Título: Governadores propõem mudar Estatuto da Criança
Autor: Costa, Raymundo e Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 28/02/2007, Política, p. A8

Mudanças no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e no Código de Processo Penal são as principais propostas que os governadores da região Sudeste encaminham hoje ao Congresso, como sugestões para o combate à violência. Entre essas propostas está o aumento do prazo de três para até 10 anos de internação de menores, nos casos de infrações graves, em vez da diminuição da maioridade penal para os 16 anos, o que exigiria uma mudança da Constituição.

A polêmica gerada pela proposta de redução da maioridade penal pode levar o Senado a criar uma comissão para, em 60 dias, elaborar novo pacote de medidas de combate à violência, com propostas legislativas e recomendações de procedimentos de responsabilidade dos poderes Executivo e Judiciário. Essa idéia será discutida hoje na reunião da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Na prática, a criação da comissão, apoiada pelos líderes da situação e da oposição em reunião realizada ontem, enfraquece a proposta da redução da maioridade penal, cujos defensores pretendiam se aproveitar do clima de comoção provocado pela morte de um menor no Rio para aprovar rapidamente o projeto.

A proposta mais polêmica a ser encaminhada pelos governadores, que trata da estadualização da legislação penal, deve ser descartada pelo Senado. Como Renan Calheiros, presidente do Senado, não quer descartar liminarmente uma proposta do governador Sérgio Cabral (RJ), que é seu aliado político na disputa interna do PMDB, a proposta deve ser encaminhada para a Comissão de Constituição e Justiça. É certo, no entanto, que a CCJ deve declarar a inconstitucionalidade do projeto - a competência para legislar é exclusiva da União. Renan inclusive acredita que se trata de uma "cláusula pétrea" da Constituição de 1988.

Além de Cabral, os outros três governadores do Sudeste devem se reunir com Renan, esta tarde: José Serra (SP), Aécio Neves (MG) e Paulo Hartung (ES). Ontem, o Secretário de Defesa Social de Minas, Maurício Campos Júnior, resumiu algumas propostas, após audiência com o governador Aécio Neves. "São várias, algumas conhecidas e já discutidas ao longo dessa semana", disse. "Minas não tem posição fechada, apenas participa ciente da importância do debate, mas seguramente, temas como o processo penal, a modernização do Código de Processo Penal, são muito relevantes, tanto ou mais do que discussão de matérias de direito penal, num instante como este".

Para o secretário, "a discussão que envolve a possibilidade de elasticidade da internação, períodos de prorrogação de internações para atos infracionais mais graves, talvez seja uma medida melhor do que a redução da maioridade penal, que também agrava o problema em outras frentes, como o sistema prisional", afirmou. Essa também é a posição defendida por Serra.

A criação de uma comissão no Senado foi apoiada pelos líderes partidários governistas e da oposição. Apenas o senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA), presidente da CCJ, foi contrário à idéia. Ele pretendia colocar hoje em votação a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) diminuindo de 18 para 16 anos a idade penal.

Segundo o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), o pacote a ser proposto pelo Senado deve conter desde medidas de longo prazo, como políticas educacionais e políticas sociais públicas, até o policiamento ostensivo e fechamento de fronteira para tráfico e armas e drogas. "Com as recomendações do Congresso, o Executivo vai ser instado a cumprir sua responsabilidade", disse o líder do PFL, José Agripino (RN).

Na reunião de líderes do Senado, ficou patente a insatisfação com o fato de a Câmara não dar continuidade a propostas do Senado. Em 2006, depois da onda de violência deflagrada em São Paulo pelo crime organizado, o Senado aprovou um pacote emergencial com 11 propostas, a maioria delas ainda não votada na Câmara.

Ontem, a CCJ da Câmara adiou a votação de um desses projetos propostos pelo Senado. Tratava-se de uma proposta que tornava mais rígido o regime disciplinar para punir o preso envolvido com organização criminosa. Houve pedido de vista coletivo para os deputados analisarem a proposta.

Também no plenário da Câmara foi adiada a votação de outro projeto de lei sobre segurança pública. Por falta de acordo, os líderes e o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), adiaram a apreciação do projeto que acaba com a chamada "prescrição retroativa", mecanismo previsto no Código Penal, pelo qual o tempo da pena de um criminoso começa a contar a partir do recebimento da denúncia, ou seja, antes mesmo do julgamento. O assunto será discutido amanhã.