Título: Chinaglia vence por diferença de 18 votos
Autor: Costa, Raymundo e Jayme, Thiago Vitale
Fonte: Valor Econômico, 02/02/2007, Política, p. A5

O líder do governo e deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) foi eleito ontem presidente da Câmara. Com 261 votos contra 243 de Aldo Rebelo (PCdoB-SP) - que concorria à reeleição - e seis votos em branco, o petista ocupará o cargo pelos próximos dois anos. Como era esperado, a eleição foi decidida em segundo turno.

O desempenho de Aldo ficou muito aquém do que avaliavam seus aliados: o atual presidente da Câmara teve apenas 175 votos na primeira rodada de votação, quando esperava pelo menos 190. Chinaglia teve 236. No segundo turno, os dois disputaram os 98 votos dados ao candidato da " Terceira Via " , Gustavo Fruet (PSDB-PR).

Para vencer, Chinaglia conquistou 25 dos 98 votos dados a Fruet. A maior parte deles, segundo avaliações do grupo de Aldo, vieram do PSDB, especialmente de Minas Gerais e São Paulo, apesar da crítica pública feita por Fernando Henrique Cardoso quando o líder Jutahy Magalhães Junior (BA) anunciou que os tucanos apoiariam Chinaglia.

Foi uma eleição tensa. Pela manhã, Aldo telefonou para o ministro Tarso Genro (Relações Institucionais) para reclamar da presença no plenário do subchefe de Assuntos Parlamentares do Palácio do Planalto, Marcos Lima, encarregado da negociação das emendas ao Orçamento.

Desde cedo, Aldo e seus aliados denunciavam a existência de um rolo compressor do governo com a liberação de emendas para aliciar parlamentares em torno do nome de Chinaglia. Tarso telefonou para o assessor e pediu-lhe para voltar ao Planalto. Lima explicou que comparecera apenas para a posse dos deputados e não ficaria para a sessão de votação, a ser realizada à tarde. Um rastreamento feito pelo PSB no sistema de acompanhamento da execução do Orçamento não registrou grandes alterações na liberação de emendas, como temiam.

A eleição de Chinaglia fortalece o grupo ligado ao ex-ministro José Dirceu (PT), cassado por denúncias de participação no esquema do mensalão. Chinaglia teria se comprometido a votar um projeto de anistia do ex-deputado a ser apresentado ao Congresso. Sai fortalecida também a ex-prefeita Marta Suplicy. O deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), um de seus principais aliados, comandou a campanha do novo presidente da Câmara.

Mas a decisão em segundo turno agradou ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O presidente, segundo interlocutores, temia que uma vitória de Chinaglia em primeiro turno aumentasse o apetite do PT por cargos no governo. O petista, na realidade, também teve uma votação bem abaixo do esperado por seus seguidores. Durante a eleição, estavam convencidos da vitória em primeiro turno. Variavam, apenas, os cálculos. Os mais otimistas apostavam em 276 votos. Os conservadores previam 263.

Durante o dia de ontem Chinaglia aumentou seu otimismo com uma declaração dada pela manhã por Lula. O presidente defendeu o princípio da proporcionalidade nas eleições no Congresso. " O maior partido no Congresso Nacional, no Senado tem que ter o presidente, e na Câmara tem que ter o presidente " , disse Lula. " Essa é uma prática histórica que não foi quebrada, nem no regime militar. " Na realidade, o princípio não foi observado nas últimas eleições. Severino Cavalcanti (PP) e o próprio Aldo chegaram ao cargo sem integrar partidos majoritários.

A declaração de Lula foi interpretada como se o presidente tivesse mandado ao Congresso um sinal de apoio a Chinaglia. Aldo ironizou. " Acho que ele declarou apoio a mim, que sou o único candidato oficial. O outro (Chinaglia) é avulso " . O ex-ministro e deputado federal Ciro Gomes (PSB-CE) dizia nos corredores que o entendimento era exagerado.

A maior preocupação de Lula e aliados, como Ciro, era com o "day after" da disputa com a evidente divisão dentro da coalizão governista. " É evidente que essa disputa deixa alguma seqüela " , afirmou o líder do PT na Câmara, Henrique Fontana. " O presidente precisa ter pulso e controle para chamar os partidos para conversar depois de hoje (ontem). A crise do governo está, novamente, afetando a Câmara dos Deputados " , disse Fruet, único candidato não-governista.

O fato é que sem o apoio do governo - diversos ministros petistas fizeram campanha aberta por Chinaglia, especialmente Tarso Genro - e o poder de negociar ministérios ou cargos no Executivo, o desempenho de Aldo pode ser considerado satisfatório. Teve apenas 18 votos a menos do que o candidato da poderosa aliança entre os dois maiores partidos da Casa: PT e PMDB. Foram pemedebistas, provavelmente, as defecções que o comunista teve no primeiro turno. O resultado da disputa - 261 votos a 243 - indica que o governo terá de negociar muito para aprovar projetos de seu interesse no Congresso.

O ressentimento de Aldo Rebelo com o distanciamento adotado pelo presidente Lula ficou evidente no discurso pronunciado por ele durante o pleito. Lembrou que participou das oito campanhas de Lula à Presidência da República.

E iniciou o discurso falando de fidelidade. " Temos de ser fiéis à família, aos amigos, ao pensamento, às idéia e na política. Na minha trajetória, me mantive fiel " , disse. E lembrou do trabalho que teve no auge da crise: " Fui eleito presidente no momento de crise. Enfrentei todos os problemas. Nunca fugi da minha responsabilidade como presidente " .

Aldo pensava até em não concorrer a cargo eletivo nas eleições de outubro do ano passado. Foi demovido da idéia por Lula. O presidente afirmou que precisaria dele no Congresso em um segundo mandato. Lula até manifestou sua preferência por Aldo, mas nos últimos dias fechou-se. No vôo de volta do Nordeste para Brasília, foi por duas vezes sondado pelo governador de Pernambuco Eduardo Campos (PSB) sobre a disputa na Câmara. " Aldo vai ganhar " , disse Campos, tentando puxar conversa com o presidente. " É mesmo? " , desconversava Lula, sem enfrentar o tema.

Chinaglia fez um discurso aos pares, tentando mostrar-se distante do governo e garantir votos da oposição. Líder do governo na Câmara, durante a campanha, o deputado tentou tirar o carimbo do Palácio do Planalto. " Quem é que disse que o governo manda aqui? Minha candidatura saiu do parlamento e para o parlamento que vou trabalhar " , bradou. " O parlamento é maior do que qualquer um de nós ou de nossos partidos. Não posso conceber que a Câmara fica acuada por quem quer que seja que não sejam os interesses do povo brasileiro " , disso o líder, em tom quase de oposição.

Depois de conhecido o resultado na Câmara, a Presidência da República divulgou nota com declarações de Lula, cumprimentando os eleitos no Congresso.

Candidato único à primeira vice-presidência, Nárcio Rodrigues (PSDB-MG), previa enfraquecimento da candidatura de Aldo por causa do bloco montado pelo presidente da Câmara com PSB, PDT, PCdoB, PAN e PMN, sem o PFL, maior partido de apoio a ele. A formalização desse grupo enfraqueceu os pefelistas, que tinham a opção de ter a segunda vice-presidência e ficaram apenas com a segunda secretaria. " Aldo cometeu um erro quando ignorou o maior partido que o apoiava. Acho que uns votos do PFL migrarão para Gustavo Fruet " , previa. Com apoio do PT, Nárcio foi eleito com votação expressiva.