Título: Visões divergentes para o "nó dos juros"
Autor: Sergio Lamucci
Fonte: Valor Econômico, 13/01/2005, Especial, p. A10

O professor Luiz Gonzaga Belluzzo, da Unicamp, e o ex-diretor do Banco Central (BC) José Júlio Senna têm visões muito diferentes sobre os principais desafios da política econômica no governo Lula. Belluzzo critica principalmente a combinação de câmbio valorizado e juros altos, para ele o grande nó a ser desatado. Senna, por sua vez, vê com bons olhos a condução da política monetária, além de avaliar que o real não está apreciado em demasia. A prioridade, segundo ele, deveria ser um ajuste mais radical das contas públicas. A diferença de avaliações mostra que a política econômica está longe de obter um consenso entre os analistas. E, apesar do crescimento de 5% ou mais registrado em 2004, num ano que o país registrou seu segundo superávit em conta corrente, persistem dúvidas quanto à sustentabilidade da expansão da economia a taxas mais robustas. Mesmo Senna, em tese mais afinado com a orientação econômica do governo, faz críticas a ela. O sócio da MCM Consultores condena a atenção excessiva que se dá no país ao resultado primário das contas públicas (que não inclui gastos com juros), pelo qual o Brasil vem gerando sucessivos superávits desde 1999. A questão, diz Senna, é que o Brasil ainda tem déficits de quase 3% no conceito nominal (incluindo despesas com juros). "Não parece elevado por padrões internacionais, mas a situação do Brasil é especial. O país é muito endividado. Os níveis da dívida e dos gastos públicos constituem o principal fator de risco, motivo pelo qual deveríamos partir para cortes expressivos do dispêndio governamental e superávits nominais", afirma ele. Se essa estratégia fosse adotada, haveria uma melhora significativa da percepção do risco-Brasil, abrindo espaço para o crescimento sustentável. "Considero incorreta a afirmação de que a política fiscal é boa." Nesse cenário, Senna avalia que se exige do BC mais do que está no alcance da autoridade monetária. "A tarefa de conter a inflação e criar condições para o crescimento sustentável é de todo o governo, e não apenas do BC." As críticas de Belluzzo são bem diferentes, concentrando-se especialmente no que considera a excessiva valorização do câmbio e nos juros elevados. Também sobram farpas às metas de inflação. "Mais do que ambiciosa, acho a meta equivocada. Devido à forma que o BC tentou administrar, houve perda de emprego e renda desnecessariamente." Para ele, o real está muito apreciado, o que deixa o país vulnerável a um aumento de importações e, pior, "dá um sinal de longo prazo muito ruim para os investimentos que se dirigem para os setores ligados ao comércio exterior". Belluzzo avalia que o BC deveria reduzir os juros com cautela, o que ajudaria a desvalorizar o câmbio. Ele também insiste numa compra mais agressiva de dólares, para recompor as reservas. Mas Belluzzo ressalta que não está propondo uma mudança de modelo. "Nós estamos pedindo uma coisa muito mais modesta", afirma ele, destacando que não pede, por exemplo, redução do superávit primário neste momento. A proposta é mudar a questão cambial e monetária, diz Belluzzo. Leia, a seguir, os principais trechos das entrevistas com Belluzzo e Senna.