Título: Oposição divide-se sobre CPI para apurar Operação Navalha
Autor: Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 22/05/2007, Política, p. A6

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e os líderes partidários da Casa, irritados com vazamentos de informações parciais da Operação Navalha - a mais recente ação da Polícia Federal para desbaratar um esquema de corrupção -estudam uma forma de cobrar esclarecimentos do Ministério da Justiça. Enquanto isso, na Câmara dos Deputados, começa um movimento pela criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o assunto.

Os senadores avaliam a conveniência de encaminhar pedido de informações ao ministro da Justiça, Tarso Genro, ou até mesmo de convocá-lo a prestar esclarecimentos. O Senado é, por enquanto, a Casa mais atingida por esse novo escândalo, com envolvimento direto ou indireto de senadores de peso. Na opinião dos parlamentares, os nomes estão sendo vazados de forma irresponsável. E pessoas com envolvimentos diferentes - ou sem provas que as incriminem - estão tendo o mesmo tratamento.

"É importante avançar na investigação para que as especulações não se sobreponham aos fatos", afirmou o presidente do Senado. O caso do ministro das Minas e Energia Silas Rondeau é um exemplo: para ele, não há nada que o comprometa. O líder do Democratas, José Agripino (RN), cobrou diretamente do Ministério da Justiça que "torne público tudo que foi apurado, para evitar especulações".

Agripino é contra a CPI. Segundo ele, isso significaria "importar para o Congresso uma crise que é do Poder Executivo". Na sua opinião, é responsabilidade do Executivo realizar licitações públicas e pagamento de obras. E as fraudes apuradas pela PF na Operação Navalha ocorreram nessa área. Entre os políticos do DEM suspeitos de envolvimento no escândalo, está o ex-governador de Sergipe, João Alves Filho.

Já a disposição do PSDB é procurar capitalizar o desgaste que o governo federal poderá sofrer com o envolvimento de pemedebistas e petistas no escândalo, deixando para segundo plano a defesa dos tucanos atingidos: o governador de Alagoas, Teotonio Vilella Filho, e o prefeito de Sinop (MT), Nilson Leitão.

"Não podemos entrar em acordos de compensação, procurando marcar limites para as investigações com os outros partidos envolvidos. Precisamos lembrar que é a primeira vez que um ministro do governo Lula é diretamente acusado de receber propina", disse o deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR), referindo-se a Rondeau. "Vamos expor as entranhas", afirmou o deputado José Aníbal (PSDB-SP). Segundo Fruet, a princípio, o PSDB deve apoiar a criação de uma CPI

Os deputados Júlio Delgado (PSB-MG) e Augusto Carvalho (PPS-DF) decidiram ontem apresentar dois requerimentos conjuntamente, criando duas CPIs: uma para apurar os fatos levantados pela Operação Navalha e outra para apurar o esquema investigado pela Operação Furacão - envolvimento de membros do Poder do Judiciário por suposto envolvimento em ações para beneficiar pessoas ligadas a jogos de bingo.

Eles haviam pensado em propor apenas uma CPI, mas como não há um fato determinado comum aos dois assuntos, haveria questionamento jurídico. "Vamos apresentar dois requerimentos para investigar escândalos envolvendo os três poderes", disse Carvalho.

Segundo Delgado, o foco de toda a corrupção é a forma de elaboração do Orçamento da União, porque os parlamentares podem apresentar emendas individuais destinando recursos a suas bases. "Temos que modificar a Comissão Mista de Orçamento para estancar isso", disse Delgado.

Ontem, o ex-presidente da CPI dos Correios, senador Delcídio Amaral (PT-MS), subiu à tribuna para se defender. Seu nome aparece em uma lista apreendida no escritório da Gautama, ao lado da citação de um valor (R$ 24 mil) e da referência ao aluguel de um jatinho.

No discurso, o senador insinua ser vítima de perseguição política por sua atuação como presidente da CPI dos Correios, em 2004. Num claro recado às pessoas contrariadas pela CPI, disse que "se fosse alguém que tocasse gasolina no fogo", o escândalo poderia ser ainda maior.

Delcídio relata que pediu que um amigo - Luiz Gonzaga Salomon - providenciasse um avião para levar sua família a Barretos (SP) no dia 4 de abril para o enterro do sogro e, depois, a Campo Grande (MS). O amigo teria alugado um bimotor da Ícaro Táxi Aéreo e emitido um cheque pré-datado (para 4 de maio) de R$ 24 mil para pagar a conta. Como não tinha dinheiro, Salomon teria solicitado ao empresário Zuleido Veras que quitasse a dívida, o que terminou não acontecendo, fazendo com que Delcídio continue devedor.

O senador divulgou a carta do amigo relatando o que ocorreu. Divulgou também relação de suas emendas ao Orçamento da União, para provar nunca ter defendido recursos para obras da Gautama. Admitiu conhecer Zuleido, "que circulava bastante pelo Congresso" e "não era nenhum marciano que caiu de repente". O conhecia da época em que foi diretor da OAS, mas não teve mais contato com ele.

Antes de Delcídio, o senador Papaléo Paes (PSDB-AP), que recebeu R$ 100 mil da Gautama como contribuição de campanha eleitoral, subiu à tribuna. "Recebi sim e está tudo registrado na minha declaração ao Tribunal Regional Eleitoral. Terei que exigir atestado de idoneidade a toda empresa que quiser colaborar com campanha?", perguntou.

A Operação Navalha continuou sendo explorada ontem pelos adversários locais dos envolvidos. Em Alagoas, o jornal "Gazeta de Alagoas", do ex-presidente e senador Fernando Collor (PTB-AL), que na campanha eleitoral em 2006 opôsse à eleição de Teotonio Vilella destacou ontem que os indicados por Renan Calheiros no governo estadual facilitaram a liberação de recursos federais para as obras da Gautama. O jornal de Collor destacou que para duas obras - a macrodrenagem do Tabuleiro do Martins e o Sistema Pratagy, foram liberados R$ 70 milhões em recursos extraordinários. (Colaborou César Felício, de São Paulo)