Título: Deputado reapresenta projeto negociado com o governo
Autor: Izaguirre, Mônica
Fonte: Valor Econômico, 27/02/2007, Brasil, p. A8

Diante da impossibilidade regimental de desarquivamento do projeto sobre parcelamento do solo, logo que assumiu, o deputado Fernando Chucre (PSDB-SP) apresentou texto idêntico ao costurado pelo ex-deputado Barbosa Neto (PSB-GO ), último a relatar o assunto na legislatura passada. Idéia semelhante teve o deputado Zezéu Ribeiro (PT-BA), presidente da Comissão de Desenvolvimento Urbano, que apresentou projeto baseado no mesmo relatório. Mas como foi apresentado primeiro, o de Chucre ganhou prioridade e o de Zezéu tramita acoplado a ele.

Fruto de anos de debate entre governo e setores envolvidos, o texto deixado por Barbosa tende a estimular, se aprovado, os investimentos do setor privado na construção de loteamentos para a população de baixa renda, que praticamente desapareceram nos últimos anos. "Se não trouxermos o investidor privado de volta, o país continuará sem oferta de lotes regulares para esse segmento", diz Chucre. Na opinião do parlamentar, a inexistência dessa oferta é, hoje, um dos fatores de surgimento de favelas e outras ocupações irregulares, principalmente nas grandes cidades.

O projeto reapresentado por Chucre, um arquiteto urbanista, tenta resgatar a segurança jurídica criando regras específicas para a relação de consumo entre adquirentes e produtores de lotes urbanizados. O Código de Defesa do Consumidor não é específico nesse ponto, o que, para Marcos Augusto Netto, presidente do Sindicato da Habitação do Mato do Grosso do Sul (Secovi/MS), abriu espaço para que a lei fosse transformada em "instrumento de filantropia", ao custo da inviabilização de diversos empreendimentos.

A principal queixa dos empresários refere-se ao tratamento dado por órgãos de defesa do consumidor e autoridades judiciais aos casos de desistência. Conforme o presidente do Secovi/MS, são muitos os casos de compradores arrependidos que, mesmo depois de meses ou anos, conseguiram a devolução quase integral do valor pago à empresa loteadora, com correção monetária. O percentual que as empresas são obrigadas a devolver chega a 90%, fora a correção. Isso representa prejuízo porque os 10% retidos dificilmente repõem custos irreversíveis da empresa com aquela venda, a exemplo da taxa de corretagem e dos impostos. Além disso, só o fato de o empreendedor ficar com um bem indisponível já representa perda, diz Augusto Netto.

As loteadoras amargam prejuízo principalmente quando a desistência ocorre depois que o comprador já construiu no terreno. Além de devolver quase todo o valor que receberam corrigido, as empresas devem indenizar o comprador pelas benfeitorias, até mesmo quando a construção é irregular e, portanto, não pode ser legalmente comercializada . O projeto de Chucre mantém a obrigatoriedade de indenização de benfeitorias, mas desde que regularizadas ou passíveis de regularização junto aos orgãos públicos competentes. Se não houver acordo quanto à indenização, o valor será o que for apurado em leilão do imóvel.

Outra cláusula padrão criada pelo projeto assegura que as empresas não serão obrigadas a devolver valores irrecuperáveis, como taxa de corretagem e tributos não passíveis de estorno, que passarão a ser descontados na hora de calcular o montante do ressarcimento. Mas, para poder fazer o desconto, o empreendedor terá que apresentar uma conta detalhada sobre os abatimentos. O adquirente arrependido também terá que pagar pelo tempo que ficou com o lote.

O texto também busca proteger o consumidor, mantendo a obrigatoriedade de correção monetária, pelo índice do contrato, em caso de devolução. Estabelece ainda que desistências num prazo de até 30 dias implicarão obrigatoriedade de ressarcimento de tudo que tiver sido pago pelo adquirente do lote, sem qualquer desconto.

Independente desse prazo, ocorrendo desistência, o empreendedor só poderá efetuar registro de nova venda do mesmo lote depois que comprovar o início da devolução dos valores nas condições pactuadas entre as partes envolvidas. O prazo da restituição, que poderá ser parcelada, vai depender do montante já pago pelo adquirente. Se houver controvérsia sobre o valor do ressarcimento, o empreendedor será obrigado a iniciar de imediato a restituição da parte incontroversa.

Embora entenda que esteja correto em todos esses aspectos, Fernando Chucre sabe que o texto ainda deverá passar por ajustes. Segundo ele, há demandas nesse sentido por parte do sistema de defesa do consumidor. (MI)