Título: Sem meias palavras, Lula rejeitou um 3º mandato
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 18/05/2007, Opinião, p. A12

Em política, é chamado de "balão-de-ensaio" uma tese jogada no ar, normalmente no Congresso, onde prosperam os boatos, como se fosse uma articulação em andamento - e, portanto, algo possível de vingar, a depender da vontade e da força política do diretamente interessado no assunto. Se colar, colou. Se não colar, pode ter alguns efeitos benéficos para o seu autor ou autores, como, por exemplo, o de forçar alguém ou uma força política a tomar uma decisão; ou simplesmente o de atacar um adversário.

A tese de um terceiro mandato para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva começou na oposição. Foi formulada para associar a imagem de Lula ao vizinho Hugo Chávez, presidente da Venezuela, que não esconde a intenção de permanecer por muito tempo no poder. Acontece que, na base aliada, acabou encontrando alguma guarida. Por que não, se a possibilidade de uma segunda reeleição for instituída constitucionalmente? Aí o PT teria um candidato possivelmente ainda imbatível, em torno do qual as outras forças da coalizão se uniriam, sem disputa ou discussão. Se a tese não vingasse, ao menos poderia trazer o presidente Lula de volta ao partido no debate sobre 2010. Existe um conflito que já é uma realidade sobre a sucessão do presidente que mal iniciou seu segundo mandato: o PT articula desesperadamente um nome forte, mas petista, para 2010, enquanto Lula acena com a hipótese de apoiar um candidato não necessariamente do PT para sucedê-lo.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez o que devia, na entrevista coletiva concedida na terça-feira: furou o balão. E não poderia ter sido mais claro. "Sou contra e não serei candidato em 2010", afirmou. "Minha orientação para a base é que ninguém apresente qualquer projeto [instituindo a dupla reeleição], o que eu acho uma provocação à democracia brasileira". Foi além disso: acabou com os boatos de que, após esse mandato, tornaria a se candidatar nas eleições de 2014. "Eu não trabalho com a hipótese de voltar à Presidência da República (...). Depois que você chegou aqui [na Presidência], não tem nada mais alto, é o máximo. Então, você se recolhe, vai cuidar da família, vai cuidar dos netos, vai fazer conferência, vai fazer alguma coisa".

Lula também colocou em seu lugar a discussão sobre uma possível aliança com o PSDB em 2010, ao afirmar que "a base do governo terá o seu candidato". Se não deixar isso claro agora, estará submetendo a opinião pública a intermináveis e entediantes especulações cada vez que conversar com os governadores tucanos de São Paulo e Minas, José Serra e Aécio Neves, um dever de ofício dos executivos estaduais e do governante federal.

O estouro do balão-de-ensaio, se coloca limites ao debate de uma eleição que apenas vai ocorrer daqui a 3 anos e 5 meses, não resolve, no entanto, o problema do PT. As declarações incisivas de seu mais importante membro mostra que, apesar de ter tentado se firmar como força independente do Executivo ao bancar um candidato próprio à Presidência da Câmara, continua refém de Lula. É o presidente o grande eleitor da sua sucessão.

Desde o início de seu novo mandato, Lula tem deixado claro que, em 2010, o candidato da base aliada pode não ser necessariamente um petista. Essa posição teve o condão de unir todas as tendências políticas que disputam poder internamente em torno de uma única articulação, a de viabilizar um nome petista. Não se pode apostar, no entanto, que a unidade tenha longa duração. Já aparecem no páreo pelo menos cinco nomes: os dos ministros Tarso Genro, Patrus Ananias, Marta Suplicy e Dilma Rousseff, e o do governador da Bahia, Jacques Wagner.

Parece natural que as declarações de Lula tenham assanhado outros aliados, como o PMDB e o bloco de esquerda formado pelo PSB, PCdoB e PDT, além de outras legendas menores. Não é inteligente, no entanto, imaginar que, a 41 meses das eleições das eleições, seja possível fazer qualquer aposta de longa duração em qualquer nome, de qualquer partido. A escolha do candidato do governo e seu êxito eleitoral dependem da força que o Executivo terá em 2010 e da capacidade de articulação nacional de postulantes que, até o momento, não mostraram grande carisma e não têm exposição suficiente em todo esse enorme país.