Título: Modelagem prevê 30% de financiamento externo
Autor: Costa, Raymundo e Romero, Cristiano
Fonte: Valor Econômico, 21/05/2007, Brasil, p. A5

A modelagem financeira desenhada para a conclusão de Angra 3 prevê um crédito de 776 milhões de euros oferecido por um consórcio de bancos franceses, liderado pelo Société Générale. Por meio da Areva, a França fornecerá parte dos equipamentos da nova central nuclear brasileira - outra parte dos equipamentos já está comprada há mais de 20 anos e veio da Alemanha.

O investimento necessário para terminar Angra 3 é estimado em R$ 7,2 bilhões - e 30% dos recursos virão do exterior. O restante, pouco mais de R$ 5 bilhões, terá financiamento nacional, capitaneado pelo BNDES (até 25%) e por recursos próprios ou captações da Eletrobrás. Não se prevê o uso de recursos orçamentários do Tesouro Nacional. Os equipamentos já comprados equivalem, hoje, a R$ 1,5 bilhão, o que indicaria um custo total da usina de R$ 8,7 bilhões.

De acordo com Leonam dos Santos Guimarães, assistente da presidência da Eletronuclear, a idéia é usar ainda dinheiro da Reserva Global de Reversão (RGR), um encargo que incide nas contas de luz e financia programas de universalização do serviço de energia elétrica, como o Luz para Todos. Gerido pela Eletrobrás, a RGR arrecadou cerca de R$ 1,3 bilhão em 2006 e deve contribuir com até 10% dos custos de Angra 3. Ele ressalta que todo o investimento na usina se paga em 16 anos. Segundo o último estudo da Eletronuclear, de abril do ano passado, a energia de Angra custará R$ 138,14 por megawatt-hora (MWh), valor compatível com o das demais fontes de energia térmica e próximo das hidrelétricas recentes.

Guimarães diz que, para viabilizar o empréstimo do BNDES, é necessária autorização especial do Conselho Monetário Nacional (CMN), por ser um projeto 100% estatal - a lei veda a participação privada em usinas nucleares. Quanto ao crédito francês, articulado pela agência local de fomento às exportações, faltam apenas detalhes. "O financiamento já está razoavelmente garantido", afirma.

Enquanto a Eletronuclear avança na engenharia financeira da obra, o Ministério de Minas e Energia vem estudando mudanças na forma de comercialização da eletricidade gerada pelas centrais nucleares. Hoje, a estatal Furnas compra a energia produzida por Angra 1 e 2. Ela se junta às demais fontes de geração de Furnas. A partir dessa "cesta de produtos", a estatal oferece um preço nos leilões de energia. Mas - algumas vezes até publicamente - diretores da empresa reclamam que a energia nuclear, correspondente a cerca de 25% dessa cesta, é mais cara do que a geração hidrelétrica e prejudica o balanço contábil da estatal, bem como sua competitividade.

Para eliminar essa divergência, uma das alternativas em estudo no ministério é definir para Angra 1 e 2 o mesmo modelo de comercialização da energia da binacional de Itaipu. Esse modelo seria estendido para a terceira usina de Angra. Itaipu, que tem suas tarifas cotadas em dólar por não ser um projeto exclusivamente brasileiro, vende sua eletricidade diretamente às distribuidoras. As concessionárias de distribuição do Centro-Sul compram parte de suas necessidades de Itaipu, por cotas, de modo a distribuir pelos consumidores de vários Estados o ônus da energia gerada pela binacional - que muitas vezes, dependendo da cotação do dólar, pode ficar mais cara do que a nacional.

Quando oficializar a retomada das obras de Angra 3, o Brasil se juntará a uma nova onda de valorização da energia nuclear. No ano passado, o Reino Unido decidiu fazer uma aposta em novas centrais atômicas. A onda já chegou à América do Sul. Em agosto, o governo argentino anunciou que concluirá a usina de Atucha II, a terceira nuclear do país, parada há 25 anos e demandará investimentos de US$ 1,5 bilhão para começar a funcionar, o que se prevê para 2009.