Título: Dengue e as chuvas de verão
Autor: Tauil,Pedro Luiz
Fonte: Correio Braziliense, 22/12/2010, Opiniao, p. 17

Epidemiologista, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília

Apesar de haver registro de casos de dengue durante todos os meses do ano, existe, sem dúvida, aumento significativo de ocorrências nos meses quentes e úmidos, em geral de novembro a maio. Isso se deve ao fato de que nesse período cresce o número de criadouros preferenciais, mas não exclusivos, do principal vetor da doença, o mosquito Aedes aegypti, que são os reservatórios artificiais de água. Essa é a razão para que sejam redobrados os esforços de controle do vetor, nessa época do ano.

Até o momento, o mosquito é o único elo vulnerável da cadeia de transmissão da doença para reduzir a sua incidência. É verdade que está em desenvolvimento uma vacina protetora contra os quatro tipos de vírus do dengue, já em fase de testes em seres humanos, porém serão necessários alguns anos para validação da sua efetividade e segurança. Ainda não existe tratamento eficaz para matar o vírus. O tratamento é apenas sintomático.

Assim, a redução do número de casos depende da redução do número de mosquitos e esta da redução dos seus criadouros potenciais. O Aedes aegypti está muito bem adaptado às condições da vida urbana. O seu combate é possível, porém não é fácil. Depende de ações do poder público e da própria população. Políticas públicas relativas à melhoria das condições de habitação e saneamento, particularmente as de abastecimento regular de água e de coleta de lixo, são necessárias e devem ser permanentes.

Acrescente-se a essas as ações de informação, educação e comunicação da população e inspeção periódica dos domicílios e de pontos estratégicos, como cemitérios, borracharias, depósitos de ferro velho e terrenos baldios, na busca de criadouros potenciais do mosquito, seguida de sua eliminação.

Porém, cabe à população a adoção de hábitos preventivos no interior e quintais dos nossos próprios domicílios. Deve-se abolir desde pequenos criadouros, como pratos de água de vasos de flores e embalagens que podem acumular água de chuva (garrafas, recipientes de plástico, de isopor, de metal, pneus velhos) até grandes criadouros, como piscinas abandonadas, sem água tratada. As caixas d¿água devem estar sempre bem cobertas e as calhas dos telhados limpas e desentupidas. Quando as casas não tiverem telhado, forem cobertas apenas com lajes, essas precisam ser frequentemente observadas se não estão acumulando água de chuva. Os reservatórios de água que não puderem ser eliminados devem ser tratados de forma adequada, periodicamente, com substâncias larvicidas.

Quando se detecta transmissão da doença, torna-se necessário o uso de inseticidas para matar mosquitos adultos, que estão infectados ou que poderiam vir a se infectar nas pessoas doentes.

O controle do dengue tem outros objetivos também muito importantes: redução dos óbitos e da gravidade dos casos. Se é verdade que o combate ao Aedes aegypti é uma atividade intersetorial e interdisciplinar, esses outros objetivos são diretamente afetos ao setor saúde. A busca de atendimento precocemente, aos primeiros sintomas e sinais da doença, é fundamental para uma boa evolução dos pacientes. A letalidade entre os casos graves ainda está muito alta no Brasil. Para reduzi-la é preciso um aprimoramento da atenção aos casos suspeitos, com organização hierarquizada do atendimento segundo a sua gravidade.

O atendimento vai desde o ambulatorial até unidades de cuidados intensivos. É preciso ainda o uso de protocolos de atenção ao paciente em cada fase da doença. O treinamento de médicos e enfermeiros, nos diferentes níveis de atenção, é necessário e fundamental. A hidratação oportuna e adequada dos casos suspeitos é uma medida terapêutica básica para reduzir a sua gravidade.

O Distrito Federal vem apresentando, desde o final do ano passado, elevado número de casos de dengue, registrando, até o momento, segundo dados da Secretaria de Saúde, mais de 12 mil ocorrências, com sete mortes confirmadas. Esse é o maior registro já verificado entre nós. A maior incidência foi registrada em Planaltina, na Vila Planalto, no Itapoã, em São Sebastião, na Estrutural e no Paranoá.

Essa é mais uma razão para que não deixemos de fazer a nossa parte no combate ao mosquito vetor, que inclui, entre outras coisas, manter limpos nossos quintais e não descartar recipientes que podem acumular água nas ruas e praças da cidade.