante 34% em 2003. No segundo caso, dos equipamentos médicos e óticos, bateu o recorde, alcançando o nível de 68%. Puga explicou que este desempenho não chama atenção, pois estes setores, com destaque para o eletrônico, já tem um altíssimo coeficiente de importação há muito tempo. "O setor é basicamente de montagem de eletrônicos e vai continuar importando kits cada vez mais baratos, derrubando preços de TVs e outros equipamentos para vender cada vez mais no mercado consumidor doméstico".

Para fazer estes cálculos, ele levantou números de importações junto à Secex, do Ministério do Desenvolvimento e compatibilizou as classificações de produtos com a CNAE usada pelo IBGE. "Trabalhei sempre com volumes de importação", informou. Também procurou deflacionar dados para calcular os coeficientes com base na paridade do poder de compra de 2000. "Medi as quantidades importadas, tentando retirar dos cálculos efeitos meramente cambiais", explicou Puga.

Na sua análise, o coeficiente de 19% da indústria de transformação brasileira é alto, mas não há um sinal claro de que vai aumentar se for mantido este patamar de câmbio. Para ele, a indústria não está perdendo espaço e o efeito cambio é diluído em setores que estão se beneficiando, como a indústria extrativa e de logística, enquanto o trabalho é que vem sendo afetado. "O que me preocupa é esta transição. É preciso levar em conta os custos econômicos e sociais decorrentes destas mudanças".