Título: Sem encomendas, fornecedor de teles pressiona governo
Autor: Moreira, Talita e Magalhães, Heloisa
Fonte: Valor Econômico, 02/04/2007, Empresas, p. B3

Uma crise ronda os fornecedores de infra-estrutura para telecomunicações. A diminuição do ritmo de investimentos das operadoras de telefonia móvel e a falta de grandes projetos para as fixas no curto prazo tornam duvidosas as perspectivas para os fabricantes - que não por acaso defendem urgência na realização dos leilões de WiMax (banda larga sem fio) e da terceira geração de celular (3G) para movimentar o mercado.

A Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) prevê queda de 3% no faturamento dos fabricantes neste ano, em comparação com os R$ 16,7 bilhões alcançados em 2006. Não é uma redução insignificante, levando-se em conta que o setor de telecomunicações tradicionalmente cresce mais do que o PIB.

Maior fornecedor de infra-estrutura de telefonia do país, a sueca Ericsson convive com grande ociosidade na sua fábrica, em São José dos Campos (SP) - a ponto de discutir alternativas que não excluem o fechamento da unidade, segundo fontes ligadas à empresa.

O novo presidente da Ericsson no país, Johan Wibergh, afirmou esperar que uma medida drástica não seja necessária. "Claro que é difícil manter uma fábrica que não tem nada para produzir", disse ao Valor o executivo, que assumiu o cargo em janeiro. "Mas o mercado brasileiro é crescente e importante para a Ericsson. Esperamos poder manter a fábrica por muitos e muitos anos." O Brasil é um dos quatro países onde a empresa tem unidades de produção. Os outros são Suécia, China e Índia.

O contrato para a construção da rede GSM da Vivo deu força aos negócios em 2006. Porém, não impediu a queda da receita líquida consolidada da Ericsson, que passou de R$ 2,4 bilhões em 2005 para R$ 2 bilhões no último ano. O lucro líquido baixou de R$ 572,7 milhões para R$ 367,8 milhões.

De acordo com Wibergh, as entregas para a Vivo deverão prosseguir em boa parte deste ano. As exportações também têm ajudado a manter a fábrica ativa. Mas os volumes de produção já são bem menores que os do ano passado. "Eu realmente espero que os leilões de 3G e WiMax aconteçam para que haja mais investimentos. No cenário atual, há muita incerteza para todo mundo", destacou.

Na Siemens, a produção da área de redes (desde sábado integrada a uma parceria com a Nokia) está 50% inferior à de 2005, disse o vice-presidente de telecomunicações, Aluizio Byrro. "Até 2005 as encomendas vinham bem. A queda forte começou no ano passado e está se acentuando agora", disse. "Não reduzimos pessoal porque seria precipitado. Mas não teremos outra alternativa se continuar assim."

Com o objetivo de convencer o governo a acelerar as licitações, os principais fabricantes - representados pela Abinee - foram a Brasília há duas semanas, conforme noticiou o Valor no dia 21. O grupo conversou com o ministro das Comunicações, Hélio Costa, que tem defendido uma solução rápida para a venda das licenças de 3G e de WiMax (estas últimas foram licitadas no ano passado, mas o processo emperrou na Justiça por divergências entre as teles e a Anatel).

"Se nada disso acontecer, vai ter queda na receita do setor. Vai ser um ano difícil", disse o presidente da Nortel, Juan Chico.

Para o presidente da Alcatel-Lucent, Jonio Foigel, só os leilões não bastam. Na avaliação dele, operadoras e fabricantes também sentem os efeitos de outro complicador: a falta de um modelo regulatório que defina parâmetros para a prestação de serviços multimídia pelas teles. "Ou se faz isso de forma estruturada ou a tecnologia não vai esperar. Para entrar nesse mercado, as empresas vão acabar encontrando caminhos que talvez não sejam os ideais", ponderou.

Desde a privatização, a trajetória dos fabricantes teve altos e baixos. Inicialmente, a corrida das concessionárias para antecipar as metas de universalização recheou as carteiras de pedidos. Em 2002, último ano dessa fase, somente as teles fixas investiram R$ 17 bilhões. Depois disso, os gastos recuaram para algo entre R$ 4 bilhões e R$ 7 bilhões ao ano, o que levou os fornecedores a demitir em massa e a terceirizar a produção. Em 2004 e 2005, foi a vez de as empresas de celular investirem para construir e ampliar suas redes. Agora, esse ciclo chegou ao fim.

Os primeiros sinais de desaquecimento começaram no ano passado, quando a receita da indústria aumentou 2%. "Tirando da conta as vendas de aparelhos de celular, o setor encolheu", afirmou o diretor da área de telecomunicações da Abinee e presidente da japonesa Nec, Paulo Castelo Branco.

As operadoras móveis adicionaram 13,7 milhões de clientes em 2006, expansão de 16%, ou metade da taxa registrada no ano anterior. Com a infra-estrutura pronta, rentabilidade baixa e crescimento mais lento, as empresas não têm mais grandes projetos. O último foi a rede no padrão GSM montada pela Vivo, encomendada à Ericsson e à Huawei. Em meio à escassez de encomendas, a operadora conseguiu negociar um preço considerado muito baixo para os equipamentos, nos quais está desembolsando quase R$ 1,1 bilhão.

O segmento de banda larga é o que permanece mais aquecido na carteira dos fornecedores. As teles ampliando a capacidade de suas redes para acompanhar o crescente tráfego de dados em protocolo de internet. A prestação de serviços e as vendas para o mercado corporativo também servem de alento.

Na área de equipamentos de uso residencial (telefones fixos e modems de banda larga), a Siemens opera com volumes estáveis e prevê receita de 10% a 15% maior neste ano. "As operadoras estão investindo em internet para garantir a fidelidade de seus clientes", afirmou o diretor de vendas para a América Latina, Roberto Bruder.

Mas isso não sustenta o setor, na visão de Castelo Branco, da Abinee. "É preciso ter novas tecnologias para gerar novos investimentos."