Título: Restos a pagar do ano passado somam R$ 16,7 bilhões
Autor: Izaguirre, Mônica
Fonte: Valor Econômico, 17/01/2007, Brasil, p. A3

No mínimo R$ 16,71 bilhões de despesas de investimentos empenhadas pelos três poderes da União em 2006 e anos anteriores ficaram para ser pagas em 2007. Esse foi o montante de restos a pagar inscritos pelos órgão federais no Sistema Integrado de Administração Financeira, nessa categoria de despesa, até dia 15 de janeiro. Comparada à do ano anterior, que já foi quase o dobro da de 2005, a cifra cresceu 25,8%.

Segundo a Secretaria do Tesouro Nacional, o prazo de inscrição de empenhos não pagos de anos anteriores vai até dia 22 de janeiro. Portanto, o número poderá ficar maior. O empenho é a etapa da execução do Orçamento em que se dá o comprometimento contábil das dotações previstas no orçamento, para posterior pagamento. A legislação sobre contabilidade pública permite que, não for possível dentro do mesmo ano-calendário, esse pagamento fique para o ano seguinte, desde que o respectivo valor seja lançado como resto a pagar no sistema de controle contábil do governo.

Na categoria custeio, excluídos gastos com pessoal, o volume de pagamentos pendentes apontado pelos órgãos até dia 15 foi até mais alto, pois alcançou R$ 18,69 bilhões. Mas representou crescimento de apenas 3,9% sobre o montante de inscrições feitas no início do ano passado.

É preciso considerar ainda que o custeio, que inclui benefícios da Previdência Social, envolve um universo de gastos muito maior do que o de investimento, observa Francisco Lúcio Pereira Filho, consultor de Orçamento da Câmara dos Deputados. Foi ele quem extraiu os dados do Siafi, a pedido do Valor. A diferença de amplitude a que se refere pode ser constatada pelo volume de empenhos. Em 2006, por exemplo, enquanto para custeio foram empenhados R$ 334,62 bilhões, para investimento, foram apenas R$ 17,32 bilhões.

A inscrição de valores em restos a pagar, a cada início de ano, é inevitável, por causa da defasagem de tempo entre a fase de empenho, que necessariamente antecede a contratação de obra ou serviço pelo setor público, e a fase de pagamento, que só pode ocorrer depois do serviço prestado ou da obra entregue. Principalmente no caso dos investimentos, porém, Francisco Lúcio avalia que tem havido uso exagerado desse instituto pelos poderes da União. Esse é um dos fatores que colaboram para fazer do Orçamento federal uma peça de ficção, muito diferente do fluxo efetivo de receitas e desembolsos, com base no qual é apurado o resultado fiscal do setor público e aferido o cumprimento das metas de superávit primário (conceito que exclui gastos com juros).

Na opinião do consultor da Câmara, o governo tem condições de prever, com razoável aproximação, até agosto, data limite de apresentação do projeto de Orçamento do ano seguinte, o volume de empenhos que não será possível pagar dentro do mesmo ano-calendário. Assim, em vez de inscrevê-los em restos a pagar, poderia incluí-los no novo Orçamento. "Isso tornaria o Orçamento mais real. O crescimento dos restos a pagar tem provocado enorme distorção", afirma Francisco Lúcio. Pela interpretação do consultor, a legislação já permite que a lei orçamentária anual contenha dotações para pagamento de despesas contratadas em anos anteriores.

O crescimento do volume de restos a pagar indica as dificuldades que o governo vem tendo para concretizar seus planos de investimento. Dos R$ 16,71 bilhões inscritos até dia 15, a maior parte, R$ 14,11 bilhões aproximadamente, eram de restos a pagar não processados. Isso significa que as obras ou bens adquiridos com esses recursos ainda não tinham sido entregues no fim de 2006. A diferença refere-se aos restos a pagar processados, ou seja, cujo pagamento estava pendente por outro motivo, que não a falta de entrega da obra ou bem. Muitas vezes, mesmo da liquidação, fase em que é aferida essa entrega, o fornecedor pode demorar a receber porque não não satisfez exigências documentais, como, por exemplo, certidões negativas de débito com a Receita Federal e com a Previdência Social.

Por terem os maiores orçamentos de investimento, os ministérios dos Transportes, Cidades e Saúde são os que mais têm restos a pagar.

Uma pequena parcela dos restos relativos a investimento inscritos nos primeiros dias do ano foi quitada logo em seguida. Tanto que, descontados esses, sobram R$ 16,45 bilhões aproximadamente.