Título: Crescimento muda até aplicações do país no exterior
Autor: Ribeiro, Alex
Fonte: Valor Econômico, 28/02/2007, Especial, p. A16

O forte crescimento das reservas muda a forma como o Banco Central aplica os seus recursos no exterior. Uma coisa é administrar US$ 37,823 bilhões, como os que o Brasil tinha em dezembro de 2002, com grande parte dos vencimentos no curto prazo. Coisa bem diferente é administrar US$ 100 bilhões, com uma dívida externa menor e mais longa.

Dados os volumes transacionados, o Brasil já um investidor com peso suficiente para mexer com os preços de ativos. Uma evidência da importância assumida pelo país é que, em agosto de 2006, quando o BC fez um dos seus balanceamentos de carteira, o Brasil figurou como o segundo maior comprador de títulos do Tesouro americano.

Até meados da década de 1990, o Brasil tinha peso importante apenas no mercado de ouro. Na época, o país decidiu desmobilizar suas aplicações. Mexeu com o mercado, jogando o preço para baixo. Hoje, as aplicações em ouro são relativamente pequenas. Somavam US$ 703 milhões em janeiro, ou menos de 1% das reservas.

O BC, seguindo a prática de outros países, não divulga muitas informações sobre as reservas. Estão disponíveis apenas os grandes números, estratificando as aplicações por tipo de investimento (títulos, depósitos, ouro etc). De maneira eventual, nos balanços do BC e em algumas apresentações, também abre pequenas informações que, de forma indireta, dão uma idéia das moedas e dos prazos em que são feitas as aplicações. A partir desses dados é possível perceber que, desde 2002, caíram as aplicações em euro. A explicação é que a dívida externa federal em euro também diminuiu. Um dos princípios na administração das reservas é justamente acompanhar a dívida federal em moeda estrangeira.

A dívida em euros era relativamente grande por causa do empréstimo do FMI, que somava US$ 20,8 bilhões em dezembro de 2002. Ele era referenciado em Direitos Especiais de Saque (DES), uma cesta de quatro moedas: dólar (44%), euro (34%), iene (11%) e libra (11%). Depois que o Brasil pagou o FMI, em 2005, as aplicações em euro foram reduzidas. Agora, as reservas mantêm aplicações em euro só para fazer face à dívida em bônus nessa moeda, que em dezembro somava US$ 7,419 bilhões.

Outro movimento que tende a se aprofundar são as aplicações com prazos mais longos. Pelo dado mais recente, de agosto de 2006, 4% da carteira estavam no curtíssimo prazo, para resgate imediato. Outros 16% estavam no curto prazo - vencimento em até um ano-, seguindo o perfil da dívida externa. Os 80% restantes eram aplicados em prazos superiores a um ano.

Esses números são influenciados tanto pela estratégia de aplicação das reservas adotada pelo BC quanto por fatores conjunturais. Quando há maior liquidez no mercado de câmbio, por exemplo, o BC compra mais dólares, aumentando os depósitos em bancos no exterior - o que faz aumentar a carteira de curto prazo. É por isso que em janeiro, quando o BC intensificou as suas intervenções no mercado de câmbio, os depósitos em bancos sediados no exterior aumentaram US$ 2,032 bilhões, para US$ 15,452 bilhões. Os depósitos devem voltar a cair gradualmente, conforme o BC aplicar os recursos em prazos mais longos.

Além desses fatores conjunturais, há outros mais permanentes que deverão levar o BC a rearrumar a sua estratégia. As reservas internacionais, bem antes de chegar aos US$ 100 bilhões, já eram superiores à dívida externa do Tesouro, que em dezembro de 2006 chegou a US$ 67,097 bilhões. Além disso, o Tesouro vem alongando sua dívida, recomprando os vencimentos mais curtos. Assim, daqui por diante, o BC poderá se espelhar um pouco menos no passivo externo.

Nesse momento, todo o "benchmark" das reservas está sendo revisto. Em tese, em virtude de toda expertise e do sistema de controle adotado nos últimos anos, há espaço para ampliar as classes de ativos, sem abandonar a orientação de manter a alta liquidez e segurança. (AR)