Título: De olho no próprio umbigo
Autor: Cotias, Adriana
Fonte: Valor Econômico, 03/04/2007, EU & Investimentos, p. D1

Com os sinais contraditórios emitidos pela economia americana - com dados que ora mostram o arrefecimento da atividade ora acendem o alerta para o risco de inflação -, os analistas selecionaram para a Carteira Valor de abril ações de empresas com foco de atuação local. A volatilidade comandada pela cena externa não impediu, porém, que mantivessem papéis ligados ao ciclo das commodities. Os setores de siderurgia, mineração e papel e celulose seguiram, assim, bem representados. E a incerta Petrobras, um verdadeiro ioiô no sobe-e-desce das cotações do petróleo, permaneceu na liderança, com cinco indicações.

Em março, a carteira das "dez mais" rendeu 7,63%, ante 4,36% do Índice Bovespa (Ibovespa). No ano, a conta também pende para as eleitas, com valorização de 9,49%, em comparação aos 2,99% do índice. E, em 12 meses, o portfólio acumula ganhos de 38,92%, acima dos 20,69% do referencial.

Desde o início do ano, a aposta na atividade interna tem sido recorrente na Carteira Valor. E, com o contorno mais volátil que ganhou o mercado desde o fim de fevereiro - primeiro com o mau tempo vindo da China e depois com a crise das hipotecas americanas de alto risco -, teve quem considerasse por bem pinçar opções que pudessem atenuar qualquer reversão do fluxo externo.

"A cada dia, os dados da economia americana sugerem uma direção, então a melhor estratégia é buscar oportunidades em casos que dependam mais do mercado doméstico", argumenta o chefe de análise da Link Corretora, Adriano Blanaru. Nas indicações para abril, ele acrescentou Itaúsa, de forma a aproveitar os bons fundamentos do Banco Itaú numa opção mais barata. "É uma instituição bem administrada, que tem espaço para ampliar o crédito e ainda se favorecer dos 'spreads' (a diferença entre o custo de captação e o repasse nos empréstimos) em níveis elevados."

Nas recomendações da Link, a área de infra-estrutura vem representada por América Latina Logística (ALL), que pode se beneficiar do crescimento da participação do meio ferroviário nos transportes, e por Companhia de Concessões Rodoviárias (CCR). "Se continuar tudo como está, é uma empresa que tem valor e que pode ganhar concessões em rodovias estaduais e federais, do Metrô e fora do país."

Essa também foi a lógica da inclusão de CCR ON (ordinária, com direito a voto) pela Itaú Corretora, que vê na estratégia da internacionalização em mercados como o México um possível gatilho para as ações no curto prazo. E, com a esperada recuperação do agronegócio, as units (recibos representativos de ações) da ALL foram mantidas na seleção. "As receitas e os resultados devem crescer junto com o aumento da safra e do volume de grãos transportados", afirma o estrategista de renda variável para pessoa física, Fábio de Araújo. O viés interno é completado por Natura ON, enquanto CSN e Petrobras são os papéis mais expostos às oscilações das commodities.

CSN ON entrou para a lista da Concórdia não só pelas boas perspectivas para o setor siderúrgico, mas pelo fato de deter ativos que podem ganhar valor. O chefe de análise da corretora, Eduardo Kondo, cita a MRS Logística, que proporcionou resultados fabulosos no ano passado, e a mina Casa de Pedra que pode fazer uma abertura de capital neste ano, como exemplos. A fabricante de massas e biscoitos M.Dias Branco, dona da Adria, que abriu o capital em outubro, também entrou para a lista de eleitas. "A empresa tem forte presença no Nordeste, uma região que tem sido destaque em indicadores de recuperação de renda, é bem administrada e em alguns segmentos tem mais mercado do que a Nestlé."

O rol das debutantes da bolsa ganhou ainda o reforço da Positivo Informática, que consta na seleção da corretora do Banco Real. "O setor ganhou roupagem nova com os incentivos do governo e a queda do dólar reduz os custos da importação de componentes", diz o analista Pedro Galdi. "A empresa ganhou competitividade em relação ao mercado cinza (paralelo) e ainda conta com a distribuição de redes de varejo populares, como a Casas Bahia."