Título: OIT critica empresa que discrimina estilo de vida
Autor: Galvão, Arnaldo
Fonte: Valor Econômico, 11/05/2007, Internacional, p. A11

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) começa a se preocupar com novas formas de discriminação que vêm prejudicando pessoas predispostas a algumas doenças, obesos e fumantes. Apesar de reconhecer que é positivo o incentivo dos empregadores aos que decidem parar de fumar ou desejam ter vida mais saudável, a OIT alerta que é discriminação negar ou tirar emprego de pessoas pelo estilo de vida considerado incompatível ou que vai causar maiores custos pelo afastamento do trabalho.

Esses novos tipos de discriminação somam-se aos que já prejudicam deficientes físicos, portadores do vírus HIV, homossexuais, sindicalistas e os que têm idade indesejada (muito jovens ou com idade desprezada, geralmente acima de 35 anos). Na forma mais tradicional de discriminação no mercado de trabalho brasileiro - contra mulheres e negros - o quadro verificado em 2005 continua insatisfatório, mas teve ligeira melhora. Essas são algumas das conclusões do relatório global "Igualdade no Trabalho: Enfrentando os Desafios", preparado pela OIT.

O rápido desenvolvimento da genética permite que empregadores discriminem trabalhadores cujo perfil hereditário indique a existência ou a predisposição para alguma doença. Uma jovem professora, em 2004, teve de ir à Justiça na Alemanha para garantir sua nomeação como funcionária pública. Ela tinha se recusado a fazer teste genético após declarar que, apesar de ter saúde excelente, tinha histórico familiar da doença de Huntington.

Em 2001, um empregado da empresa ferroviária americana Burlington Northern Santa Fe Railways teve de pedir uma ordem judicial para manter seu emprego. Ele foi submetido a um exame de sangue que detectou um marcador genético relativo à síndrome do túnel carpiano. Em 2000, três cidadãos de Hong Kong obtiveram indenização pela recusa de emprego porque seus pais eram esquizofrênicos.

Alguns países já adotaram normas que proíbem a discriminação genética: Dinamarca, Finlândia, França e Suécia. Outros aprovaram leis que condicionam o uso de material genético à autorização do trabalhador: Áustria, Grécia, Itália, Luxemburgo e Holanda. Em 2005 os EUA aprovaram lei que proíbe o uso abusivo de informação genética por empresas de seguro saúde e empregadores em geral.

Além da discriminação pela predisposição genética, fumantes e obesos vêm sendo prejudicados, segundo alerta a OIT. Em alguns casos extremos, o estilo de vida inadequado pode significar discriminação contra quem não conduz seu carro de maneira segura. O desafio é estabelecer uma linha divisória entre liberdade individual e comportamento que submete colegas de trabalho a riscos.

Nos EUA, muitas empresas evitam contratar fumantes ou elevar o valor da contribuição do seguro de saúde. A situação fez com que 30 Estados americanos aprovarem leis contra a discriminação laboral dos fumantes. Mas 11 Estados permitem diferenças nas contribuições de seguro dessas pessoas.

No mundo, são comuns as restrições contra o fumo. A Organização Mundial de Saúde (OMS) anunciou em dezembro de 2005 que deixaria de contratar fumantes que se negassem a abandonar o cigarro. Mas, em agosto de 2006, a Comissão de Direitos Humanos da Nova Zelândia declarou que negar emprego a fumantes era ilícito.

Para a OIT, a decisões sobre emprego devem ser baseadas na capacidade da pessoa realizar um trabalho. Não contratar fumantes ou obesos cujo comportamento afeta o cumprimento das tarefas é ato justificado. Também é aceita a recusa se essas pessoas prejudicam colegas no ambiente de trabalho. Mas é considerada discriminação e intromissão indevida na vida privada das pessoas negar trabalho ou despedir quem é obeso ou fuma fora do horário de trabalho.

A diretora do escritório brasileiro da OIT, Laís Abramo, comenta que, no país, o tipo mais freqüente de discriminação ligada ao trabalho é a que prejudica mulheres e negros. O emprego doméstico é revelador. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), realizada pelo IBGE em 2005, verificou que o Brasil tem cerca de 6,6 milhões de trabalhadores domésticos e apenas 26,2% têm carteira assinada. As mulheres são ampla maioria nesse segmento (93,4%) e 55% das domésticas são negras.

A remuneração das domésticas é sempre reduzida e próxima do salário mínimo. Nas regiões metropolitanas, em 2003 e 2004, o salário médio era de R$ 222 em Salvador e de R$ 383 em São Paulo. "Questões de gênero e raça não afetam minorias no Brasil, mas ampla maioria da sociedade. No país, 70,5% do mercado de trabalho é formado por mulheres e negros", adverte Laís.

O segundo relatório global da OIT sobre discriminação também mostra que 52% das pessoas portadoras de deficiência estão inativas. Apesar disso, a Lei de Cotas vem produzindo resultados. De 2000 a 2005, o número de deficientes empregados saltou de 601 para 36 mil. "A discriminação representa um alto custo para a sociedade e para as empresas porque desperdiça talentos e recursos. Além disso, debilita a coesão social e a democracia porque aumenta o numero de excluídos", lamenta Laís.

O estudo da OIT mostra que, de 1995 a 2005, as mulheres vêm aumentando sua participação num ritmo médio de 2,1% ao ano, mais intenso que o dos homens. Nesses dez anos, a ocupação das mulheres aumentou 30,2%, sendo que o segmento das mulheres negras saltou, nesse período, 40,8%. No grupo da população negra, a ocupação elevou-se em 33,1%, mais que o dobro do ritmo da população branca: 15,1%. Isso ocorreu, segundo a análise, pelo baixo crescimento do grupo dos homens brancos: 10%.

Apesar do progresso, a OIT verifica que a inserção das mulheres no mercado de trabalho permanece segmentada, com ênfase nos serviços sociais e domésticos (17% da ocupação feminina).

A renda das mulheres e dos negros continua muito menor que a dos homens brancos, mesmo com a diminuição da diferença nos últimos anos. A mediana dos rendimentos mostra que as mulheres negras recebem cerca de 50% da renda dos homens brancos. Mas de 1995 a 2005, o crescimento da renda das mulheres negras foi de 41,4%; os homens brancos perderam 11,6%. Homens negros (4,7%) e mulheres brancas (6%) também tiveram aumento de renda.

Para a OIT, esse movimento positivo para negros e mulheres se deveu à recuperação do salário mínimo, que subiu 97% entre 1995 e 2005. Contribuíram ainda o crescimento do emprego formal e a maior escolarização das mulheres.

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