Título: Nova farra de benefícios na Câmara dos Deputados
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 13/01/2005, Opinião, p. A8

T ão rotineira quanto as festas de fim de ano, uma safra de más notícias para empresas e pessoas físicas, que sustentam o governo com os impostos que pagam, acompanhou a virada do calendário. Sorrateiramente, os deputados garantiram mais verbas para si, os governos do Rio e do Rio Grande do Sul restringiram benefícios, estabelecidos em lei, para os exportadores e até os ministros do Superior Tribunal de Justiça tomaram decisões administrativas que ampliam os vencimentos de seus servidores. O governo federal não ficou de fora, e em MP editada no último dia do ano, ampliou o Imposto de Renda das empresas de serviços que optaram pelo regime do lucro presumido. O Superior Tribunal de Justiça determinou a si próprio o que o Tribunal Superior do Trabalho havia tentado em 2003 e não conseguira, graças ao veto do Tribunal de Contas da União (TCU) - a incorporação aos salários dos servidores dos valores correspondentes ao exercício de funções comissionadas no período de 1998-2001. Segundo a "Folha de S.Paulo", apenas no STJ a conta a ser paga pelos cofres públicos com a decisão, providenciada em tempo recorde, chega a R$ 12 milhões anuais. Ela seguramente é bem maior, pois não inclui os tribunais regionais federais, que precisam discriminar e definir os beneficiários. Como dinheiro é bom e todo mundo gosta, apenas um dia depois que o presidente do STJ, Edson Vidigal, recomendou que a incorporação fosse válida para toda a Justiça Federal, foi a vez de a Procuradoria Geral da República entrar em ação para obter a mesma regalia. Claudio Fonteles, procurador-geral da República, deferiu rapidamente o pedido de que as vantagens fossem extensivas a todo o Ministério Público Federal. Não se sabe se mais alguém tem direito a essas benesses, mas há vários sindicatos de servidores públicos de olho no assunto. Já se tornou uma praxe que vantagens específicas acabem se tornando gerais e irrestritas de uma hora para outra. Há dois aspectos graves na questão. O primeiro, e imediato, é o peso da conta cobrada dos contribuintes. A segunda é o fato de o STJ, a quem cabe a palavra final na interpretação das leis e missão de fazer com que elas se cumpram, tomar uma decisão que contraria outro Tribunal, em benefício próprio. Os membros do STJ já fazem parte da elite melhor remunerada do funcionalismo público. Representantes do povo, os deputados, por intermédio de suas lideranças, resolveram melhorar suas condições de trabalho em 2005, ainda que trabalhem menos que a imensa maioria da nação e recebam 15 salários por ano. Como já disse certa vez o presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), quanto melhores essas condições, "melhor a qualidade do Parlamento". Na véspera do réveillon, a mesa diretora da Câmara aumentou de R$ 12 mil para R$ 15 mil a verba de complementação de gastos dos parlamentares, que tem por finalidade ressarci-los de despesas com combustível, restaurante, hospedagem, aluguel, quando não estão em Brasília. De acordo com "O Globo", a medida custará R$ 18,5 milhões por ano. Os gastos não param por aí. Quando chegarem do recesso, os parlamentares encontrarão pronto para ser votado um projeto de resolução que aumenta de R$ 35,3 mil para R$ 45 mil a verba para pagamento de funcionários dos deputados e o aumento do número dos servidores a que têm direito de 20 para 25. A conta para os contribuintes é um pouco mais salgada dessa vez - R$ 64,4 milhões. O verdadeiro ato de justiça para com eles, porém, ainda está por vir. Candidato em dificuldades para ser aprovado à direção da Câmara, o deputado petista Luiz Eduardo Greenhalg acha natural que seus pares recebam o teto do funcionalismo, que é o dos ministros do Supremo. A remuneração dos membros da Câmara subiria então de R$ 12,7 mil para R$ 21,5 mil. Na gestão petista de João Paulo, iniciada em 2003, a verba dos gabinetes já havia recebido um módico reajuste de 40%, de R$ 25 mil para R$ 35,3 mil. A remuneração e as mordomias, se aprovada a nova farra, fará de um deputado um quase-milionário - cada um custará à nação, por baixo, R$ 910 mil por ano., em uma conta que não inclui auxílio-moradia e 48 passagens aéreas anuais per capita. São benefícios que indignariam os parlamentares do antigo PT, que agora são considerados naturais pelo novo PT no poder - que os patrocina. Se não rejeitarem as propostas em plenário, e propuserem alternativa que contemple apenas o reajuste pela inflação corrente, os deputados jogarão ainda mais para baixo o escasso prestígio que ainda têm junto à população que os elegeu.