Título: Lula classifica ataques no Rio de ação terrorista
Autor: Lyra, Paulo de Tarso e Romero, Cristiano
Fonte: Valor Econômico, 02/01/2007, Caderno Especial Posse, p. A3

Ao discursar no Parlatório do Palácio do Planalto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que a onda de violência ocorrida no Rio de Janeiro nos últimos dias não pode ser tratada como "crime comum", mas como uma ação terrorista que extrapolou o "banditismo convencional". "Isso é terrorismo e tem que ser combatido com uma política forte e com uma mão forte do estado brasileiro", afirmou. Presente à posse de Lula, o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral Filho, disse que formalizará, amanhã, pedido oficial para envio da Força Nacional de Segurança Pública a seu Estado, mantendo-o em ação até o início dos jogos pan-americanos, em julho.

"Quando um grupo de chefes, de dentro da cadeia, consegue dar ordens para fazer uma barbaridade daquelas, matando inocentes, quero dizer ao meu governo e aos governos estaduais: precisamos discutir profundamente porque o que aconteceu no Rio de Janeiro foi uma prática terrorista das mais violentas que tenho visto neste País e, como tal, tem que ser combatida", discursou Lula, no único momento da posse em que falou para as pessoas que foram prestigiar a sua posse - a estimativa da Polícia Militar de Brasília é que aproximadamente dez mil pessoas foram à posse.

Ainda no Parlatório, Lula adotou um tom de ressentimento ao lembrar o apoio popular que recebeu nos momentos mais delicados de seu primeiro mandato como presidente. "Quando alguns imaginavam que o jogo tinha acabado, o povo entrava em campo e dizia claramente: nós construímos a democracia deste país e vamos sustentar a democracia, custe o que custar, doa a quem doer", afirmou. Disse que é presidente de todos, mas ressalvou: "Não se enganem: cuidarei primeiro daqueles mais necessitados, daqueles mais fragilizados, daqueles que mais precisam do estado Brasileiro".

Ao lado do vice José Alencar e da primeira-dama Marisa Letícia e da mulher de Alencar, Mariza Silva, Lula, numa referência velada aos companheiros que se envolveram em casos de corrupção nos últimos quatro anos, disse que já foi "enganado" muitas vezes na política.

Ele enalteceu a ligação direta que possui com as massas. "Muitas vezes, a gente vê as pessoas próximas da gente desaparecerem. Agora, nessa minha relação com o povo brasileiro, desde quando comecei no movimento sindical, em 1969, em nenhum momento difícil da minha história esse povo faltou com a solidariedade, com o companheirismo, assumindo, às vezes, a tarefa de fazer aquilo que nós não tínhamos condições de fazer", afirmou o presidente.

Lula procurou passar a idéia de que ele é um líder que, ao contrário dos outros, trata os pobres com mais decência. "Se for necessário, daremos a nossa vida (eu e José Alencar) para que a gente possa cumprir cada palavra e cada compromisso que assumimos com vocês, para que a gente possa fortalecer a democracia do nosso país, garantir que a parte mais pobre da população seja tratada com o respeito e com a decência que deveria

ter sido tratada há muito tempo, porque se assim o fosse nós

não teríamos a quantidade de pobres que temos no Brasil", comparou.

Reconheceu que ainda há uma grande distância a ser percorrida para que o Brasil possa tornar-se "um país mais justo, mais equânime e para que todas as pessoas possam conquistar a cidadania plena", com direito a benefícios como estudo, cultura, lazer e a certeza de que "os filhos vão estudar numa escola de qualidade e que os filhos das pessoas mais pobres deste país poderão sonhar e ter acesso à mesma universidade dos filhos mais ricos deste país".

Para alcançar o país que almeja, Lula apóia-se no pacote de destravamento econômico que vem discutindo desde que foi re-eleito. Prometeu que, depois de três mudanças de datas, o anúncio das medidas será feito esse mês. E desafiou, mais uma vez, seus opositores. "Aqueles que apostarem no fracasso do Brasil serão derrotados. Aqueles que acreditarem que esse país nasceu para ser um país de crescimento inibido, para ser um país de eterno crescimento pequeno, podem começar a se preparar. Esse país vai ter um crescimento vigoroso", declarou.

Crescimento vigoroso mas, acima de tudo, distribuição de renda e inclusão social. Lula foi claro ao dizer que, ao lado da evolução econômica, é preciso haver melhora na qualidade de vida da população. "Quero olhar na cara de cada homem e cada mulher e dizer que eu e o companheiro Zé Alencar que, se for necessário, daremos a nossa própria vida para que a gente possa cumprir cada palavra e cada compromisso que assumimos com vocês", frisou, sob aplausos da população. E encerrou em tom de brincadeira: "muito obrigado e feliz ano novo. Amanhã é dia de dizermos em alto e bom som: deixa o homem trabalhar, senão o país não cresce como precisa crescer", pediu o presidente, que, na próxima sexta-feira, vai tirar dez dias de férias antes de anunciar o pacote econômico e as medidas para destravar a economia.

Depois dos cumprimentos dos convidados, Lula desceu a rampa e foi abraçar populares presentes na Praça dos Três Poderes, mas que este ano vieram à posse em número bem menor do que em 2003.

Do lado de dentro do Planalto, ministros confirmados e outras incógnitas dividiam espaço com alguns governadores eleitos, prefeitos e convidados. Dentre os integrantes do primeiro escalão, estavam Luiz Marinho (Trabalho), Henrique Meirelles (Banco Central), Walfrido Mares Guia (Turismo), Silas Rondeau (Minas e Energia), Paulo Sérgio Passos (Transportes), Pedro Brito (Integração Nacional), Celso Amorim (Relações Exteriores), Paulo Bernardo (Planejamento), Guido Mantega (Fazenda), Waldir Pires (Defesa), entre outros.

No time dos governadores aliados, Sérgio Cabral Filho (PMDB-RJ), Cid Gomes (PSB-CE), Roberto Requião (PMDB-PR), Wellington Dias (PT-PI), Binho Marques (PT-AC), Jaques Wag-ner (PT-BA), Marcelo Miranda (PMDB-TO) e José Roberto Arruda (PFL-DF). Wagner não consi-derou um "fracasso" a festa de posse, apesar da baixa participa-ção popular. "Em 2003, era o rompimento de um ciclo. Agora, é uma reafirmação de mandato, não traz mais novidades. O grande simbolismo foi dado nas urnas, o número de votos fala mais alto", afirmou o governador da Bahia.