Título: Chávez melhora fisco e piora déficit
Autor: Souza, Marcos de Moura e
Fonte: Valor Econômico, 27/02/2007, Internacional, p. A11

Com uma política elogiada até por alguns de seus críticos, o governo da Venezuela vem agindo com mão-de-ferro contra sonegadores de impostos no país. Ampliou a fiscalização e redobrou a aplicação de multas e sanções. A política deu resultado rapidamente: a arrecadação aumentou quatro vezes em apenas três anos. Mas, apesar do êxito arrecadatório, o país registrou em 2006 o segundo maior déficit fiscal em quase 30 anos devido à disparada dos gastos públicos.

Desde que lançou seu chamado Plano de Evasão Zero, em meados de 2003, o governo do presidente Hugo Chávez tem pressionado as empresas estabelecidas na Venezuela a manter as contas em dia. Só nos últimos dois meses, a Seniat, autoridade fiscal do país, ordenou o fechamento por até três dias de 3.825 empresas como punição por algum tipo de irregularidade em relação ao fisco. O total de multas aplicadas no período chegou ao equivalente a US$ 2,1 milhões.

"Em governos anteriores, a autoridade fiscal neste país não tinha autoridade. Não havia controle sobre as operações e o que se tinha era muita liberdade na questão de impostos", disse ao Valor o presidente da Câmara do Comércio Venezuela-Brasil, o empresário do setor de alimentos Nelson Quijada. "A lei simplesmente não era cumprida. Agora as empresas estão mais atentas e cuidando mais de sua contabilidade", acrescenta ele, dizendo que a política fiscal de Chávez é uma das medidas vistas "com mais bons olhos" por diversos setores no país.

Quando Chávez assumiu em 1999, a Venezuela arrecadava 6,5 trilhões de bolívares (US$ 3,02 bilhões) em impostos. Em 2003, ano do lançamento do Evasão Zero, o total já subira para US$ 6,47 bilhões. Daí em diante, o ritmo da arrecadação disparou, chegando a US$ 24,28 bilhões no ano passado.

Segundo o superintendente do órgão, José Vielma Mora, os planos do governo para 2007 são aumentar a arrecadação em 14%. No fim de semana, mais de 7 mil funcionários da Seniat, auxiliados pela guarda nacional, tomaram parte de uma operação que fecharam 138 empresas - entre elas a filial do Hard Rock Café em Caracas.

A Seniat é considerada a instância mais eficiente do governo Chávez. Entre 2005 e 2006, a arrecadação aumentou 31%, graças às políticas de maior rigor contra a evasão e ao incremento no volume de divisas obtidas com as vendas do petróleo, que tem ajudado Chávez a ampliar os gastos públicos.

O problema - para as contas públicas do país - é que o esforço arrecadatório da Seniat não tem conseguido acompanhar o ritmo dos gastos públicos.

De acordo com o uma análise intitulada Perspectiva Econômica Venezuelana, apresentada este mês pelo economista venezuelano Miguel Ángel Santos, o déficit fiscal de 2006 (quase 5% em relação ao Produto Interno Bruto) foi o segundo maior registrado no país desde 1968, perdendo apenas para o pico de cerca de 7% negativos em 1994. Desde 1998, ano em que Chávez foi eleito, o país registrou superávit apenas em 2005, apesar da bonança do petróleo. O período de Chávez também é marcado por uma elevação consistente dos gastos públicos, como aponta o estudo. Em 1999, os gastos representavam 19% do PIB; em 2006, 34,7%.

Em um dos cenários que apresenta, Santos adverte: "Se o fluxo de divisas se mantiver e não se diminui o gasto público, a inflação [que hoje já é a maior da América Latina] poderá atingir em algum momento entre 28% e 32%".