Título: Para centrais, governo quer proibir greve de servidores
Autor: Salgado, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 16/05/2007, Brasil, p. A4

As centrais sindicais brasileiras acreditam que o anteprojeto que propõe a regulamentação das greves no setor público é, na verdade, um jeito de o governo federal proibir de vez as paralisações dos servidores públicos. No entanto, os sindicalistas dizem estar dispostos a discutir uma regulação das greves nesse ramo, mas querem, primeiro, normalizar o direito de negociação.

"Há um descompasso no governo, estão fazendo o debate em ordem contrária", critica Artur Henrique da Silva Santos, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT). Ele diz que a idéia da central é começar pelo debate para garantir que a negociação coletiva aconteça no setor público. E, a partir do momento em que os servidores, sejam eles municipais, estaduais ou federais, passem a ter o direito a uma data-base e a uma mesa de negociação, que seja respeitada pelo Executivo e Judiciário, aí sim as centrais estarão dispostas a discutir sobre as greves.

Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, presidente da Força Sindical, diz que as greves no setor público são necessárias justamente porque não há negociação. "Ela acaba sendo um instrumento para forçar a negociação", complementa o presidente da CUT.

Um dos pontos mais criticados pelos líderes sindicais é a necessidade de aprovação da greve por 2/3 da categoria reunida em assembléia. Artur Henrique considera a exigência totalmente descabida. "Então, no caso dos professores do Estado de São Paulo, que têm 150 mil filiados, seria preciso reunir 100 mil trabalhadores."

As reclamações recaem diretamente sobre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "Nem o Lula, quando era sindicalista, conseguia reunir 2/3 dos metalúrgicos", afirma Paulinho. Ele diz que na década de 80, quando o presidente comandou uma greve de 41 dias em São Bernardo do Campo, não reuniu mais do que 20 mil pessoas no estádio da Vila Euclides. "E a categoria tinha 200 mil trabalhadores."

A exigência de que 40% dos servidores trabalhem durante a paralisação também é rejeitada. "Isso não significa nada. Se for assim, no caso de uma empresa de fornecimento de energia, podemos deixar 40% de funcionários só do setor administrativo trabalhando e todos aqueles que lidam diretamente com a luz em greve. E isso irá prejudicar muito a população", exemplifica Artur Henrique. Segundo ele, mesmo sem a regulamentação da greve no setor público, os servidores "jamais comprometeram serviços que pudessem causar danos irreparáveis à sociedade."

Após um 1º de Maio marcado por elogios ao governo federal, esse anteprojeto deixou as centrais um tanto contrariadas. Ainda mais porque, como noticiou o Valor ontem, o governo não pretende negociar o projeto com os sindicalistas. Porém, durante a entrevista coletiva concedida ontem, Lula disse que o governo está "pensando em mandar um projeto para o Congresso Nacional depois de discutirmos com as centrais sindicais, com os sindicatos de servidores públicos, apenas para estabelecer responsabilidades do direito de greve."

Lula disse que como hoje o servidor público faz greve e ainda recebe os dias parados, a paralisação passa a ser encarada como um período de férias pelos trabalhadores. Para ele, todos têm direito a fazer greve, mas "o que não é possível, e nenhum brasileiro pode aceitar, é alguém fazer 90 dias de greve e receber os dias parados, porque, aí, deixa de ser greve e passa a ser férias." Para ele, "um jeito de você decidir fazer greve com mais seriedade é você saber que não são férias, que você vai perder os dias em que você não trabalhou."

O presidente da CUT não deixa claro se é a favor do desconto dos dias parados, mas garante ser favorável a que esses dias sejam "objeto de negociação com o setor público." Mas, para isso, segundo ele, primeiro é preciso ter a garantia de que existirá negociação coletiva e que ela será respeitada.