Título: Serra aproxima-se de empresários para tentar assumir porto de Santos
Autor: Felício, César e Agostine, Cristiane
Fonte: Valor Econômico, 25/01/2007, Política, p. A6

O governador de São Paulo, José Serra (PSDB), conta com a iniciativa privada para pressionar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a estadualizar o porto de Santos. A defesa da estadualização foi vinculada ao projeto de um duto voltado para a exportação de álcool, o chamado alcoolduto, um programa estratégico para o empresariado paulista. Santos é uma das alternativas em estudo para o escoamento da produção.

A caracterização do projeto como uma demanda não só do governo estadual, mas também do empresariado, é estratégica para o governo federal atender a uma administração da oposição. "É uma questão de pressão política. Já teve muita conversa e todos no governo federal concordam. Entre concordar e fazer é a tal história", disse o vice-governador e secretário estadual de Desenvolvimento, Alberto Goldman, que, na terça-feira esteve reunido por seis horas com a diretoria da Fiesp, para ouvir as reivindicações do setor industrial junto ao governo do Estado.

O vice governador relatou que a Fiesp teria encaminhado um documento para o governo federal sobre a importância da medida e que a principal entidade patronal dos usineiros, a Unica, deverá entregar ao governo estadual um projeto para o duto em seis meses.

A estadualização é uma antiga demanda do Estado. Chegou a ser aprovada pelo governo federal, em outubro de 2002, mas emperrou com o fim da gestão de Fernando Henrique Cardoso, O assunto foi relançado por Serra ao comparecer a um evento empresarial, na semana passada.

O projeto do alcoolduto, segundo Goldman, deve envolver o transporte do produto por hidrovia do Oeste Paulista até Conchas, seguindo por duto até Paulínia, onde haveria um entroncamento com outro duto que interligaria a produção das usinas do Nordeste do Estado. Em seguida o duto poderia ir para Santos ou São Sebastião. A longo prazo a obra poderia atender ainda a produtores de Goiás e dos estados vizinhos a São Paulo. O modelo licitatório a ser adotado deve ser o de concessão.

A vantagem do porto de Santos sobre São Sebastião, segundo Goldman, é a menor distância em relação aos centros produtores e o possível custo menor da obra. "Em Santos há uma ligação de tubulação que vai para a usina de Henry Borden, então facilitaria, sairia mais barato. Pode colocar na própria tubulação de água um outro tubo", disse Goldman. Neste sentido, a estadualização seria crucial. "O planejamento do porto está desintegrado do restante do planejamento da estrutura logística do Estado", afirmou o vice-governador.

Mas São Sebastião já é um porto estadual e permite o uso por navios de calado maior, acima de 100 mil toneladas. Segundo Eduardo Pereira de Carvalho, presidente da Unica, será primeiro preciso definir qual horizonte de volume que será exportado no médio e longo prazo. "Com a infra-estrutura existente hoje (considerando uma exportação anual de álcool em torno de 3,5 bilhões de litros), o porto de Santos resolve", afirmou. Mas o setor sucroalcooleiro trabalha com um cenário de que as exportações de álcool irão crescer nos próximos anos, dobrando o volume exportado nos próximos três anos. Com isso, o porto de Santos torna-se inviável por conta da limitação de calado. A Fiesp foi procurada por este jornal, mas sua assessoria de imprensa disse que não poderia dar informações sobre o assunto.

Há três anos, a Petrobras anunciou planos de construção de alcooldutos das regiões produtoras de São Paulo até o porto de Olho D'Água, no Rio de Janeiro. O projeto todo está estimado em US$ 600 milhões. Na prática, contudo, pouca coisa foi feita. A Petrobras quer ser o braço exportador de álcool do Brasil e tem cacife para agir sem estabelecer parcerias com o setor privado ou o governo estadual. "A Petrobras, como é a mão do imperador, não precisa perguntar nada para ninguém: vão lá, colocam uma tubulação e tchau. É estranho, mas a Petrobras faz as coisas como se fosse dona do mundo", ironizou Goldman.

A escolha do próprio vice para ocupar a pasta é um sinal da importância que Serra deve dar a uma aproximação com o empresariado. O cargo é o grande elo do governo de São Paulo com o setor privado. Arbitra não apenas sobre políticas de indução ao desenvolvimento, mas também sobre política de incentivos e fomento à pesquisa tecnológica.

O vice-governador deve acumular a função com a chefia do programa estadual de desestatização, função exercida pelo então vice-governador Geraldo Alckmin na gestão de Mário Covas. Na gestão de Alckmin à frente do Estado, o titular que ocupou a secretaria por mais tempo foi João Carlos de Souza Meirelles, seu coordenador de plano de governo na campanha presidencial de 2006.

Goldman divide a função informal de articulador político de Serra com o secretário da Casa Civil, Aloysio Nunes Ferreira Filho. Integrante do PCB até a década de 80, desenvolveu uma longa história de proximidade com o empresariado. Como ministro dos Transportes no governo Itamar Franco, desencadeou o processo de concessão de rodovias. Durante o governo Fernando Henrique, foi relator da Lei Geral de Telecomunicações.