Título: Etanol de trigo em alta na França
Autor: Moreira, Assis
Fonte: Valor Econômico, 15/05/2007, Agronegócios, p. B12

A produção de etanol a partir do trigo vai explodir na França. Quatro das seis grandes usinas que entrarão em operação no país até o fim de 2008, que envolvem investimentos totais da ordem de 1 bilhão de euros e representarão 80% da produção francesa do combustível, utilizarão o cereal como matéria-prima. Uma unidade usará beterraba e a outra rodará com milho.

A aceleração da produção de etanol no país ilustra a determinação européia de responder aos compromissos do Protocolo de Kyoto para limitar a emissão de gases de efeito estufa. O combustível deverá representar 10% do consumo total de carburantes no velho continente até 2015. Em 2007, a participação chegará a 3,5%. Na França, a produção de etanol dobrou entre 2006 e 2007, para 560 mil toneladas, a partir de 20 pequenas usinas. Com os novos projetos, a oferta dobrará novamente até 2010 para 1,1 milhão de toneladas.

Atualmente, o trigo alimenta 35% do etanol francês, e esta participação deverá aumentar para 50% em três anos. Em contrapartida, a fatia da beterraba, que hoje é a matéria-primas de 70% do combustível do país, cairá para 35%. O milho responderá pelos 15% restantes..

Nicolas Rialland, da Confederação dos Produtores de Beterraba, sediada em Paris, explica que produzir etanol a partir de cereais é mais barato. Neste caso, explica, pesa o processo industrial, e não só o custo da matéria-prima. A tonelada de beterraba varia no mercado de 16 euros a 24 euros. Já o mesmo volume de trigo sai por cerca de 120 euros , conforme um acordo firmada entre produtores e indústrias que já dura anos. Mas, segundo Rialland, não há diferença no custo final.

Ele informa que uma tonelada de trigo permite a produção de cerca de 350 litros de etanol, enquanto uma tonelada de milho resulta em 370 litros e igual quantidade de beterraba faz 100 litros. Sendo assim, os franceses constataram que produzir etanol com beterraba deixa de ser viável economicamente se não houver, no mesmo processo, produção de açúcar. "Não vale a pena ter uma usina com um processo industrial complicado unicamente para etanol de beterraba", diz Rialland.

Ocorre que a União Européia está cortando subsídios ao açúcar para reduzir a produção em 6 milhões de toneladas, no rastro de uma reforma impulsionada pela vitória do Brasil contra a política européia na Organização Mundial do Comércio (OMC). Já a produção de etanol a partir de trigo e milho é mais simples e leve, e estimula a diversificação de grandes grupos.

É o caso do Tereos, terceiro maior grupo de açúcar do mundo, conhecido por sua marca Béghin-Say. Na França, o conglomerado iniciará a produção de uma usina com capacidade para 240 mil toneladas de etanol a partir de trigo. Já o Soufflet, maior player mundial de malte para cerveja, começará a construção de uma unidade no país para produzir anualmente 300 mil toneladas etanol a partir de 1,1 milhão de toneladas de trigo. O aporte previsto no projeto chega a 300 milhões de euros.

No contexto da "disputa" entre a produção de energia e alimentos a partir de produtos agrícolas, as associações européias argumentam que em 2010 cerca de 350 mil hectares de cereais (4% da área total) e 60 mil hectares de beterraba (20% do total), serão destinados à fabricação de etanol. Na Europa, o produtor recebe 45 euros por hectare de subsídio destinado ao etanol. Até porque cálculos internacionais indicam que o custo do etanol de cana - especialidade brasileira - chega a ser mais de três vezes menor que o de beterraba.

Hervé Lastum, diretor da Federação de Produtores de Trigo da França, diz que uma das vantagens da cultura em relação ao milho é o preço atualmente 15% mais baixo. Não que o trigo esteja barato, ressalva ele, mas haverá produção suficiente apesar de o país exportar cerca de 8 milhões de toneladas para outros países da UE e 7 milhões fora do mercado comunitário. Os franceses são prudentes em relação ao custo real de seu etanol, mas reconhecem que ele é caro.

Por isso, acreditam as mesmas fontes consultadas pelo Valor, o etanol de trigo só será rentável para os investidores com algumas condições específicas e somadas - se as subvenções e exonerações forem mantidas, se o preço do cereal baixar, se o etanol brasileiro for proibido de entrar na Europa e se o preço do petróleo dobrar.

A diferença entre o custo de fabricação do etanol francês e o preço de venda ao consumidor pode chegar a 30 centavos de euro. Hervé Lastum, da Federação dos Produtores de Trigo, espera que o novo governo Sarkozy confirme a vantagem fiscal que foi oferecida até agora, para estimular o consumidor a utilizar mais o etanol.

Apesar da produção crescente, o biocarburante tem dificuldades de venda na França. O governo lançou um plano com petroleiras, em novembro do ano passado, para equipar 500 postos de gasolina também com etanol neste ano, e outros mil em 2008. Atualmente, porém, só há 25 postos vendendo etanol no país. Isso apesar de lançamento previsto de automóveis flex, começando com um Mégane no mês que vem, com um Peugeot 307 em setembro e depois de com um Citroen C4.