Título: Membros do G-20 temem excesso de protecionismo de países convidados
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 08/09/2006, Brasil, p. A2

A ampliação da reunião do G-20 - com a participação de outros grupos de países em desenvolvimento -, neste fim de semana, no Rio, causa "desconforto" em alguns países-membros. Além disso, o grupo chega sem um projeto de declaração ministerial previamente aprovado. Certas delegações, como Argentina e Uruguai, alegaram que a declaração final do encontro não será mais só do G-20, mas em conjunto inclusive com o G-33, grupo especialmente protecionista na área agrícola, podendo dar uma sinalização errada.

Outra reclamação é que o Brasil teria decidido "sem consultas" que a ministerial propriamente do G-20 só vai durar uma hora, ao invés dos dois dias previstos para discussão das suas posições. Depois, na série de encontros com os Estados Unidos, União Européia e Japão, o G-20 estará acompanhado de coordenadores de outros grupos.

O embaixador brasileiro junto a Organização Mundial do Comércio (OMC), Clodoaldo Hugueney, contudo, disse não ter ouvido reclamações e que todos foram consultados. "Todo mundo está contente", afirmou, insistindo que no Rio o objetivo é uma grande manifestação de apoio à retomada rápida da Rodada Doha, na Organização Mundial do Comércio (OMC).

"Vamos lançar uma declaração política e quanto mais países em desenvolvimento estiverem juntos, melhor", disse Hugueney, que coordenou as reuniões preparatórias do G-20. "Além disso, as posições técnicas do G-20 estão no centro da Rodada".

Os mais reticentes à ampliação da reunião do Rio reconhecem a importância política do agrupamento em desenvolvimento, incluindo G-33, África, Caribe e Pacífico (ACP), América Central (Caricom) e o grupo africano em defesa do algodão. Ele vêem, no entanto, risco de "diluição" e de "mensagem tomada erradamente", estimando que uma declaração com o G-33 "é complicada". Lembram que há convergência no combate aos subsídios, mas diferenças substanciais sobre o corte de tarifas agrícolas, sobretudo com o G-33.

Para André Nassar, diretor-executivo do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone), o G-20 está dividido pelo tema da adoção de salvaguarda e produtos especiais para o setor agrícola. Um grupo de países, liderado pela Índia, quer maior proteção para a agricultura. Já o grupo dos exportadores agrícolas, capitaneados por Argentina e Uruguai, é contra essa proposta.

Está claro que não se discutirão posições no Rio. Mas o "desconforto" reflete a tensão dentro do G-20 quando se trata de acesso ao mercado. O grupo tem exportadores como Brasil, Argentina, Uruguai, Tailândia e Chile. Mas nove de seus membros fazem igualmente parte do G-33, incluindo China, Índia e Indonésia. O G-33 quer ter o poder de frear importações agrícolas através de salvaguardas e sobretaxas especiais, se o volume de importação de um produto aumentar mais de 5%, ou se o preço declinar quando comparado à média de preço de três anos anteriores.

No Rio, o diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, poderá colocar o dedo na ferida do G-20. Deverá destacar a responsabilidade de países como Brasil, Índia e Indonésia em criar condições para a retomada da Rodada Doha - o que significa efetivas concessões industriais, do lado brasileiro, e agrícolas também do lado indiano, ao invés destes só cobrarem dos EUA e UE.

Na ultima reunião preparatória do G-20, em Genebra, a Argentina quis introduzir na declaração do Rio a mensagem de que concessões na área industrial não poderão ser superiores ao que for obtido na área agrícola. Mas a maioria preferiu não fazer referências à negociação industrial, lembrando que o G-20 é para a agricultura.

Diante das divergências, segundo participantes, o embaixador Hugueney propôs negociar, no Rio, uma declaração política curta, tirando menções técnicas que poderiam alimentar divergências. Os países em desenvolvimento defenderão a "centralidade da agricultura e do desenvolvimento na Rodada Doha, e a retomada o mais rápido possível das negociações". (Colaboraram Francisco Góes e Raquel Landim)