Título: Caixa Econômica vai securitizar R$ 2 bi
Autor: Ribeiro, Alex
Fonte: Valor Econômico, 14/05/2007, Finanças, p. C12

A Caixa Econômica Federal vai securitizar R$ 2 bilhões em créditos imobiliários, na maior captação para financiar empréstimos à habitação desde a criação dos certificados de recebíveis imobiliários (CRIs), em 1997. A operação é um passo importante na migração de um sistema de crédito direcionado, em que os financiamentos são feitos com recursos da poupança, para um modelo de livre mercado.

Os detalhes ainda estão sendo definidos, mas a tendência é que primeiro seja feita uma operação de R$ 1 bilhão. No horizonte de 12 meses, a intenção e colocar R$ 2 bilhões. A Caixa tem um milhão de contratos padronizados que, em tese, podem ser securitizados, num volume de R$ 6,7 bilhões. Estão sendo selecionados os de melhor qualidade, com reduzida inadimplência e garantia por alienação fiduciária. A tendência é que a emissão seja oferecida não só para grandes investidores, mas também para o varejo (hoje, no mercado, a maioria maciça dos CRIs é com valores acima de R$ 300 mil), aproveitando a estrutura de distribuição do banco.

"Hoje, temos a maior carteira de crédito imobiliário com recursos da caderneta", disse a presidente da Caixa, Maria Fernanda Ramos Coelho. "Querermos ter também a liderança no mercado de securitização imobiliária."

Mais do que apenas vender o produto, a operação é vista na Caixa como uma maneira de fomentar o mercado de securitização. Por isso o banco vai participar de todo o processo, desde a originação dos créditos imobiliários até o acompanhamento do mercado secundário. É diferente de três pequenas operações de securitização feitas pela Caixa entre 1999 e 2002, com valor de R$ 223 milhões, em que os créditos foram simplesmente cedidos pela Companhia Brasileira de Securitização (Cibrasec), que cuidou de todo o trabalho.

Originalmente, os CRIs foram criados como o instrumento de captação de recursos para o Sistema Financeiro Imobiliário (SFI), inspirado no modelo americano. A idéia é que os bancos fizessem financiamentos imobiliários para, em seguida, vender essas carteiras de crédito ao público. Os investidores comprariam títulos com o rendimento atrelados aos recebimentos das parcelas dos financiamentos imobiliário. Com a venda de suas carteiras, os bancos levantam mais recursos para novos financiamentos imobiliários - que, por sua vez, podem ser novamente securitizados. O sistema foi adotado com sucesso em países como Espanha, Holanda e Inglaterra, nos quais o mercado de financiamentos securitizados supera 50% do PIB. No Brasil, não decolou nos primeiros anos porque não havia demanda - os juros altos e a falta de mercado de renda fixa de longo prazo afugentavam investidores.

Mais recentemente, com a queda dos juros básicos, os CRIs começaram a ganhar fôlego, mas apenas porque foram usados em operações corporativas. Empresas lançaram mão do instrumento para construir galpões industriais, terminais logísticos e "shopping centers". Neste ano, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) aprovou a emissão de R$ 374 milhões em CRIs, até a última sexta; em 2006, foi R$ 1,071 bilhão. Estimativas indicam que 70% das emissões dos CRIs são corporativas. O uso para alavancar a habitação foi minoria.

Um dos problemas é que o SFI sofre concorrência do antigo sistema de financiamento com recursos da caderneta de poupança, o Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE). Pelas regras em vigor, os bancos têm que destinar 65% dos recursos captados em caderneta de poupança ao financiamento imobiliário, com juros máximos de 12% ao ano. Como a maioria dos bancos privados não cumpre a aplicação mínima dos recursos da caderneta, preferem fazer suas novas operações dentro do SBPE a usar a securitização.

A Caixa é uma exceção porque seus financiamentos imobiliários superam o que estaria obrigada a fazer. Segundo dados do Banco Central, aplicava R$ 40,4 bilhões em fevereiro, 10% acima dos R$ 36,5 bilhões exigidos. A entrada na securitização de recebíveis não é a escolha da Caixa entre o velho sistema de financiamento e o novo. A expectativa é que, durante algum tempo, os sistemas vão conviver juntos, assim como os empréstimos habitacionais com recursos do FGTS. Mas, com a queda dos juros, a tendência é a securitização se tornar cada vez mais central.

"Já começa aqui e ali a discussão se o direcionamento de poupança vai existir", diz o vice-presidente de Desenvolvimento Urbano da Caixa, Jorge Hereda. Há dois meses, o BC mudou a fórmula de cálculo da taxa referencial (TR), o índice da poupança, que estava muito alto para os juros vigentes. A viabilidade da taxa de 6% ao ano garantida pela caderneta deverá ser o próximo ponto da agenda. O Tesouro vende papéis de longo prazo que pagam 6,2% reais ao ano.