Título: Dólar fraco, real forte
Autor: Pavini, Angelo
Fonte: Valor Econômico, 16/05/2007, EU & Investimentos, p. D1

As previsões dos analistas feitas no fim de abril se confirmaram e o dólar caiu ontem para baixo do nível psicológico dos R$ 2,00, fechando a R$ 1,98. Como a bolsa já superou os 50 mil pontos, outro vaticínio dos analistas, falta agora apenas o milésimo gol do Romário para completarmos as grandes expectativas para este mês de maio.

Mais do que um novo nível da moeda americana - ou melhor, o retorno ao valor do início de 2001 -, a queda do dólar reforça a necessidade de o investidor avaliar suas estratégias de aplicação ou mesmo de consumo, alertam analistas. As viagens para o exterior, passagens, produtos importados e gastos com cartão internacional passam a ser mais vantajosos. Nos investimentos, o impacto direto será sobre os fundos cambiais - que até o dia 11 já acumulavam perda de 3,28% no ano -, sobre as aplicações no exterior, ouro e moeda em espécie. Indiretamente, a queda pode afetar ações de empresas exportadoras e beneficiar as que têm dívidas ou custos calculados na moeda americana.

Dólar baixo também reduz a pressão sobre índices de inflação, especialmente os IGPs da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e, com isso, papéis indexados e até os aluguéis, reajustados pela inflação, podem ter uma variação menor. Ao mesmo tempo, inflação mais baixa favorece os títulos prefixados com a expectativa de queda maior dos juros, avalia Antônio Madeira, da MCM Consultores.

"A situação é complicada para quem tem dólares na carteira, pois os fundamentos são a favor do real", afirma Madeira, citando a menor percepção de risco do Brasil, a melhora dos fundamentos da economia, as contas externas com superávits consecutivos para justifica a valorização do real. A não ser que haja uma mudança significativa no cenário - uma redução mais drástica dos juros internos, uma crise no exterior que reduza as exportações ou afete a confiança nos mercados emergentes - o dólar deve ficar próximo dos R$ 2,00 por um bom tempo, "independente de no curto prazo o Banco Central reduzir o juro em 0,5 ou 0,25 ponto percentual", diz.

O impacto na bolsa já não deve ser tão claro, acredita Madeira, lembrando que as empresas exportadoras de commodities podem compensar no preço internacional a perda com a valorização do real. Já em outros segmentos, como bens duráveis e semi-duráveis, o impacto pode ser maior, a menos que a empresa esteja conseguindo fazer ajustes ou subindo os preços lá fora, o que é difícil tendo em vista a concorrência asiática. "Mas no final vai depender de cada caso e cada empresa".

O investidor não deve, porém, sair agora vendendo todos seus dólares, alerta o administrador de investimentos Fábio Colombo. "A recomendação para quem tem um volume grande de recursos é sempre diversificar", afirma. Assim, é razoável ter uma parcela de 10% a 20% do portfólio em fundos cambiais, dólar, euro e ouro. "Olhando o cenário, a performance desses ativos deve ser ruim, mas servem de seguro para alguma crise nos EUA ou na China", diz.

Ele acha também arriscado dizer que é hora de comprar dólar, porque a moeda estaria barata. "Ouço esse argumento há três anos", diz. Nos últimos 36 meses, o dólar caiu 35,9%. Mas é razoável para quem for viajar daqui seis meses comprar um pouco de moeda para garantir o preço, ou mesmo para quem não tem nada de dólar diversificar um pouco, mesmo que depois a moeda caia mais. "Pode-se comprar um pouco a cada mês para diluir o risco", explica.

Apesar da queda, não dá para dizer que é hora de comprar dólar, afirma Luiz Eduardo Santini Mello, Diretor da Fator Corretora. "Só mesmo se o investidor tiver de se proteger", diz. Enquanto houver essa situação de liquidez fantástica no mundo, explica Mello, mesmo que ocorram algumas turbulências, não há o que justifique uma mudança de tendência. "O que segurava o dólar era o BC e agora o mercado vai testar outros níveis de preço", diz. Para ele, não adianta o BC derrubar os juros, pois ainda assim haveria a entrada de dólares das operações comerciais e dos investimentos em bolsa e outros ativos. "E esse é um fenômeno que está ocorrendo aqui e em todos os mercados emergentes", diz.

A queda abaixo dos R$ 2,00 só ratifica o bom momento que o mercado brasileiro vive, diz Alexandre Vitorino, superintendente de gestão da Votorantim Asset Management (VAM). "O apetite por ativos brasileiros está em alta", afirma ele, que trabalha com o dólar caindo até R$ 1,95 nas próximas semanas. "Isso reforça o otimismo com juros, bolsa de valores e títulos da dívida", diz.

Já Marco Melo, responsável pela área de análise da corretora Ágora, vê um impacto marginal do novo nível do dólar nas empresas e em suas ações. "Mas é uma oportunidade para as empresas brasileiras adquirirem ativos no exterior com um custo menor", afirma. O impacto nas exportadoras, avalia, pode ser compensado com aumentos de preços ou de volumes. "Uma exceção seria papel e celulose, mas as empresas desse setor fazem hedge e compensam a perda", diz.