Título: Cidade despreparada para posse
Autor:
Fonte: Correio Braziliense, 21/12/2010, Opinião, p. 18

A 10 dias da posse da presidente da República e do governador do Distrito Federal, a cidade não se preparou para receber os convidados. Chefes de Estado, representantes de países dos cinco continentes, corpo diplomático, autoridades das demais unidades da Federação, brasileiros e estrangeiros distinguidos confirmaram a presença na solenidade da troca de mandatários do Palácio do Planalto. A data ¿ prevista na Constituição ¿ não constitui surpresa. A cada quatro anos, o dia 1º de janeiro marca o início da administração dos chefes dos executivos federal, estaduais e do DF.

Apesar da previsão, a capital não se preparou para a grande festa. A bela obra de Lucio Costa, Oscar Niemeyer e Burle Marx não exibirá o criativo traçado, os monumentais prédios ou os exóticos jardins. Escondem-na a negligência, os maus-tratos e a falta de compromisso. Os visitantes que aqui desembarcarão vão passar por ruas esburacadas, mato alto, lixo espalhado. Há trechos em que terão a visibilidade prejudicada pelo matagal que esconde a paisagem e as placas de sinalização.

Se ousarem andar a pé, não vão gozar de privilégios. Enfrentarão os mesmos percalços enfrentados no dia a dia dos brasilienses. Faltam calçadas. Sobretudo no Setor Hoteleiro, por onde circula o maior número de turistas, o estado do calçamento que sobrevive a anos de abandono é terminal. Descontinuidade, buracos, poças de água, mato alto são agruras que esperam os aventureiros que gostariam de conhecer com mais intimidade a realização de JK.

Monumentos que causam admiração em livros de arquitetura e arte são a imagem do abandono e do descaso. É o caso do Teatro Nacional. Quem entra na Sala Vila-Lobos se choca. Goteiras, tapetes sujos, cortinas esgarçadas, poltronas puídas, enchimento dos assentos à mostra, circulação de baratas e ratos fazem a recepção que constrange e envergonha o brasiliense. O Museu de Arte não fica atrás. Está com o jardim tomado pelo mato, as portas fechadas e o acervo abandonado. Tapumes escondem a Catedral. As obras da Feira da Torre de TV, cuja inauguração, de adiamento em adiamento, não se concretizou, contribuem para a imagem de abandono.

Algum turista não quererá ver o Palácio da Alvorada de perto? Possivelmente, não. Mas, para chegar lá, passará por ruas inacabadas, balões sobrepostos, matagal alto. Por certo se perguntará: se a área mais nobre da capital se encontra naquele estado, o que esperar das demais? O brasiliense que paga impostos espera que o visitante não precise de atendimento hospitalar. Se precisar, concluirá que pegou o avião errado. Não desembarcou na capital síntese do século 20, mas em Porto Príncipe. O Haiti é aqui.