Título: Processo automatizado reduz as queimadas
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Fonte: Valor Econômico, 18/05/2007, Caderno Especial, p. F2

Na safra passada, das cerca de 450 milhões de toneladas colhidas pelo setor sucroalcooleiro, cerca de 30% já foram colhidos por máquinas e equipamentos agrícolas. Esse número deve crescer ainda mais. Nas três últimas safras, houve o acréscimo de 60 milhões de toneladas de cana colhidas mecanicamente, o que sinaliza mudanças adicionais para o setor.

Em busca de maior eficiência, solo mais fértil e preservação ambiental - com a redução das queimadas -, as novas usinas previstas para ser instaladas no Brasil devem ser cada vez mais automatizadas. Antes queimadas, as pontas e a palha da cana podem agora ser usadas para produção de energia elétrica, em processo mecanizado. A vinda de novos investidores, de recursos externos e a abertura de capital devem provocar mudanças de gestão e a busca pela maior produtividade, contribuindo também para o aumento da mecanização dos processos.

Em São Paulo, onde a lei 11.241 de setembro de 2002 determina a eliminação da prática da queima em canaviais de todo o Estado, maior produtor do país, o índice de mecanização está em 45% - acima da média de 36% encontrada no Centro-Sul do país. Já em Ribeirão Preto, um dos maiores centros produtores de cana do Brasil, a mecanização atinge 70% da safra colhida todos os anos. "A mecanização deve crescer no Brasil, dentro da estratégia de maior eficiência e maior uso tecnológico", afirma o diretor da Usina Santa Elisa Henrique Gomes. Nas fabricantes de bens de capital que fornecem equipamentos para o segmento, as expectativas são de que as vendas de máquinas cresçam mais de 10% nos próximos cinco anos.

Prática comercial desde a década de 1970, a mecanização não avançou mais principalmente pela questão social. Segundo dados da Federação dos Empregados Rurais Assalariados do Estado de São Paulo, o setor sucroalcooleiro emprega 300 mil pessoas na área rural, principalmente no plantio e na colheita da cana-de-açúcar. No Brasil, o setor emprega cerca de 1 milhão de trabalhadores. Com a previsão de instalação de mais de 70 usinas nos próximos anos, mais 150 mil empregos devem ser criados.

A mecanização, no entanto, deve cortar muitos postos. "Estamos buscando capacitar nossos funcionários para que aqueles que deixarem trabalhos eventualmente mecanizados se tornem operadores de máquinas ou mecânicos", diz Gomes, da Santa Elisa. Apesar do esforço das usinas, é difícil que todos os empregados sejam contratados para outras funções. Os mais eficientes e com maior escolaridade terão maiores chances. Reduzir o analfabetismo - uma grande barreira para operar máquinas - é outro desafio.

Ao mesmo tempo, enquanto o setor convive com bons resultados e forte ingresso de investimento tanto externo quanto nacional, os trabalhadores começam a aumentar as reclamações quanto aos salários pagos pela indústria. No período de safra, segundo Silvio Palvequeres, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Ribeirão Preto, os rendimentos variam entre R$ 700 e R$ 1,2 mil por mês de safra. Cada tonelada de cana rende R$ 2,40 ao trabalhador, que, terminada a safra, fica sem ocupação. Segundo a socióloga Maria Aparecida de Moraes Silva, da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp), a vida útil de trabalho de um cortador de cana é de cerca de 12 anos.

O avanço da mecanização pode crescer cada vez mais nos próximos anos, mas para que deslanche de fato será preciso capacitar ainda mais os trabalhadores que perderão o emprego para novas funções. Esse xadrez jogado entre empregados e patrões, tem um componente extra que pode endurecer as relações trabalhistas. Como a taxa de mecanização no país ainda é baixa, o poder de barganha dos trabalhadores que fazem os trabalhos manuais ainda é elevado. O direito de greve pode reduzir a velocidade de implementação de avanços rápidos na mecanização. (R.R.)