Título: Lei federal pode elevar custos de transporte rodoviário de cargas
Autor: Watanabe, Marta e Zanatta, Mauro
Fonte: Valor Econômico, 30/01/2007, Brasil, p. A2

Uma nova lei federal que impõe regras para o transporte rodoviário de cargas promete elevar de forma significativa os custos de importação e exportação. A lei determina um prazo máximo de cinco horas para a carga e descarga de caminhões no endereço de destino.

Caso o horário não seja cumprido, o proprietário da carga paga ao transportador R$ 1,00 por tonelada hora. Um treminhão com sete eixos carrega até 57 toneladas. A média usada por caminhões em transporte de grãos é de 27 toneladas. As cargas chegam a demorar dias para carga e descarga. A nova lei tem causado apreensão em alguns segmentos agrícolas, como o de grãos, cujo escoamento deverá ganhar ritmo nas próximas semanas. Mas, segundo as entidades que reúnem os usuários do transporte rodoviário, a medida tem impacto mais amplo e atinge setores como o de produtos siderúrgicos, fertilizantes, ferro gusa, produtos químicos e cimento. Esses segmentos transportam, em média, 60% da produção por rodovias.

A nova determinação já suscitou movimentação política de alguns setores. Publicada no início de janeiro, a Lei nº 11.442/2007 será, segundo a Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA), alvo de uma audiência com a ministra chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. A entidade pedirá a mudança da lei. O encontro deverá ser coordenado pela Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec). "A lei tem o lado bom da normatização de contratos. Mas tem um lado ruim de invasão desses mesmos contratos quando estabelece detalhes que devem ser tratados em acordos comerciais", avalia o consultor de logística da CNA, Luiz Antonio Fayet.

"É difícil fazer lei nacional porque o país é muito diferente, há muitas nuances entre portos fluviais e marítimos. A lei mistura coisas diferentes ao estabelecer as mesmas regras para cargas em granel, cargas vivas, geladeiras e minério de ferro" diz Fayet. Em conjunto com outras entidades, a CNA encara a norma como uma "flagrante inconstitucionalidade", já que "invade" relações privadas. "Queremos uma regulação básica, mas que não invada questões específicas de contratos privados" afirma Fayet. "Sabemos que há um turbilhão de coisas na Casa Civil, mas é preciso uma ação rápida para acabar com essa distorção."

José Ribamar Miranda Dias, vice-presidente da Associação Nacional dos Usuários de Transporte de Carga (Anuc), diz que a movimentação não parte somente dos setores agrícolas. A entidade reúne proprietários de cargas de segmentos que vão desde os grãos até os de minério e siderurgia. "Pediremos ao governo a alteração da lei e, se necessário, procuraremos um partido político ou uma entidade para entrar com uma ação direta de inconstitucionalidade."

A Anuc afirma que o dispositivo ainda não está em vigor porque precisa ainda de regulamentação da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Para ele, o cumprimento do prazo de cinco horas é "absolutamente inviável". "A lei precisa de regulamentação porque está cheia de lacunas. Ela estipula, por exemplo, que o prazo começa a contar a partir do momento da chegada ao destino. O que é isso? É a chegada do caminhão ao portão do porto? Ao estacionamento? Quem vai fiscalizar esse horário de chegada?"

Dias diz ainda que a lei estipula uma punição para a parte errada. "A demora na carga e descarga foge ao controle do proprietário da mercadoria. Os portos são ineficientes porque não têm infra-estrutura necessária, os acessos às vias portuárias são precários e há intervenção de vários órgãos de fiscalização que não estão necessariamente coordenados, retardando ainda mais o despacho dos produtos", exemplifica ele. "Os caminhões ficam dias à espera da carga e descarga em filas quilométricas."

A nova determinação não apareceu à toa. O presidente da Associação Brasileira de Transporte de Cargas (ABTC), Newton Gibson, diz que a definição de um prazo era um pleito antigo do setor. "Faz uma década que isso vem tramitando. A nova lei é o início de um novo ciclo e precisa ser aplicada", argumenta. "Estamos num trabalho intenso para conscientizar empresários, carreteiros e transportadores autônomos para que a lei seja realmente aplicada."

Gibson acredita que, ao lado de outros dispositivos, a nova norma deverá dar mais garantias aos transportadores. "Ficar dois dias parados esperando carga ou descarga traz muitos prejuízos ao setor. O caminhão e o motorista precisam rodar."

A advogada Luciana Tambellini, do escritório Nunes e Sawaya Advogados, explica que o dispositivo é totalmente inovador. "A lei anterior deixava isso para ser resolvido em contrato entre transportador e o proprietário da carga." Para ela, a nova lei teve intenção de proteger o transportador, mas corre grande risco de não ser colocada em prática. "Juridicamente é possível pedir o pagamento estipulado em lei, mas comercialmente é arriscado porque o transportador provavelmente perderá o cliente."