Título: Marinho cobra de Mantega compensação
Autor: Costa, Raymundo e Galvão, Arnaldo
Fonte: Valor Econômico, 18/05/2007, Especial, p. A14

A Previdência vai cobrar do Tesouro o que deixar de arrecadar com a desoneração da folha de pagamentos das empresas que empregam mão-de-obra intensiva, medida que está sendo estudada na área econômica do governo para compensar perdas de setores afetados pela apreciação do real em relação ao dólar.

"O Guido (Mantega, ministro da Fazenda) fala em desonerar alguns setores da contribuição patronal, mas, nesse caso, o Tesouro tem de reembolsar a Previdência", disse ontem ao Valor o ministro da Previdência Social, Luiz Marinho.

Para o ministro, a decisão de cobrar o Tesouro segue a mesma filosofia adotada na nova fórmula de cálculo do déficit previdenciário, a ser debatida e divulgada na terça-feira, em reunião do Fórum da Previdência. A idéia é separar a contabilidade do que é renúncia previdenciária e os pagamentos da área rural, o que reduziria o déficit dos anunciados R$ 42,06 bilhões, em 2006, para algo próximo de R$ 4 bilhões, segundo Marinho.

"Os benefícios da área rural e as renúncias em favor de entidades filantrópicas, da exportação e das micro e pequenas empresas (que somados chegaram a cerca de R$ 38 bilhões, em 2006) não podem ser creditados nessa conta", diz Luiz Marinho. "A Previdência não tomou essas decisões, foi o governo, o Estado brasileiro", que paga por elas. Por isso Marinho afirma que é "fazer terrorismo com a sociedade" falar em déficit de R$ 42,06 bilhões.

"A mesma filosofia" deve ser empregada em relação à anunciada desoneração da folha de pagamentos das empresas, de acordo com Marinho. "Tem de separar uma parte para a Previdência e ponto. Não tem outro jeito. Não tem crise". O ministro da Previdência só vê uma alternativa, já avaliada mas encarada com reservas pela área econômica: "Outro jeito é desonerar para todas as empresas, passando a carga da folha de pagamentos para o faturamento, o que vai onerar os setores que mais investiram em tecnologia", disse.

A área econômica até agora não consultou Luiz Marinho sobre a medida em discussão. "Nem faço questão, desde que eles saibam que terão de pagar a conta", disse o ministro, que foi um dos primeiros a propor a medida quando estava no Ministério do Trabalho.

Há pouco mais de 45 dias no comando da Previdência Social, Luiz Marinho já acumula duas demandas com a área econômica do governo. Além da desoneração da folha de pagamentos, o ministro também tem restrições à licitação da folha de pagamentos do INSS, hoje nas mãos de 25 instituições bancárias, outra medida em discussão no Ministério da Fazenda.

O ante-projeto da Lei de Greve do funcionalismo público, elaborado no Ministério do Planejamento, também é bem diferente - e mais restritivo - daquele que Marinho arrancou do Fórum Nacional do Trabalho quando era ministro do Trabalho, cargo que ocupou de 2005 até o fim de março passado, quando foi deslocado para a Previdência.

Marinho apóia a necessidade de haver uma lei para regular a greve dos servidores e a declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva segundo a qual greve com o pagamento de dias parados equivale a "ferias".

"Negociar é uma reivindicação antiga do funcionalismo, um direito assegurado pela Constituição mas que até agora não foi regulamentado", argumenta o ex-sindicalista e ex-presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT). "E descontar dias parados não é punição em lugar nenhum no mundo". Punição, segundo Marinho, seriam a demissão ou a suspensão do servidor. "O governo quer reconhecer esse direito de greve e garantir a negociação".

Marinho conta que chegou ao governo em 2005 quando uma greve de funcionários da seguridade social, saúde e trabalho "estava a pleno vapor". Lula pediu para que ele mediasse com os grevistas. Foi fechado um acordo que previa o pagamento de dias parados que fossem compensados. "Agências do INSS tiveram de abrir aos sábados para compensar a greve", conta o ministro. "Nas DRTs (delegacias do trabalho), quem não compensou teve os dias parados descontados".

"O que leva à greve é a falta de negociação. "Lei não acaba nem proíbe greve. É o amadurecimento das partes que faz isso. No Brasil, o funcionalismo não tem cultura de negociação".

Outra preocupação de Marinho é com o impacto na arrecadação previdenciária se for muito ampla a contratação de profissionais por meio de pessoas jurídicas. Esse é o tema da polêmica emenda 3, vetada por Lula. Ela proíbe fiscais da Receita de desconsiderarem, para efeitos tributários, pessoas jurídicas quando há fortes indícios de fraude à lei trabalhista. O governo, ameaçado com a derrubada do veto no Congresso, negocia uma alternativa com os parlamentares.

Na opinião do ministro, os empresários não ligam para o custo da folha de pagamentos, desde que seus produto sejam vendidos no mercado. O problema, segundo Marinho, é a insegurança jurídica sobre a forma e as possibilidades de contratação de profissionais por meio de pessoas jurídicas. "Não sei porque o Congresso ainda não regulamentou o artigo 116 do código tributário".

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