Título: Cotação aquém de R$ 2 coloca em dúvida idéia da existência de piso
Autor: Ribeiro, Alex
Fonte: Valor Econômico, 16/05/2007, Finanças, p. C2

A queda da cotação do dólar para abaixo de R$ 2 desfaz mais uma vez um mito recorrente de que o Banco Central defende um nível mínimo para a taxa de câmbio. A autoridade monetária sustenta que não é capaz de determinar a taxa de câmbio por meio de suas intervenções. E argumenta que, mesmo que tivesse tal poder, não defenderia o câmbio. Isso significaria que sua atuação passaria a ter um segundo alvo, o que equivale a dizer que seu principal objetivo - o cumprimento da meta inflação - ficaria em segundo plano.

Nos últimos dias, o BC intensificou sua atuação nos mercados à vista e futuro de dólar, o que levou alguns operadores a acreditar que haveria uma preocupação com o patamar de R$ 2. Na verdade, a intensidade das intervenções foi proporcional à entrada de recursos nos dois mercados. As estatísticas mostram, por exemplo, grande coincidência entre intervenções no mercado futuro e aumento das posições de estrangeiros na BM&F.

O objetivo foi agir em um momento em que havia descompasso na liquidez, evitando que a taxa de câmbio fosse formada com poucos negócios. O presidente do BC, Henrique Meirelles, repetiu ontem que a autoridade monetária se reserva o direito de agir quando identificar problemas de liquidez. Esse princípio foi anunciado originalmente em 1999, na adoção do regime de câmbio flutuante, mas até então usado na outra direção - ou seja, nas depreciações.

Um outro princípio das atuações do BC é que não irá determinar a cotação do dólar. Ou seja, se o câmbio caminha para um novo ponto de equilíbrio, não fará nada para impedir. Os diretores do BC não fazem previsões sobre qual é a taxa de câmbio de equilíbrio. Mas vêm lembrando nos últimos dias que o risco-país caiu, os investimentos diretos se intensificaram (em um mês, as projeções de ingresso feita por analistas econômicos subiram de US$ 18 bilhões pera US$ 19,7 bilhões) e as perspectivas para a balança comercial melhoraram (sobem há duas semanas, superando US$ 40 bilhões). Ou seja, aumentou o apetite por ativos brasileiros, sejam financeiros ou físicos, como exportações

O BC não nega, porém, que parte da apreciação do câmbio se deve ao diferencial de juros internos e externos. Mas pondera que o diferencial de juros vem se reduzindo, e que, em tese, isso deveria agir na direção da depreciação cambial.

Outro argumento é que a arbitragem internacional de juros não é um problema fácil de resolver. Primeiro porque a política de juros está voltada à meta de inflação, e não teria sentido baixar a taxa básica para atrair menos capital. Segundo porque qualquer taxa de juros que seja superior ao 0,5% vigente no Japão já permite arbitragem. Os dois países mais atingidos por operações de "carry trade", em que investidores levantam dinheiro no Japão para aplicar em economias com taxa de juros mais elevadas, são a Austrália (juros de 6,25% ao ano) e a Nova Zelândia (7,75%).

Na visão do BC, o problema da valorização do câmbio pode ser atenuado com soluções setoriais - o que já está sendo feito por outras áreas do governo. As medidas podem ser mais abrangentes do que aumento de tarifas. Um exemplo citado é o dos Estados Unidos na década de 1980, onde os impactos sociais do aumento das importações foram combatidos com ampliação do seguro-desemprego e com investimentos em treinamento.