Título: Peru cresce e atrai empresas brasileiras
Autor: Leo, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 02/01/2007, Brasil, p. A16

Embalados pela aproximação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o recém-eleito Alan Garcia e pelas excelentes condições macroeconômicas de um país que cresce há cinco anos a taxas acima de 5%, grandes empresas brasileiras se preparam para expandir atividades no Peru. Lula deve visitar o país este ano, mas antes disso, até abril, uma missão empresarial coordenada pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) desembarcará em Lima.

Em 2006, o crescimento peruano - 7,2% - superou as expectativas principalmente pela demanda interna, segundo dados da Comissão Econômica para América Latina e Caribe (Cepal).

"É um país com estabilidade econômica, um programa fiscal bem feito e uma agenda importante de iniciativas do governo nos próximos anos", descreve o diretor do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Derex) da Fiesp, Carlos Cavalcanti. "Os chineses estão entrando lá agressivamente, existe a ameaça do tratado de livre comércio entre o Peru e os Estados Unidos, temos de andar rápido, chegar primeiro", defende.

Alan Garcia, ao visitar o Brasil em sua primeira viagem ao exterior depois de eleito, em novembro passado, teve um almoço com empresários na Fiesp e uma reunião reservada com poucos executivos de grandes empresas, especialmente empreiteiras, com interesses no mercado peruano. "Foi enorme a disputa pelo encontro, tamanho é o interesse naquele mercado", afirma Cavalcanti.

No fim de dezembro, Alan Garcia defendeu o livre comércio com o Brasil, uma indicação de que apoiaria esforços diplomáticos para encurtar prazos no acordo já firmado entre o Peru e o Mercosul, que prevê a derrubada de barreiras comerciais a produtos brasileiros no mercado peruano gradativamente, até 2019.

Um dos setores que pressionam o governo brasileiro para negociar a redução de prazos e ampliação da abertura de mercado é o automotivo. O presidente da associação do setor, Rogélio Golfarb, classifica a negociação com o Peru como "prioridade", animado com os resultados da ligeira abertura ocorrida naquele mercado, com o acordo automotivo com o Mercosul, que começou a vigorar no fim de 2005.

Pelo acordo, só haverá livre comércio de automóveis em 2019 e de autopeças em 2014. Desde janeiro as autopeças têm redução de 15% nas tarifas de importação, que cairão gradativamente. Os automóveis terão vantagens semelhantes a partir de 2009. As vendas brasileiras do setor ao mercado peruano dispararam, de US$ 78,7 milhões em 2003 para quase US$ 215 milhões em 2005. Em 2006, até outubro, estavam em US$ 250,4 milhões, impulsionadas, principalmente pelas vendas de autopeças.

Para Golfarb, o Brasil tem de aproveitar o novo governo peruano para discutir, ainda em 2007, a ampliação da abertura no mercado automotivo antes que entre em vigor o tratado de livre comércio entre Peru e Estados Unidos.

Na reunião com a Fiesp, em todos os discursos, Alan Garcia fez questão de ressaltar a "segurança jurídica" do Peru e o interesse do novo governo em aproveitar a onda de crescimento para investimentos sustentados em infra-estrutura, segundo lembra Carlos Cavalcanti. Todas as grandes construtoras brasileiras têm atividades no Peru. Pelo menos quatro grandes construtoras estão trabalhando em trechos da rodovia Interoceânica, ligando o Brasil ao litoral peruano.

A garantia de conclusão das obras da estrada feita por Garcia anima exportadores, como os fabricantes de máquinas e equipamentos, que aumentaram em 44% as vendas ao Peru em 2005, embora ainda tenham um volume baixo de exportações ao país, inferior a US$ 150 milhões. "Vejo grande perspectivas no Peru, com um presidente desenvolvimentista, dinâmico, crescimento na agricultura e interesse na industrialização", comenta o presidente da Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Newton de Mello. "O Peru é uma saída estratégica para as exportações brasileiras ao Pacífico", defende.

A ligação rodoviária, já construída até a fronteira do Acre, demanda, para garantir o acesso rodoviário ao porto peruano de Yurimáguas, a conclusão de cerca de 600 quilômetros de estrada, hoje a cargo de um consórcio liderado pela brasileira Odebrecht, em regime de parceria público-privada (PPP). "Hoje mandar uma máquina ao mercado peruano é mais demorado que para a Europa", queixa-se Newton de Mello, ao descrever as dificuldades logísticas do transporte por navio, na região.

O presidente da Abimaq tem recebido consultas para vendas ao país de máquinas brasileiras de plástico, embalagens, agrícolas e siderúrgicas. No setor siderúrgico, aliás, desde junho de 2006, a maior siderúrgica peruana, a Siderperu, pertence à brasileira Gerdau, que comprou o controle acionário por US$ 60 milhões e se comprometeu em investir US$ 100 milhões nos próximos cinco anos, para modernização da usina e proteção ambiental.

As semelhanças no mercado consumidor peruano atraem também empresas brasileiras de outros setores com planos de expansão pela América do Sul, como a Natura, que desde a década de 80 montou no país uma representação e hoje detém entre 3% e 3,5% do mercado de cosméticos local, que chega a US$ 600 milhões anuais e cresce 10% ao ano. "O crescimento sustentado, acima de 5% desde o governo Alejandro Toledo, dá tranqüilidade aos investimentos e a consistência do crescimento desperta curiosidade das empresas", reconhece o gerente-geral da Natura no Peru, Erasmo Toledo. O fato de o Brasil, ao contrário de outros vizinhos, ter uma história de relações pacíficas e sem atritos de fronteira com o Peru também facilita os contatos dos executivos brasileiros, conta Toledo.

"O Peru tem condições de tornar-se plataforma de exportação dos produtos brasileiros, para a Ásia e a Costa Oeste dos Estados Unidos", diz a conselheira técnica da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), Josefina Guedes, integrante da Coalizão Empresarial Brasileira. A balança comercial do Brasil com o Peru mostra que o país é um grande mercado para médios e pequenos exportadores brasileiros: quase 70% das operações de exportação ao mercado peruano é de vendas de até US$ 10 mil. As exportações totais mais que dobraram em apenas dois anos: de US$ 631 milhões em 2004, chegaram a US$ 1,33 bilhão até outubro de 2006.