Título: Reprovações acima da média
Autor: Oliveira, Noelle
Fonte: Correio Braziliense, 27/12/2010, Cidades, p. 21

Segundo estudo do MEC, o DF ocupa o quarto lugar entre as unidades da Federação em que os alunos mais repetem de ano. Falta de infraestrutura das escolas e baixa qualidade da formação dos docentes são apontadas como causas do problema

Todo fim de ano a história se repete. Os professores de reforço escolar enchem as agendas enquanto os supletivos preparam-se para muito trabalho. São alunos do ensino fundamental e do ensino médio em busca de aprovação depois de esgotadas as possibilidades oferecidas pela escola. Levando em consideração os estudantes não aprovados nas classes de aceleração e também o alto índice de abandono escolar, a Secretaria de Educação trabalha com uma taxa de 29% de repetência no ensino médio e de 22% no fundamental, em 2009. De acordo com os dados divulgados pela pasta, 12,15% dos alunos do 1º ao 9º ano reprovaram em 2009. No ensino médio, por sua vez, o índice foi de 18,58%. Os números ultrapassam a média registrada no país. Nacionalmente, as taxas mostram 11,1% de reprovação no ensino fundamental, e 12, 6 % no médio, de acordo com dados do Ministério da Educação (MEC).

Levando-se em consideração os dados do MEC, os índices brasilienses de reprovação aparecem um pouco mais baixos ¿ 16,1% para o ensino médio e 9,7% para o fundamental. Mesmo assim, em termos comparativos, o DF aparece como a quarta unidade da Federação em reprovação, atrás apenas do Rio Grande do Sul, do Rio de Janeiro e de Mato Grosso do Sul. ¿O índice de reprovação hoje no DF assusta. O dinheiro que é empregado para que um aluno seja reprovado passa a ser um gasto, deixa de ser um investimento¿, considera o atual chefe da pasta de Educação, Sinval Lucas.

De acordo com a professora da faculdade de Educação da Universidade de Brasília (UnB) Inês Maria Marquez, a formação dos professores contribui para o índice de reprovação tão significativo no ensino médio. ¿Temos um estrangulamento muito grande na quantidade de professores para trabalhar, principalmente, na área de exatas. O número de licenciados formados hoje não dá conta. Um total de 70% desse grupo vem de faculdades particulares, uma parte dessas instituições são sérias, mas esse ainda é hoje o nosso maior desafio¿, considera.

Para o secretário de Educação, o alto índice de reprovação representa uma falha do atual modelo de ensino, que precisa ser revisto. ¿Penso que o papel da escola não é reprovar. Ela foi criada para ensinar. A reprovação parece uma forma de transferirmos para o aluno as falhas do sistema educacional¿, avalia. Como forma de reduzir o índice, o dirigente da pasta promete deixar algumas sugestões para os próximos gestores, que assumem o GDF em 1º de janeiro. ¿A nossa equipe está deixando algumas ideias para 2011. O sistema continuaria anual, por exemplo, mas o aluno poderia se matricular no mês de julho, e o ano letivo dele terminaria em julho do outro ano. Isso ocorreria em escolas polo de cada cidade. O que também pode diminuir a reprovação é adotar um ensino médio em regime semestral¿, sugere Sinval.

Os problemas das instalações físicas das escolas do DF também são apontados pela professora da UnB como uma das causas para os resultados pífios de alguns alunos. ¿A maior parte das nossas escolas de ensino médio não tem laboratórios. Foram colocados computadores em salas de aula que não têm, porém, qualquer condição de uso. Os nossos alunos demandam atividades práticas e isso hoje não pode ser oferecido¿, avalia. A especialista destaca que além da reforma das instituições é importante uma conscientização do corpo docente das escolas. ¿Não é só construir mais escolas, mas equipar as que existem e cuidar para que professores e demais funcionários tenham um olhar de compromisso com a melhoria do seu trabalho¿, diz a educadora.

Tudo de novo Enquanto a maioria dos colegas de Matheus Cordeiro, 18 anos, já estava viajando, o jovem, que reprovou o terceiro ano do ensino médio, ainda fazia provas em um supletivo da cidade na última quinta-feira. Estudante do Colégio Militar Dom Pedro II, ele não conseguiu a pontuação necessária para passar de ano em matemática, história e português. Aprovado para o curso de ciências da computação em uma universidade particular da cidade, ele agora busca a aprovação nas disciplinas para poder cursar o nível superior. ¿Tenho três meses para estudar e é isso que eu vou fazer. Sei que não é o ideal. Devia ter me dedicado mais, mas agora não posso perder tempo¿, avalia. Essa não é a primeira vez que Matheus se vê nessa situação. Ele também reprovou o primeiro ano do ensino médio. ¿Só que na época minha mãe fez eu cursar o ano todo novamente. O pior nem é estudar o mesmo conteúdo, já que a matéria se torna mais fácil quando você vê pela segunda vez, mas ver os colegas todos na sua frente¿, revela.

Os dados da Secretaria de Educação mostram que a cidade com o maior índice de reprovação no ensino fundamental é Sobradinho, com uma taxa de 14,21%. Já no ensino médio, o Paranoá ocupa a primeira colocação: 23,36% dos alunos repetem de ano. Os menores índices, por sua vez, estão, respectivamente, em Brazlândia, com 9,91%, e em Planaltina, que registra 13,14%. ¿Apesar das diferenças pontuais, a maior dificuldade dos alunos é com a área de exatas. Outra disciplina que costuma dar trabalho para muitos é português¿, explica a professora de reforço escolar Anita de Castro.

A educadora Marildes Esmeralda, que leciona há 34 anos, destaca que um dos motivos de o reforço escolar não ser eficiente para muitos estudantes é o prazo apertado para trabalhar o conteúdo com os jovens. ¿A partir de outubro, a procura por ajuda profissional para garantir a aprovação aumenta. Não adianta buscar o serviço na época das provas finais, como se fôssemos fazer um milagre¿, explica. Para ela, os índices de reprovação estão vinculados principalmente à falta de interesse, tanto dos alunos quantos dos pais, bem como ao baixo nível pedagógico de alguns estabelecimentos.

Segundo as taxas apresentadas pelo MEC, o índice de aprovação nas escolas privadas do DF que oferecem o ensino médio é de 91,1%. No ensino fundamental, a porcentagem de crianças e de adolescentes que passam de ano é ainda maior, 96,7%. ¿Muitos pais de alunos das escolares particulares fazem a opção por um acompanhamento escolar durante todo o ano. Aí, o aproveitamento é bem melhor. Mas é preciso ter condições financeira para isso¿, explica a educadora. O preço da hora de uma aula de reforço pode variar de R$ 20 a R$ 50.

R$ 4,6 bilhões No orçamento de 2011, estão previstos R$ 2,9 bilhões para investimentos em Educação. Somando ao que deve ser repassado pelo Fundo Constitucional, o valor chegará a R$ 4,6 bilhões. Atualmente, o DF tem 520 mil estudantes distribuídos em 645 escolas.

Ameaçadas O Distrito Federal tem hoje 12 escolas condenadas pelo Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT), e outras cinco unidades que respondem a ações civis públicas. As instituições precisam de reformas urgentes, muitas delas na área de segurança, prometidas desde o início do último governo. Para completar a situação caótica, a unidade da Federação tem uma previsão de 79 salas a menos que o necessário para atender todos os alunos do DF em 2011.

PARTICIPAÇÃO POPULAR » O futuro governador do DF contará, somente em 2011, com um orçamento de R$ 5,2 bilhões para destinar à Educação. Com a verba, além de solucionar problemas principalmente estruturais, Agnelo Queiroz (PT), que assume no próximo dia 1º, terá que atender às reivindicações de 40,7 mil professores, entre os que estão na ativa e os aposentados. O petista também tem afirmado que dará autonomia para cada escola exercer suas funções, com planejamento, elaboração e execução de metas. Ele defende, ainda, eleições para o preenchimento de todos os cargos de direção e do conselho escolar na rede pública.

Os números

Ensino médio * Matriculados : 77.070 Aprovados sem dependência: 39.740 ¿ 54,75% Aprovados com dependência: 11.311 ¿ 15,58% Reprovados: 13.487 ¿ 18,58% Abandono: 8.040 ¿ 11,08%

Ensino fundamental * Matriculados : 302.033 Aprovados sem dependência: 241.914 ¿ 80,22% Aprovados com dependência: 17.204 ¿ 5,71% Reprovados: 36.642 ¿ 12,15% Abandono: 5.779 ¿ 1,92%

* Dados relativos a 2009

Desafios brasileiros

Lançado neste mês, um estudo do Banco Mundial avaliou os resultados alcançados pelo Brasil nos últimos anos em educação. De acordo com o documento, o investimento no setor não vem ¿produzindo os resultados esperados¿. Os dados mais recentes, de 2009, mostram que o país gasta hoje 5% do Produto Interno Bruto (PIB) na área, patamar que, segundo o relatório, já é superior ao verificado nos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). O Brasil gasta mais do que o México, o Chile, a Indonésia e a Índia, países que têm perfil demográfico semelhante ao brasileiro.

O relatório destaca ainda que as altas taxas de repetência permanecem, ¿apesar de pesquisas indicarem que a repetição é uma estratégia ineficaz para aumentar a aprendizagem. Quanto ao investimento nos alunos, o estudo mostra que o gasto com um aluno do ensino superior é, em média, seis vezes mais alto do que com o estudante da educação básica. (NO)

--------------------------------------------------------------------------------