Título: EUA exigem agora corte de subsídio agrícola no Brasil
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 30/01/2007, Brasil, p. A7

Os Estados Unidos, sob pressão para cortar subsídios agrícolas, passaram a exigir que também o Brasil faça corte substancial nas subvenções aos produtores brasileiros, nas barganhas por um acordo na Rodada Doha.

O Valor apurou que, em Davos, a delegação americana cobrou corte na ajuda dos agricultores brasileiros justamente quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fazia discurso pedindo o fim dos subsídios nos países ricos.

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, reuniu-se ontem durante três horas com a representante comercial dos Estados Unidos, Susan Schwab, em Genebra. Nada foi divulgado sobre o resultado das discussões.

Fonte próxima dos americanos confirmou que houve uma "dura reação" do lado dos brasileiros em Davos, por entenderem que Washington procurava fugir da discussão para desbloquear a rodada. O subsecretário de assuntos econômicos do Itamaraty, Roberto Azevedo, que chefia a delegação brasileira nas bilaterais, disse que não falaria "de jeito nenhum" sobre as discussões confidenciais.

A demanda americana pode até ser tomada como piada de mau gosto no agronegócio brasileiro, mas reflete a persistente suspeita em relação ao desempenho das exportações brasileiras de commodities. Assim, acusados na negociação global por causa de sua resistência em cortar subsídios domésticos, os Estados Unidos resolveram atacar onde acham que os outros têm pecados.

Estudo recente da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) confirmou que houve aumento nos subsídios no Brasil, mas que eles "ainda são muito abaixo" da média dos países ricos e do que o país pode conceder pelo atual acordo agrícola da Organização Mundial do Comércio (OMC).

Há dois anos, outro estudo da OCDE já havia irritado Washington ao colocar o Brasil acima de suspeitas. Concluiu que o subsídio brasileiro representou apenas 3% do valor da produção agrícola no período 2002/04, insignificante em relação aos 30%, em média, pagos pelos países ricos.

Agora, o novo estudo, atualizado, mostra que, em 2004, 4% da renda do agricultor brasileiro era subvenção, e a cifra passou para 6% em 2005. Mas a OCDE deixa claro que não há comparação com o que se passa nos seus países-membros. A estimativa é que nesses países a ajuda com agricultura fica em US$ 1 bilhão por dia. No Brasil, segundo a OCDE, a política de garantia de preços chegou a US$ 1,3 bilhão em 2005 e outros pagamentos subiram 44%, somando US$ 2,8 bilhões, com juros subsidiados para investimento, por exemplo.

Segundo a OCDE, a maior proteção no Brasil continua sendo dada para arroz, milho, algodão e trigo. Um analista estima que a demanda dos Estados Unidos poderia atingir os programas de ajuda do governo à agricultura familiar, se fosse aceita, o que parece fora de questão.

A própria OCDE concluiu de novo que a subvenção total à agricultura brasileira ficou, na média, em 0,68% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2003-2005, "bem abaixo" da média de 1,14% nos países ricos, "mesmo se a agricultura no Brasil tem uma fatia muito maior na renda nacional do que nos industrializados".

Uma fonte afirma que, no ano passado, o Brasil deu mais subvenções para soja e milho, por causa da crise no setor e do câmbio valorizado. Além disso, não passou despercebido o montante bilionário que o presidente Lula liberou para os agricultores dois dias antes da eleição.

Desde que as exportações brasileiras de commodities começaram a incomodar os produtores dos países industrializados, há quatro anos, os americanos não cessam de averiguar se a produção agrícola seria subsidiada no país. O senador republicano Charles Grassley, republicano do Iowa, Estado produtor de soja e milho, mandou um centro de pesquisa do Congresso americano investigar a agricultura brasileira. A constatação dos pesquisadores foi de que o desempenho brasileiro não depende de subvenção.

É nesse cenário de temor da competitividade brasileira que são alimentadas as reações defensivas na OMC.