Título: Meganegócios dobram volume de trabalho nos órgãos da concorrência
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 02/04/2007, Brasil, p. A2

Meganegócios, como a compra da Varig pela Gol, do Mate Leão pela Coca-Cola, da Cintra pela Ambev e da Ipiranga pelos grupos Ultra, Braskem e Petrobras, fazem parte de um movimento crescente de fusões e aquisições no Brasil que desafia os órgãos de defesa da concorrência e tem provocado efeitos em Brasília. As fusões que chegam primeiro ao Ministério da Fazenda e depois ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) dobraram no início deste ano.

Durante o ano passado, as autoridades que julgam as fusões no Brasil receberam cerca de 30 novos negócios para julgar por mês. Em janeiro deste ano, este número saltou para 60. Em fevereiro, começaram a surgir os meganegócios, com a notificação da compra da Leão Júnior pela Coca-Cola, logo após o Carnaval.

A presidente do Cade, Elizabeth Farina, afirmou ao Valor que o órgão antitruste possui condições para dar uma resposta rápida a este "boom" de fusões. "Estamos preparados para receber (essas novas fusões) e não vamos criar nenhum problema ao andamento fluído da economia."

Atualmente, a Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) do Ministério da Fazenda demora, em média, apenas 15 dias para analisar fusões e aquisições consideradas simples e o Cade vota estes mesmos processos em 19 dias. Mas os problemas começam quando as fusões englobam grandes empresas, como os recentes casos envolvendo a Ambev e a Coca-Cola, ou setores essenciais à economia, caso da compra da Ipiranga que terá repercussões nos setores petroquímico e de combustíveis.

Farina garantiu que o Cade não tem demorado mais de um ano no julgamento de fusões complexas. Ela lembrou que o caso Vale - que comprou oito mineradoras - foi votado em apenas sete meses. Mas, seria muito importante, na sua opinião, que o Congresso votasse o projeto de lei que altera a forma de julgamento das fusões e aquisições. O projeto reduziria drasticamente a burocracia no julgamento destas operações. Só casos complexos seriam julgados pelo Cade. E muitas fusões nem seriam mais notificadas ao órgão antitruste.

A Lei atual (n 8.884, de 1994) prevê que qualquer empresa que faturar mais de R$ 400 milhões no Brasil deve notificar as fusões e aquisições que fizer no mercado. Por isso, costuma-se dizer no Cade que, se a Unilever comprar um carrinho de pipoca, terá de submetê-lo à aprovação. E isso tem um custo. Ao notificar uma aquisição ao Cade, as empresas pagam R$ 45 mil apenas em taxas processuais - fora o gasto com advogados.

O projeto estabelece que não só o faturamento da compradora deverá ser levado em conta para efeito de notificação de fusões, mas o da empresa que está sendo adquirida também. Será considerado um faturamento de, no mínimo, R$ 150 milhões para o comprador, e de R$ 30 milhões para o vendedor. Com isso, as autoridades receberão menos processos para julgar e poderão focar as atenções nas fusões mais complexas e relevantes.

Para a secretária de Direito Econômico do Ministério da Justiça, Mariana Tavares de Araújo, os órgãos antitruste estão "bem equipados" para responder ao atual "boom" de fusões. "Agora, é claro que as mudanças previstas no projeto de lei poderão conferir agilidade ainda maior."

Para Mariana a organização atual dos órgãos antitruste do governo não é a ideal. Os ministérios da Fazenda e da Justiça estão dividindo serviços justamente para agilizar os julgamentos. A Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) tem se focado nas fusões consideradas simples, dando espaço para a Secretaria de Direito Econômico (SDE) investigar cartéis. "Não seguramos aqui os casos já analisados pela Seae", explicou. "Mas os processos que merecem uma análise mais pormenorizada, as chamadas fusões complexas, fazemos junto com a Seae."

O ideal, disse a secretária, seria que essa divisão de tarefas fosse formalizada em lei para não depender da boa vontade dos secretários de trabalhar em parceria. Neste sentido, o projeto prevê que a análise de fusões será feita por uma superintendência, que unirá os trabalhos da Seae e da SDE, antes deles serem enviados ao Cade.

O projeto que acelera o julgamento dos meganegócios está sem relator. Em fevereiro, o deputado Ciro Gomes (PSB-CE) fez um acordo com a presidência da Câmara para ser o relator. Mas, na semana passada, o bloco PSB-PDT-PCdoB-PMN-PHS-PRB indicou o deputado Evandro Milhomem (PCdoB-AP).