Título: Para governadores, repasses diminuirão
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Fonte: Valor Econômico, 23/01/2007, Política, p. A12

A reunião com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a exposição de mais de uma hora da ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) não convenceram os governadores da oposição a apoiarem o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Reclamaram da falta de negociação das prioridades estaduais. Manifestaram preocupação com o impacto nas contas das isenções de Imposto sobre Produto Industrializado (IPI) e do Imposto de Renda, cujos recursos compõem os fundos de participação dos Estados (FPE) e dos municípios (FPM) - principal fonte de recursos para vários Estados, principalmente do Norte e Nordeste.

"Estão fazendo cortesia com chapéu alheio", afirmou o governador Cássio Cunha Lima (PSDB), da Paraíba. Ele disse que as medidas propostas podem até aumentar as desigualdades regionais em vez de diminuir. "Quando se promove isenção de IPI no setor de aço, por exemplo, e diminuição ou reajuste da tabela do IR, a federação fica ameaçada. O governo federal não mexe uma vírgula nas contribuições, que ficam só com ele, e promove isenção e renúncia naquilo que é dividido com Estados e municípios". Segundo ele, os governadores precisam analisar com cautela o impacto das medidas, porque o governo federal pode estar "dando com uma mão e tirando com a outra".

Depois do lançamento do PAC, 19 governadores governistas e da oposição reuniram-se em almoço na residência oficial do governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, único governador do PFL. Decidiram discutir as reivindicações dos Estados por região, para, a partir delas, elaborar uma "agenda federativa" a ser apresentada a Lula na reunião do dia 6 de março. A preocupação mais urgente dos governadores - e que une todos -, manifestada na reunião de ontem, não está diretamente relacionada ao PAC. Trata-se da distribuição dos recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). O prazo para a regulamentação termina em 28 deste mês. Eles querem aumentar os recursos destinados ao ensino médio, que é responsabilidade dos Estados.

Durante o almoço, os governadores avaliaram que o presidente vai precisar do apoio deles no Congresso não só para aprovar as medidas do PAC, como também para prorrogar a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) e a Desvinculação das Receitas da União (DRU). "O governo federal deseja provocar a CPMF e a DRU. Os Estados também terão suas demandas", resumiu Arruda.

Um dos maiores críticos da falta de diálogo prévio do governo com os governadores, sobre o PAC, foi o mineiro Aécio Neves (PSDB): "Nossa presença aqui demonstra nossa disposição em sermos parceiros no projeto de desenvolvimento do país, mas esse projeto não pode ser concentrado exclusivamente nas mãos da União. Seria mais adequado se houvesse previamente entendimento, consulta, diálogo com os Estados para que nós pudéssemos, inclusive, adequar os orçamentos a esse projeto, através de uma ação complementar e não distanciada, sem conexão entre aquilo que a União pretende fazer e os Estados pretendem fazer".

Aécio sentiu falta de medidas de ressarcimento da desoneração das exportações a partir da Lei Kandir. Também cobrou a não transferência das rodovias federais para os Estados e o não detalhamento dos investimentos em infra-estrutura rodoviária, para recuperação da malha existente. "Vejo um plano audacioso de construção de novas estradas, mas, como governador do Estado que tem a maior malha rodoviária federal do país, sinto que não tenha o detalhamento de conservação de sua malha, que está em Estado de absoluta calamidade", disse. Reclamou ainda de o plano prever investimento apenas no estacionamento do Aeroporto Tancredo Neves, em Confins, num Estado que tem a maior população do Brasil e está investindo cerca de R$ 350 milhões no acesso a esse aeroporto. Outra queixa do governador mineiro foi à falta de investimentos na expansão do metrô de Belo Horizonte. Segundo ele, constam apenas "medidas absolutamente paliativas".

O governador de São Paulo, José Serra (PSDB), deixou o Palácio do Planalto rapidamente, após a exposição de Dilma, porque precisava retornar a São Paulo. Por telefone, afirmou ao Valor que não tinha condições de avaliar "uma coisa tão extensa, minuciosa" tão rapidamente, por não ter tomado conhecimento antes. Mas observou que um plano de crescimento da economia precisa prever medidas mexendo nas políticas cambiais e de juros. "Não tenho condições de avaliar o documento sem ter lido. Agora, é inegável que, se o governo quer estimular o crescimento econômico, precisa prestar atenção na questão do câmbio e do juro. Vamos ver se as decisões do Banco Central serão consistentes", afirmou o tucano.

Os governadores da base aliada reagiram aos colegas da oposição. O petista Jaques Wagner, da Bahia, disse que é legítimo que cada governador demande sempre mais. "Quando o governo federal resolve fazer desoneração, desonera em dois tipo de tributos: os que participam do bolo federativo - como o IR e o PI - e portanto, os Estados reclamam. Mas ele também reduziu o PIS, Cofins que só beneficiam o governo federal", disse.

Eduardo Campos (PSB), de Pernambuco, disse que seu Estado foi contemplado em termos de obras prioritárias (BR 101, transposição, canal leste, conclusão aeroporto, metrô de Recife, obra abastecimento água para região metropolitana), mas apóia até as medidas que podem implicar redução de receita, como a redução de IPI e do IR. "Temos que dar também nossa contribuição para o crescimento da economia. Vamos recuperar essa receita como? No momento que a economia crescer quase o dobro da medida dos últimos 30 anos, estaremos ganhando também". Campos acredita que até o dia 6 vai ficar claro o que unifica os governadores, a despeito serem oposição ou governo.

Um dos poucos governadores que não atenderam ao convite do presidente Lula para presenciar a divulgação do PAC, em Brasília, o catarinense, Luiz Henrique da Silveira (PMDB), criticou, como os seus colegas de oposição, a falta de diálogo. "Minha presença não vai fazer falta neste monólogo que será apresentado", disse o governador, acrescentando que pretende ir a Brasília daqui alguns dias, quando está prevista uma reunião só de governadores com o presidente. A Presidência anunciou ontem o encontro para março.

Silveira está praticamente condicionando seu diálogo com o governo Lula a uma mudança no pacto federativo. Ele diz não acreditar em desenvolvimento econômico enquanto não houver uma melhor repartição das contribuições federais com Estados e municípios.

Silveira não conversa com Lula há pelo menos dois anos. Nos últimos meses, o governador tem criticado o governo federal considerando-o como o governo da não-resposta. (RU e PTL, colaborou Vanessa Jurgenfeld, de Florianópolis)