Título: Mantega diz que corte pequeno na Selic permite prolongar reduções
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 26/01/2007, Finanças, p. C2

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, atribuiu ontem a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de cortar em apenas 0,25 ponto percentual a taxa Selic (para 13% ao ano) a uma estratégia para prolongar as reduções da taxa de juros ao longo do tempo, ou seja, "para que haja mais reduções".

Ao seu lado, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, disse que a decisão do Copom "aumentou a probabilidade" de flexibilização futura da política monetária e garantiu que ambos trabalhavam "em total sintonia" para acelerar o crescimento econômico.

Mantega e Meirelles tiveram que comparecer diante da imprensa brasileira, pouco depois de terem desembarcado em Davos (Suíça), por ordem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, para negar que haja divergências entre ambos, no rastro do corte de juros de quarta-feira.

Logo que chegou no elegante hotel Belvedere, o presidente avisou logo que não falaria, mas que o ministro da Fazenda e o presidente do BC iriam dar entrevista. O porta-voz da presidência, André Singer, pegou o telefone, localizou os dois em hotéis diferentes e ambos deram entrevista de pé, no hall do hotel, enquanto executivos internacionais entravam e saíam sem entender nada.

Os dois pareciam visivelmente pouco habituados ao exercício conjunto a que eram submetidos. Indagado sobre a decisão do Copom, o ministro da Fazenda insistiu em ver o lado positivo, como na historia do copo com apenas metade de água. Durante a entrevista, Mantega deu a entender que já sabia qual era a tendência do Copom. Conversam no dia anterior da reunião, discutem cenários e "só não sugiro qual vai ser a taxa de juro''. Mas ressalvou: "É claro que ele (Meirelles) sabe que espero cada vez menor, como o presidente também e ele próprio. Só que ele tem de cumprir a meta de inflação".

Enquanto os empresários reclamam da posição conservadora do BC, o ministro avalia que o importante é que houve redução dos juros. "O contrário é que prejudicaria o PAC. Continuamos cumprindo o que temos dito, o crédito continua aumentando e os juros caindo. Estamos no caminho certo", afirmou Mantega.

Questionado se afinal o corte era suficiente ou não, o ministro retrucou que a taxa "caiu na medida considerada adequada pelo Copom". "O importante é que os juros vão continuar caindo nos próximos meses e vão ajudar a cumprir os objetivos do PAC."

Mas, afinal, se fizera um pedido publico, ele não esperava corte maior? A resposta de Mantega foi de que não fez pedido público ao BC, apenas teria mostrado projeção para os próximos anos, em que o mercado prevê taxa media de juros em torno de 10% em 2010.

"Queremos crescimento econômico maior compatibilizado com inflação maior", insistiu Mantega. "Não adiante perseguir crescimento maior com inflação subindo", repetindo o discurso habitual do presidente do BC.

Até então calado, Meirelles foi indagado se entendera as afirmações de Mantega como um pedido público, tornando-se questão política, para acelerar a queda dos juros. "O ministro já colocou com clareza o que ele quis dizer'', retrucou a autoridade monetária, claramente preferindo estar a quilômetros dali. Sob insistência, continuou: "Temos relação absolutamente cordial e trabalhamos em completa sintonia. O BC cumpre sua missão, de controlar a inflação."

Dando mais ênfase na voz, Meirelles acrescentou: "É assim que contribuímos para reforçar o PAC, porque o presidente colocou com clareza que quer crescimento com responsabilidade e seriedade. Cada um cumpre com sua parte".

Meirelles soltou um leve sorriso quando foi perguntado sobre o petardo lançado pelo ex-ministro José Dirceu em seu blog, aconselhando o presidente Lula a não confirmá-lo no segundo mandato a frente do BC. "Qualquer cidadão pode dar sua opinião", retrucou, procurando ignorar o papel de Dirceu no PT e ainda no governo.

Diante de Meirelles, o ministro da Fazenda garantiu que a posição mais conservadora sinalizada pelo Copom não prejudica os objetivos do PAC. "Opiniões diferentes no Copom são absolutamente normais. Ganhou a discussão quem tinha argumentos mais sólidos", afirmou. Mas insistiu que a Selic é juro de curto prazo e que o credito de longo prazo está caindo consideravelmente.

O ministro da Fazenda estimou em 5% a taxa ideal de crescimento do PIB e acha que o país reúne estas condições. "Relatórios do Banco Central me dizem que a economia está aquecida. A aceleração da economia já está acontecendo."

Meirelles, por sua vez não se considera muito ortodoxo. "A missão do BC é cumprir a meta de inflação, e vai continuar cumprindo em total sintonia com o Ministério da Fazenda'', reiterou.

Quando Mantega entrou no terreno da "imaginação" sobre a estratégia por trás do corte modesto da Selic, um jornalista perguntou se ele não tivera a mínima curiosidade, viajando quase 13 horas ao lado do responsável dos juros, de perguntar se sua suposição estava correta. O ministro respondeu que "claro que sempre conversamos".

A veracidade das declarações dadas em conjunto foi testada logo a seguir. Perguntado se fora o presidente que os mandara dar entrevista juntos, Meirelles respondeu que não. "Estamos em hotéis próximos, sabíamos que os jornalistas estavam aqui e viemos conversar."