Título: UE ameaça restringir entrada de aço chinês
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 17/01/2007, Brasil, p. A8

A Europa ameaça restringir a entrada dos produtos siderúrgicos baratos da China, refletindo a crescente inquietação de produtores de aço em torno do mundo com a expansão das exportações chinesas. A indústria siderúrgica brasileira, que exportou US$ 6,4 bilhões no ano passado, teme perder fatias de mercados para os chineses.

A Eurofer, que representa a indústria siderúrgica da Europa, prepara demanda de ação anti-dumping contra Pequim, na tentativa de frear a invasão dos produtos baratos chineses. A diferença de preço entre o aço europeu e o chinês é de US$ 200 por tonelada, segundo Gordon Moffat, diretor-geral da Eurofer.

Moffat disse ao Valor que a situação na Europa está ficando insustentável diante da velocidade com que a China aumenta sua capacidade e toma mercados. As importações européias em nove meses de 2006 alcançaram 3,8 milhões de toneladas procedentes da China, mais de três vezes o volume de 1,2 milhão importado no mesmo período de 2005. Em alguns setores da indústria, 405 das importações européias de aço vêm da China, sempre a baixo preço. "Simplesmente não dá para suportar essa expansão", disse.

A China foi grande importadora de aço até 2003. Desde então, aumentou brutalmente a capacidade e se tornou o maior exportador global. Segundo os europeus, Pequim aumenta em 80 milhões sua capacidade de produção a cada ano, empurrando seu excedente para algo ainda maior.

"Essa cifra é oficial, porque na verdade muito mais é produzido de maneira ilegal sem controle do governo central", afirma. "Significa que o excedente na China é de centenas e não de centena de milhões de toneladas de aço."

A China aumenta sua capacidade anual num volume equivalente a toda a produção de aço da Alemanha e quase metade da produção européia. Os 25 países membros da UE têm capacidade de 230 milhões de toneladas, mas só produzem 190 milhões de toneladas por ano. "Muita gente simplesmente não entende o perigo que vem da China", acrescenta Moffat, visivelmente inquieto. "Para evitar desemprego e turbulências sociais, o governo não ousa fechar fábricas, como planejado, e o desequilíbrio do mercado mundial torna-se evidente."

Para Moffat, só resta pedir à Comissão Européia ações antidumping contra os preços baixos, mas também ação anti-subsídio, porque toda a produção chinesa receberia ajuda do governo central. "Se os chineses reduzirem sua exportação para algo razoável, então vamos rever nossa demanda."

As informações no mercado são de que os Estados Unidos também pressionam Pequim para restringir suas vendas para o mercado americano. A China tornou-se o principal exportador de aço para os Estados Unidos, desbancando o Canadá, cujos produtos entram livres de tarifa, como membro do Nafta (o acordo comercial entre Estados Unidos, Canadá e México).

As reações começam a aumentar, pois a situação do mercado global de aço, que era forte até agora, começa a mudar. "O Brasil tem tarifas para se proteger, mas ainda assim também corre o risco chinês", diz Moffat.

Essa situação deflagrou o sinal de alarme na indústria siderúrgica brasileira. Rudolf Buhler, diretor-técnico do Instituto Brasileiro de Siderurgia, entidade que representa as empresas brasileiras, vê riscos para o país com restrições aos chineses na União Européia e nos Estados Unidos. Se não puderem exportar para os principais mercados, os chineses vão buscar novos mercados. Ou seja, haverá desvio de comércio e concorrência mais acirrada para o Brasil.

"Estamos bastante preocupados com eventuais acordos de restrição, porque aí a pressão sobre nós será maior", diz Buehler. As indústria brasileira já começou a perder fatias de mercado para os chineses no México, Peru e Chile, mas não ainda na costa atlântica da América Latina. Só as vendas de Pequim para o México multiplicaram, pulando de 85 mil toneladas em 2005 para 508 mil toneladas no ano passado.

O Brasil exportou 12,1 milhões de toneladas no ano passado, dos quais 40% corresponderam a semi-acabados (venda direta para outras usinas). O país também importou mais da China: passou de US$ 27,3 milhões em 2005 (28,3 mil toneladas) para US$ 92,7 milhões (113,2 mil toneladas) no ano passado. O consumo brasileiro é de 18,6 milhões de toneladas por ano. Em 2006, as importações representaram 10% do total consumido, por causa da paralisação de forno na Companhia Siderúrgica Nacional. Normalmente, porém, as importações totais representam cerca de 5% do consumo.