Título: Argentina capta US$ 500 milhões
Autor: Rocha, Janes
Fonte: Valor Econômico, 26/01/2007, Finanças, p. C8

O governo argentino levantou ontem US$ 500 milhões junto a investidores internacionais com uma emissão de bônus denominados em dólares, o Bonar VII. O volume de ofertas de compra, de US$ 1,729 bilhão, segundo informou o Ministério da Economia, foi três vezes e meia maior que o volume à venda, o que permitiu ao Tesouro argentino fixar um custo de 7,71% anuais para a operação.

Foi a taxa mais baixa para um papel emitido pela Argentina desde a colocação do Boden 2012, conhecido como "bônus da crise", vendido em julho de 2005, logo depois de encerrada a reestruturação da dívida externa, em que os investidores aceitaram uma taxa de 7,83%. O Bonar VII é um título com vencimento final no ano de 2013, que paga um cupom fixo semestral de 7% ao ano.

O governo tem autorização para captar até US$ 2 bilhões com o Bonar VII, dos quais o equivalente a US$ 1 bilhão já foi captado em 2006. Na primeira emissão, em setembro, o papel saiu a 8,40% anual. Na segunda, em novembro, baixou para 8,03% e agora para 7,71%. Mesmo com a queda da taxa, o custo de captação da Argentina ainda é maior que o do Brasil. Um título brasileiro de prazo equivalente, com vencimento em julho de 2014, emitido em 2004, é negociado atualmente por 6,015% no mercado secundário.

Foi a primeira emissão em dólares do governo argentino este ano e o resultado da operação era amplamente esperado, dado o forte interesse de investidores internacionais em papéis do país nos últimos meses. Vista até pouco mais de um ano atrás como o patinho feio do mercado financeiro, devido à reestruturação da dívida de US$ 103 bilhões em 2005, a Argentina virou um novo Eldorado dos investidores. Um dos papéis emitidos pelo governo para a renegociação, com rendimento atrelado ao desempenho do PIB, pelo qual não se dava nada em 2005, está sendo negociado hoje a um preço recorde de US$ 13,85 e já gerou lucros de 45% só no ano passado, segundo um relatório do Banco BBVA citado pela agência Dow Jones.

A forte entrada de dólares - tanto de operações comerciais quanto financeiras - tem obrigado o Banco Central (BCRA) a intervir freqüentemente para segurar o valor da moeda local, o peso, na faixa de 3,10 por dólar. Os investidores têm sido atraídos pelo crescimento econômico de 8% a 9% ao ano, somado à manutenção do superávit primário nas contas públicas e inflação sob controle, explica o economista Luciano Laspina, sócio da consultoria Macrovision.

Laspina lembra que a demanda pelos bônus argentinos mostra que o país está rompendo um paradigma do mercado financeiro internacional: o de que os investidores preferem aplicar em títulos de países emergentes emitidos sob a legislação internacional. O Bonar VII é emitido sob a legislação local.

Desde a reestruturação da dívida, quando investidores detentores de US$ 20 bilhões em créditos recusaram a proposta de renegociação do país, a Argentina não foi mais ao mercado internacional porque há um risco jurídico de que estes investidores embarguem o dinheiro captado com medidas cautelares nos tribunais americanos e europeus. "A engenharia legal necessária para uma emissão sob a legislação internacional é muito complicada para a Argentina, mas a emissão do Bonar mostra que não é necessário. Os investidores estão batendo na nossa porta", diz Laspina.

"O resultado foi muito positivo, na medida em que permite ao governo seguir financiando seu déficit com dívida de baixo custo", opinou Santiago Palma Cané, sócio da Consultoria Fimades. A necessidade de financiamento externo da Argentina este ano está estimada em US$ 3,8 bilhões, pouco menos que os US$ 4,7 bilhões de 2006, quando o governo levantou US$ 5,4 bilhões, mais que o suficiente para cobrir os vencimentos. No ano passado, porém, contou com a ajuda do governo venezuelano, que comprou US$ 3,6 bilhões em papéis argentinos.