Título: Pacote para acelerar economia só sai após o dia 15
Autor: Safatle, Claudia e Romero, Cristiano
Fonte: Valor Econômico, 02/01/2007, Caderno Especial Posse, p. A5

Somente após o dia 15, quando retorna das férias, é que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciará o programa econômico do seu segundo mandato - o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), inspirado no Plano de Metas de Juscelino Kubitschek - e a constituição da nova equipe de ministros, segundo informou ontem o ministro da Secretaria Geral da Presidência da República, Luis Dulce.

Na área econômica, o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, deve ser o próximo a pedir demissão, seguindo o mesmo caminho de Carlos Kawall, até semana passada titular da Secretaria do Tesouro Nacional. Ontem, durante discurso de posse no Congresso, o presidente Lula disse que divulgará o PAC ainda este mês, reforçou o foco social e distributivista de seu governo, e deixou uma crítica velada à política de juros.

"Tenho claro que nenhum país consegue firmar uma política sólida de crescimento se o custo do capital, ou seja, os juros, for mais alto do que a taxa média de retorno dos negócios", disse Lula. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, em entrevista um pouco depois, lembrou que, em alguns setores da economia, o retorno já é maior que os juros de curto prazo.

"Na energia elétrica, por exemplo, a taxa de retorno é de cerca de 16% ao ano enquanto que a Selic é de 13,25% ao ano", mencionou Mantega. O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, também comentou a fala do presidente: "A política econômica não vai mudar. Estamos perto de chegar a um juros mais baixo. Temos condições de ir para um juro real de 6%, 7% ao ano. Não existe mais desconfiança (dos investidores), não existe mais vulnerabilidade", disse o ministro, mencionando indicadores das contas externas, além da inflação.

Embora Lula tenha garantido que não abrirá mão, "de forma alguma", da responsabilidade fiscal, há uma questão que ainda não está clara. O PAC deverá incorporar uma série de Projetos-Piloto de Investimento (PPIs), dirigidos à infra-estrutura, podendo chegar até 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) a partir deste ano. A intenção do governo é abater os gastos com os PPIs do superávit primário das contas públicas, cuja meta é 4,25% do PIB.

A intensidade do programa fiscal a partir de agora, portanto, é uma questão que divide a equipe econômica. Há os que advogam que, a despeito dos investimentos em infra-estrutura, o governo se mantenha firme na meta de 4,25% e há os que alegam que já é possível reduzir esse esforço, pois todas as condições de endividamento e de solvência já estão garantidas. O problema é que essa não é uma simples questão de ênfase, já que há uma interdependência entre a velocidade de queda dos juros e a equação fiscal.

O ministro Paulo Bernardo explicou que os fundamentos do PAC são: garantir os investimentos públicos em infra-estrutura, desonerar os investimentos produtivos e controlar cerca de 60% das despesas do orçamento da União (resultado da soma dos gastos com pessoal e previdência social). Tão logo se inicie a nova legislatura, em fevereiro, o governo enviará as medidas legais ao Congresso para colocar "travas" nos gastos com pagamento de pessoal dos três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) e limites aos gastos com a previdência social, que serão estabelecidos pela nova política de reajuste do salário mínimo.

Quanto a dois aspectos cruciais para o atual equilíbrio das contas públicas - a CPMF e a DRU (Desvinculação de Receitas da União) -, Bernardo assinalou que a proposta do governo, que ainda não está totalmente fechada, é prorrogar a sua vigência por mais dez anos. A alternativa a esse prazo é propor a prorrogação por apenas quatro anos. Tanto a DRU quanto a CPMF, conforme a legislação atual, têm vigência apenas até dezembro de 2007.

Embora assegurem que não haverá mudanças na política macroeconômica calcada no tripé superávit primário-câmbio flutuante-regime de metas para a inflação, os ministros sabem que o cumprimento da meta de superávit este ano - seja ela de 4,25% ou 3,75% do PIB - não está assegurada, dados os compromissos de gastos assumidos no ano passado.

O contingenciamento do orçamento de 2007 terá que ser substancial e as incertezas quanto à questão fiscal e aos compromissos do governo com metas fiscais de mais longo prazo estão na raiz das inquietações dos economistas oficiais. São, também, explicações para a saída de Carlos Kawall do Tesouro Nacional e o esperado pedido de exoneração de Bernard Appy. Ambos teriam sido contra o reajuste do salário mínimo para R$ 380, por exemplo. "O Appy chegou ao limite das concessões", informou um ministro. "A saída dos dois terá impacto negativo. O mercado deve reagir", previu um conselheiro do presidente Lula.