Título: Grau de investimento já chegou com 'promoção' da dívida interna
Autor: Campos, José Roberto
Fonte: Valor Econômico, 21/05/2007, Finanças, p. C2

A melhor notícia que o governo poderia ter recebido já foi dada - a Standard & Poor's elevou o rating da dívida interna em reais a grau de investimento. A equipe econômica não esconde seu otimismo, que já vinha sendo compartilhado pelo mercado na forma de maiores investimentos diretos e em portfólio, maiores compras de títulos em reais, com a queda dos juros desses papéis para menos de 10%.

A mudança mais importante já ocorreu, para alguns membros do governo, e é ela que conta daqui para frente. O salto das reservas brasileiras - US$ 122,5 bilhões na posição de 2 de maio, a última oficial - fez a dívida externa pública virar pó. Se o país fosse recomprá-la toda, ainda sobrariam confortáveis US$ 60 bilhões em reservas, logo, obter o grau de investimento para ela tornou-se algo de menor importância relativa . Os sinais promissores do futuro estão na dívida pública interna, que a S&P reclassificou para cima na quarta-feira. Com essa chancela, ficam para trás as dúvidas sobre a solvência e as insatisfações em relação a sua redução, se medida pelo Produto Interno Bruto. A revisão do PIB pelo IBGE fez parte do serviço e a agência de rating só fez reconhecer que a dívida interna é menor do que parecia, está em queda e cairá mais porque a conta de juros vai se reduzir ainda mais.

O grau de investimento para dívida em reais, argumentam membros do governo, consolida e acentua a necessária e difícil trajetória da dívida pública em direção ao longo prazo. O Tesouro está banindo as LFTs de sua carteira e, com elas, desmonta-se toda a arraigada herança de uma visão de curto prazo do mercado que ainda predominava há pouco. A curva de juros de longo prazo está inclinada para baixo, o que significa não apenas custos cadentes como também a confiança dos investidores de que a política monetária conduzida pelo Banco Central não se desviará do conservadorismo demonstrado nos últimos quatro anos.

A era dos juros muito altos está, segundo eles, prestes a acabar. As taxas de papéis do governo mais longos negociadas no mercado apontam um movimento da casa dos 7% reais para a dos 6%. Podem até cair mais, embora não se vislumbre, em nenhuma hipótese, que o Banco Central deixará de lado sua atitude parcimoniosa e gradualista. Esperar uma atitude muito diferente das que o Copom balizou em sua última reunião - um corte de 0,25 ou 0,50 ponto percentual - é um exercício fútil.

A inflação está baixa para 2007 e 2008, mas há, na visão de alguns membros da equipe econômica, incógnitas que podem afetar o movimento dos preços e que recomendam o mesmo tratamento prudente habitual do Copom. O BC começará a calibrar os juros de 2008 a partir de agora, dada a defasagem de até 9 meses com que mudanças nos juros afetam a economia. Há um forte aumento da demanda em curso, o que desperta preocupações. Um sinal de alerta foi o resultado do comércio em março - alta de 11,3% em relação ao mesmo mês de 2006 e de 9,7% no trimestre. A massa salarial apresenta expansão de 8,4% no mesmo período, o crédito está em alta, embora os investimentos também estejam. Os cortes de juros feitos a partir de setembro, portanto, ainda não se fizeram sentir sobre uma economia que já está "fervendo". Preocupação subsidiária, embora não irrelevante, é o menor esforço fiscal em 2007, que também injetará dinheiro nas atividades econômicas. Com o PIB revisado, o governo reduziu a meta de superávit primário na prática a 3,2% - 3,8% menos 0,4 ponto percentual do Programa Piloto de Investimentos. Numa conta simples e aproximada, isso significa um gasto adicional de R$ 45 bilhões, nada desprezível. Esse cenário retira qualquer possibilidade de surpresas nas próximas reuniões do Copom.

O governo deve fazer mais do mesmo no câmbio, como inclusive deixou claro o presidente Lula. A avaliação de parte do governo é a de que o dólar está se desvalorizando e isso afeta todos os países, não só o Brasil - este é o ponto principal. A enxurrada de dólares ocorre mesmo em países com taxas de juros negativas - como Argentina e Índia - , o que colocaria a arbitragem entre juros internos e externos em papel de pouca relevância na apreciação do real. Os exportadores estão conseguindo reajustes em dólares compensadores, enquanto que em outras moedas, a relação de troca com o real praticamente não se moveu de um ano para cá - caso do euro, por exemplo, que baliza as vendas ao maior mercado do Brasil.